Embora toda greve seja, a rigor, um ato político, a paralisação de trabalhadores do Metrô e da CPTM nesta manhã de terça-feira, 3, em São Paulo, é política em mais de um sentido. Além de ser um movimento, não por salários ou direitos, mas contra a política de privatização do governador Tarcísio de Freitas (Republicanos), ela também tem como pano de fundo as eleições de 2024 e de 2026.
Primeiro, porque a paralisação é mais um duro teste político para Tarcísio. Como mostrou reportagem de VEJA na edição desta semana, o governador, que se destacou como um técnico competente no governo federal em diferentes gestões (Dilma Rousseff, Michel Temer e Jair Bolsonaro), enfrenta todo tipo de dificuldade política na sua estreia em um cargo eletivo.
A greve nos trens e metrô não é pouca coisa, porque afeta diretamente a população de forma dura, como se vê nesta manhã nas filas nos pontos de ônibus, nos trabalhadores se deslocando a pé e no congestionamento recorde no trânsito da capital paulista. Tudo isso tem impacto político. Cotado até como presidenciável para 2026, Tarcísio terá de mostrar habilidade política na condução do problema.
Segundo, porque a movimentação sindical tem por trás adversários nacionais e locais do governador, que têm outros objetivos além de evitar a privatização do Metrô e da CPTM. O poderoso Sindicato dos Metroviários, por exemplo, é comandado por Camila Lisboa, uma cientista social formada pela Unicamp e que trabalha como agente de estação no Metrô desde 2012. Ela é filiada ao PSOL e integra a corrente Resistência, que é ligada ao grupo do deputado Guilherme Boulos, pré-candidato à prefeitura de São Paulo com o apoio de Lula e do PT.
O fato não passou despercebido por Tarcísio, que citou a conexão na sua entrevista coletiva na manhã desta terça-feira. “Ano que vem temos eleições municipais e está muito clara a motivação deles. Como vamos ter um prefeito que não dialoga com o governo?”, afirmou Tarcísio, em referência a Boulos, mesmo sem citá-lo. O governador deve apoiar a reeleição do prefeito Ricardo Nunes (MDB) em 2024.
O prefeito foi na mesma linha de Tarcísio. “Lamentamos que nossa população seja prejudicada por uma greve ideológica, apoiada por partidos como o PSOL, da presidente do Sindicato dos Metroviários. Uma greve que não está sequer respeitando decisão da Justiça. Estamos trabalhando para ajudar aqueles que realmente trabalham”, postou.
https://twitter.com/ricardo_nunessp/status/1709207973094940847?s=46&t=NESHN1iL5u2MUCAoSN0ZTQ
Boulos rebateu na sequência. Disse que a intransigência do governo de São Paulo “é a grande responsável pela greve”. “Os trabalhadores propuseram em juízo liberar as catracas em vez da paralisação, para não prejudicar os usuários. O governo estadual recusou a proposta. Apostou no conflito e não no diálogo”, postou o deputado. A Justiça, no entanto, também rejeitou a liberação das catracas alegando risco de tumulto nas estações se a medida fosse adotada.
A batalha em torno das privatizações vai definir quem sai ganhando e quem sai perdendo nessa queda de braço. Nas redes sociais, pelo menos, a grande maioria dos posts é em solidariedade a Tarcísio – as hashtgs “privatiza” e “demita”, por exemplo, estiveram entre os trending topics da rede social X, antigo Twitter.
Vale lembrar que a privatização de estatais foi uma proposta largamente defendida por Tarcísio em sua campanha vitoriosa ao governo de São Paulo — e, portanto, aprovada pelo eleitor que o levou ao Palácio dos Bandeirantes. Durante a campanha, o tema, inclusive, foi explorado por seu principal adversário, o hoje ministro da Fazenda, Fernando Haddad, que viu nisso uma possibilidade de desgastar o concorrente. A estratégia, como se viu, não deu certo.
Pesquisa feita pelo Datafolha em abril deste ano mostra que o eleitor de São Paulo tem uma disposição maior para apoiar a política de privatizações que a média do país. Segundo o levantamento, 42% dos paulistas são a favor da concessão de estatais para o setor privado, enquanto 38% pensa da mesma forma no Brasil. O apoio é maior para rodovias (54%) e aeroportos (51%) e menor para a Sabesp (40%). A pesquisa não incluiu trens e metrô.