Estudos indicam que a economia e a sociedade se beneficiam da independência do Banco Central (BC), entendimento que se firmou dos anos 1980 em diante. Provou-se que taxas elevadas de inflação costumavam nascer de medidas para forçar o BC a reduzir a taxa básica de juros (no caso do Brasil, a Selic).
A taxa básica é um instrumento poderoso, que serve tanto para enfrentar surtos inflacionários quanto para ampliar a liquidez em certos momentos, como ocorreu na crise financeira de 2008 e na pandemia de covid-19, quando seus respectivos custos foram minimizados. Líderes populistas podem lançar mão desse instrumento para a expansão inflacionária da atividade econômica, o que gera incertezas, inflação e queda do potencial de crescimento.
Recente estudo publicado no blog do FMI aponta os custos econômicos e sociais resultantes da ausência de um BC independente (Strengthen Central Bank Independence to Protect the World Economy). “Todos são prejudicados pela alta inflação, especialmente as pessoas que vivem de rendimentos fixos (salários, aposentadorias e pensões), que sofrem a erosão de sua renda”, assinalou o estudo. Isso provoca aumento da pobreza e da desigualdade.
“A velha esquerda ainda resiste à ideia, uma prova adicional da incapacidade de modernizar seu pensamento”
Todos os BCs das nações ricas são independentes. O mesmo ocorre na maioria dos países da América do Sul. Nações que pretendam ingressar na União Europeia precisam ter banco central independente. Aqui, nosso BC nasceu em 1965 com uma área para prover crédito em favor da agricultura, da indústria e das exportações, o que acarretou pressões inflacionárias. Essa contradição desapareceu com as reformas realizadas em 1986 e 1987.
Desde então, o BC adquiriu paulatinamente as funções básicas de um banco central moderno, quais sejam, cuidar da estabilidade da moeda e do sistema financeiro. A independência formal só viria, no entanto, em 2021. Entre os países relevantes da América Latina, fomos o último a dar esse passo.
A velha esquerda brasileira ainda resiste à ideia, uma prova adicional da incapacidade de modernizar seu pensamento econômico e de aprender com políticas públicas bem-sucedidas. Vêm daí, ao que parece, os ataques pessoais ao presidente do BC, tratado como “esse cidadão” e acusado de “não entender o Brasil”. Autoridades pedem publicamente que o BC reduza a taxa Selic ou acelere sua queda.
Esse equívoco é comum em parte da classe política e do empresariado. Às vésperas das reuniões do Comitê de Política Monetária, líderes de associações de classe clamam por redução dos juros, como se fosse mera questão de vontade. Valendo-se de sua independência, o presidente do BC e os demais membros do comitê ignoram tais pressões. Podem, assim, manejar corretamente a taxa Selic, permitindo o cumprimento das metas de inflação. Sorte nossa.
O nosso BC foi eleito recentemente o melhor do mundo. Dificilmente a notícia teve a repercussão devida entre os incapazes de aprender e entender como funciona essa instituição. Quem sabe nas próximas gerações.
Publicado em VEJA de 26 de abril de 2024, edição nº 2890