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Cigarro eletrônico intoxica tanto quanto o comum (ou até mais)

É o que aponta estudo brasileiro sobre o tema. Autora discorre sobre os achados e a dependência no Dia Mundial sem Tabaco

Por Jaqueline Scholz*
Atualizado em 4 jun 2024, 10h27 - Publicado em 31 Maio 2023, 09h30

Estima-se que um em cada cinco brasileiros entre 18 e 24 anos já tenha fumado cigarro eletrônico pelo menos uma vez. Ainda que esses dispositivos não sejam regulamentados para venda no país, sabemos que as pessoas têm acesso fácil em lojas ou pela internet.

De olho nisso, desenvolvemos um estudo para entender melhor o impacto do uso de vapes no organismo dos usuários. A pesquisa, intitulada Estratégias de Tratamento da Dependência à Nicotina em Usuários de Cigarro Eletrônico – Uma Série de Casos, comprova o que a maioria dos especialistas já sabia: adeptos de cigarro eletrônico apresentaram índices de nicotina no organismo equivalentes aos de fumantes de mais de 20 cigarros convencionais por dia.

A conclusão veio à tona após a realização de exames de urina, que detectaram concentração de nicotina metabolizada em medidas acima de 600 ng/ml. A pesquisa, realizada entre maio e dezembro de 2022, incluiu pessoas com idade entre 14 e 49 anos, homens na maioria, que procuraram tratamento de dependência à nicotina no Programa Ambulatorial de Tratamento do Tabagismo do Instituto do Coração (InCor).

Os dados deste serviço são utilizados pelo Programa de Assistência ao Fumante (PAF), um sistema consolidado de informações médicas utilizado no combate à dependência. Quase a totalidade dos participantes buscaram o serviço por concluírem que estavam viciados no dispositivo e que não conseguiriam parar o consumo por conta própria.

Os achados sobre os níveis de monóxido de carbono no organismo dos voluntários foram de 2 ppm (partículas por milhão), o que evidencia o não uso do cigarro convencional, deixando claro que a nicotina encontrada na urina dos pesquisados só poderia derivar do eletrônico. Identificamos, assim, que a intoxicação por nicotina é tão alta (ou até pior) que pelo cigarro tradicional.

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O estudo será apresentado em primeira mão no 43º Congresso da Socesp – Sociedade de Cardiologia do Estado de São Paulo.

Falsos argumentos

O cigarro eletrônico ou vape, como também é chamado, é defendido como mais seguro para a saúde e, sobretudo na população jovem, o risco de dependência é ignorado. Além disso, os fumantes de cigarro comum que migram para o eletrônico acreditam no bônus da substituição. Mas isso não é verdade. Os vapes podem viciar em menos tempo.

Embora a comercialização no país seja proibida, o número de usuários de cigarro eletrônico continua crescendo. Há desde adolescentes descobrindo o tabaco por meio desses dispositivos até pessoas tentando se livrar da compulsão através deles.

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Os estudos comprovam, contudo, que os mesmos métodos já testados e aprovados para extinguir o vício pelo cigarro convencional também são efetivos para controlar o ímpeto pelo vape. As pesquisas foram feitas com adesivo e pastilha de nicotina, bupropiona e/ou vareniclina, além de inibidores seletivos da recaptação de serotonina e antidepressivos duais (se constatado transtorno depressivo ou de ansiedade generalizada associados à dependência da nicotina). A utilização desses medicamentos, que costumam ser associados à psicoterapia, está por trás de taxas de sucesso acima dos 99%.

Ciladas persistem

A melhor maneira de não se viciar no dispositivo é nunca cair na cilada de experimentar porque, de fato, o odor e o sabor não são desagradáveis como no caso do cigarro convencional. Uma armadilha e tanto principalmente para os mais jovens.

Mesmo tentando passar a mensagem de algo inofensivo, lá está a nicotina. A substância libera adrenalina, que acelera o coração, aumenta o consumo de oxigênio e a pressão arterial e produz danos nas paredes das artérias, favorecendo infarto e morte súbita.

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Além disso, os eletrônicos emitem mais nanopartículas que os cigarros convencionais. Tais partículas ultrafinas são responsáveis por quadros de asma e por agravos ao sistema cardiovascular.

Alguns modelos, inclusive, funcionam com o “sal de nicotina (pods)”, que produz dependência mais rápida que o cigarro comum. Ao ser inalada, ela estimula a liberação de neurotransmissores como a dopamina, responsável pela sensação de prazer, bem-estar e relaxamento, fartos motivadores para que o produto seja consumido mais e mais vezes.

Neste mês de combate ao tabagismo, é vital continuar alertando a sociedade, como temos feito em ações da Socesp, sobre os malefícios do cigarro eletrônico. Isso passa por divulgar as descobertas científicas e repudiar as fake news e a desinformação que circulam a respeito.

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* Jaqueline Scholz é cardiologista e especialista em tratamento do tabagismo e assessora científica da Sociedade de Cardiologia do Estado de São Paulo (Socesp)

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Nota de direito de resposta para a BAT Brasil - Alessandra Bastos, farmacêutica, ex-diretora da Anvisa e consultora científica da BAT Brasil

É fundamental esclarecer que o cigarro eletrônico não é isento de riscos. No entanto, as autoridades de saúde de países como Reino Unido, Canadá, Estados Unidos, os da União Europeia (como França e Alemanha), Nova Zelândia, dentre os cerca de 80 países que regulamentaram esses produtos, reconhecem o papel dos cigarros eletrônicos como de risco reduzido para adultos fumantes que não optam por parar de fumar, desde que haja controle sanitário. O King’s College London, a pedido do Ministério da Saúde inglês, realizou a revisão científica mais completa sobre cigarros eletrônicos até o momento, com mais de 400 estudos. A conclusão, publicada no final de 2022, reafirma que cigarros eletrônicos representam apenas uma pequena fração dos riscos dos cigarros convencionais ou, como dito pelos pesquisadores, são 20 vezes menos prejudiciais à saúde do que fumar cigarros convencionais. É bom reforçar que regulamentar não é liberar, mas criar regras claras com rigorosos padrões de segurança e qualidade para fabricação, importação, consumo, comercialização e informação à sociedade brasileira.

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