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A doença espalhada por mosquitos que preocupa médicos – e não é dengue

Vírus da febre Oropouche passou por transformações genéticas e ganha terreno no Brasil. O que precisa ser feito para contê-lo

Por Carolina dos Santos Lázari*
27 mar 2025, 10h55

O Brasil está testemunhando um aumento significativo no número de casos de febre do Oropouche, um vírus que até recentemente era considerado endêmico da região amazônica. Desde o final de 2023, a infecção tem sido detectada em diversos estados, muitos deles com transmissão autóctone, o que sugere uma adaptação do patógeno a novas regiões e populações.

Essa disseminação é impulsionada por fatores como a evolução genética do próprio vírus, a ampliação da capacidade diagnóstica e as condições climáticas favoráveis à proliferação dos vetores.

Uma das possibilidades levantadas por pesquisadores é que o Oropouche tenha passado por rearranjos genéticos que facilitaram sua adaptação a diferentes vetores e ao organismo humano. Estudos sugerem que modificações no material genético do vírus podem estar contribuindo para sua disseminação mais ampla. Além disso, o aumento da capacidade diagnóstica em laboratórios públicos e a busca ativa de casos também têm levado a uma melhor identificação da real extensão da infecção no Brasil.

Historicamente, as complicações mais graves associadas ao Oropouche eram raras e limitavam-se a problemas neurológicos, como meningite e meningoencefalite, registrados principalmente na região Norte. No entanto, à medida que o vírus se espalha, novas manifestações clínicas têm sido documentadas, incluindo casos de febre hemorrágica e choque circulatório.

Dois óbitos recentes na Bahia foram atribuídos à febre hemorrágica causada pelo Oropouche, um achado preocupante que reforça a necessidade de monitoramento rigoroso da doença.

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Outro fenômeno recém-identificado é a transmissão vertical do vírus, ou seja, da mãe para o feto. Já foram confirmados casos em que a infecção levou à perda gestacional, um aspecto que não havia sido amplamente documentado antes. Esse cenário reforça a necessidade de estudos para entender melhor as complicações potenciais da doença, especialmente em populações com maior variabilidade genética, que podem apresentar novas formas de resposta ao vírus.

O avanço da capacidade diagnóstica no Brasil tem sido fundamental para a identificação dos casos de Oropouche. Desde o final de 2023, laboratórios centrais em diversos estados passaram a realizar testes para o vírus, algo que antes era restrito a poucos centros na região Norte. Essa ampliação permitiu uma visão mais precisa da disseminação do vírus.

No entanto, a disponibilidade de testes na rede privada ainda é limitada. Atualmente, o exame para Oropouche não está incluído no rol da ANS para cobertura obrigatória pelos planos de saúde, o que dificulta o acesso ao diagnóstico para muitos pacientes. Em caso de uma grande epidemia, essa limitação pode representar um entrave significativo para o controle da doença.

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Apesar da rápida expansão do vírus, o principal fator que tem limitado surtos de grande escala é a biologia do vetor. Diferentemente do Aedes aegypti, que transmite a dengue e a chikungunya e é altamente adaptado a ambientes urbanos, os vetores do Oropouche são mosquitos mais comuns em áreas rurais e de transição. Até o momento, os principais grupos afetados são trabalhadores rurais e pessoas que vivem em regiões próximas a plantações e fazendas.

Porém, como o Oropouche é um vírus de RNA com alta capacidade de mutação e rearranjos genéticos, existe a possibilidade de que ele evolua para ser transmitido por vetores mais urbanizados. Isso poderia levar a uma disseminação muito mais ampla da doença, tornando-a uma preocupação ainda maior para a saúde pública.

No momento, não há um tratamento específico para a infecção por Oropouche. O manejo da doença é sintomático, e os casos graves requerem suporte médico adequado. Se a disseminação continuar crescendo, o sistema de saúde pode enfrentar dificuldades para atender a um grande número de pacientes, especialmente na atenção primária.

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O desenvolvimento de vacinas contra essa doença também apresenta desafios. Assim como ocorre com o vírus influenza, que sofre mutações frequentes e exige atualização periódica das vacinas, o Oropouche pode demandar estratégias semelhantes. Estudos já indicam que anticorpos de pessoas que tiveram a infecção há uma década não possuem a mesma eficácia contra o vírus que circula atualmente, o que reforça a necessidade de vigilância genômica constante.

Diante desse cenário, o monitoramento epidemiológico e genômico do Oropouche é essencial. As autoridades de saúde precisam estar atentas à evolução do vírus e à possível adaptação a novos vetores, garantindo que estratégias de controle sejam implementadas de maneira eficaz. Enquanto isso, medidas de prevenção, como evitar a exposição a áreas de risco e reforçar a vigilância laboratorial, são fundamentais para conter a expansão desse novo desafio viral no Brasil.

* Carolina dos Santos Lázari é médica infectologista e patologista clínica e membro da Sociedade Brasileira de Patologia Clínica e Medicina Laboratorial (SBPC/ML)

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