Duas propostas ora em discussão no Congresso têm tudo para gerar confusão, ambas com apoio do presidente da Câmara, Arthur Lira. A primeira tem a ver com projeto de decreto legislativo desautorizando aumentos de preços de energia; a segunda sugere uma redução inconstitucional do ICMS incidente sobre combustíveis.
O decreto legislativo, de natureza populista, visa a evitar o impacto do reajuste de energia estabelecido pela Agência Nacional de Energia Elétrica – ANEEL. O Congresso, é certo, detém o poder de desfazer atos do Poder Executivo, mas no caso em tela a medida violaria contratos e direitos líquidos e certos, além de desmoralizar uma agência reguladora autônoma. A confiança nas regras e a segurança jurídica iriam para o espaço, afetando negativamente o ambiente construído ao longo dos últimos quase trinta anos. Se a moda pegar, o Congresso poderá fazer o mesmo nas áreas de telecomunicações, saneamento básico, medicamentos e outros que são regulados pelo Estado. Qual empresa nacional ou estrangeira teria interesse em investir nesses segmentos se a demagogia de tempos eleitorais rasga e deturpa as normas? Nenhuma. Seria um desastre.
Na segunda proposta, Lira quer intervir em área de competência exclusiva dos Estados. Segundo declarou ao jornal Valor no último dia 5/5/2022, “o Senado é a Casa que pode mexer no percentual do ICMS”. Ele se referia à tributação de combustíveis. Errado. O Senado pode decidir sobre o tema em casos muito limitados e específicos, nenhum relacionado aos preços dos combustíveis. De fato, pelo artigo 3º, inciso V, da lei complementar 192/2022, “as alíquotas do imposto (ICMS) serão definidas mediante deliberação dos Estados e do Distrito Federal, nos termos da alínea “g”, XII, do artigo 155 da Constituição Federal. É o Confaz quem exerce essa competência, não o Senado. A ideia de Lira não passará no teste de sua constitucionalidade.
O Brasil vive tempos confusos, estranhos e perigosos.