Conversas mostram como blogueiro influenciou a Secom na gestão Wajngarten
Conspiração contra o ex-ministro Santos Cruz e tentativas de sugerir nomeações são exemplos da atuação informal de Allan dos Santos na secretaria de governo
Uma série de conversas entre o blogueiro Allan dos Santos e o ex-secretário de comunicação da Presidência Fábio Wajngarten detalha como a Secretaria Especial de Comunicação (Secom) esteve sob forte influência de um personagem acusado de disseminar mentiras e assassinar reputações nas redes sociais. Mensagens que foram obtidas no celular de Allan durante o inquérito dos atos antidemocráticos mostram que o blogueiro conspirou para a demissão do ex-ministro Carlos Alberto dos Santos Cruz e usou a proximidade com o deputado Eduardo Bolsonaro (PSL-SP) para palpitar na administração da pasta.
No dia 06 de maio de 2019, Allan enviou uma mensagem a Wajngarten dizendo que o então ministro Santos Cruz era um “fdp” e que Carlos precisava assumir o controle do ministério, referindo-se ao vereador Carlos Bolsonaro (Republicanos-RJ), o filho do presidente que tem maior ascendência sobre as milícias digitais. Em outra conversa, Allan pede para Wajngarten telefonar para o “Dr. Cabrera”, advogado do polemista Olavo de Carvalho, porque Santos Cruz teria cometido um ato de improbidade administrativa. Cabrera, no caso, é Francisco Carlos Cabrera, que de fato representa o ideólogo bolsonarista.
Allan também esteve por trás da divulgação de uma conversa falsa em que Santos Cruz ofendia o presidente Jair Bolsonaro ao falar com um interlocutor desconhecido. Segundo as mensagens obtidas no celular de Allan, uma interlocutora que se identifica como Carolina Gaia e Silva, então assessora especial do gabinete da Secretaria de Governo, diz ao blogueiro que tirou prints da conversa ao acessar o celular do ex-chefe de gabinete do ministro, o coronel Augusto César Barbosa Vareda, sem que fosse vista. Gaia e Silva afirma que enviou as imagens para Wajngarten e que o ex-secretário as teria mostrado para Bolsonaro, mas alega que o presidente não teria demonstrado “coragem” para exonerar Santos Cruz. Para convencer Allan de que o diálogo é autêntico e incentivá-lo a publicar os prints, Gaia e Silva lhe fornece dados pessoais e uma foto do seu cartão do CPF. A reportagem tentou contato com a funcionária do governo, que hoje atua como chefe de gabinete da Casa Civil, mas não obteve resposta. Já Santos Cruz disse a VEJA que irá consultar um advogado criminalista para tomar as medidas cabíveis. “Lembro que solicitei um inquérito para a Polícia Federal e foi comprovado que tudo era falso. Isso foi montado por um bando de criminosos. É bem clara a existência de atividades paralelas solapando a instituição governamental”, afirmou o general.
Todas as mensagens enviadas por Gaia e Silva foram compartilhadas por Allan com Eduardo Bolsonaro, que respondeu com o emoji de duas mãos se cumprimentando. Em reportagem publicada em 17 de maio de 2019, logo após a divulgação da montagem envolvendo Santos Cruz, VEJA mostrou que o então ministro procurou Bolsonaro para reclamar de ataques que vinha sofrendo por parte de Wajngarten e de assessores ligados a Olavo de Carvalho. A campanha de difamação começou após o general rejeitar um projeto de financiamento de veículos apoiadores do governo por meio da Empresa Brasil de Comunicação (EBC).
As mensagens do celular de Allan dos Santos mostram como a estatal é importante para os blogueiros favoráveis ao governo. “Precisamos da Secom para implementar uma ação que desenhamos aqui”, diz Allan numa conversa com Eduardo Bolsonaro. Em outra ocasião, o blogueiro pede para que Wajngarten resolva os problemas que ele enfrentava para fazer o download de vídeos exibidos pela TV Brasil e que eram replicados nos materiais que Allan produz para a internet. Wajngarten, então, questiona um gerente de operações da secretaria e explica para Allan como é o procedimento. Nunca é demais lembrar que Bolsonaro prometia extinguir a EBC durante a campanha presidencial de 2018.
Allan e Wajngarten eram tão próximos que o ex-secretário chegou a enviar para o blogueiro a nota que divulgaria para se defender das acusações de corrupção passiva, peculato e advocacia administrativa que ele enfrentou no primeiro ano de governo. “Me ajude nas redes, por favor”, foi o pedido que Wajngarten fez ao blogueiro. Allan também foi incluído pelo ex-secretário num “grupo de pensamento de mídia da Secom”, no qual pessoas sem cargos no governo discutiam estratégias de comunicação a serem implementadas na secretaria.
Tamanha influência permitia que Allan palpitasse nos rumos da secretaria. Ao conversar com Eduardo Bolsonaro em dezembro de 2019, ele pediu para que Juliana Zanatta fosse nomeada secretária de Radiofusão. “A Juliana precisa assumir (…). Seu pai disse que sim”, diz o blogueiro. Uma jornalista formada em direito, Zanatta é bolsonarista de carteirinha e foi candidata à prefeitura de Criciúma (SC) nas eleições de 2020, mas não ganhou. Apesar de Eduardo ter dito que faria uma sondagem, o pleito para ela assumir a secretaria não foi atendido.