Presídio no DF: chefões do PCC, mafiosos italianos e na mira de ministro
Anderson Torres (Justiça), que assumiu em março deste ano, quer desfazer iniciativa de Moro e tirar líderes de grupos criminosos da penitenciária federal
Longe das fronteiras e próximo ao centro do poder político e diplomático do país, o presídio federal de Brasília — o mais novo do sistema — é conhecido por ser à prova de fuga e de rebeliões. Inaugurado em 2018, a penitenciária hoje abriga chefões do crime não só do Brasil, mas do mundo. Entre eles, parte da cúpula do Primeiro Comando da Capital (PCC), incluindo Marcos Herbas Camacho, o Marcola, e o seu irmão, Alejandro Camacho Júnior, o Marcolinha; e lideranças da ‘Ndrangheta, a poderosa máfia italiana da Calábria, entre eles Rocco Morabito, conhecido como o “rei da cocaína em Milão” — preso em maio em João Pessoa (PB) –, e Nicola Assisi, preso em 2019 em Praia Grande (PB).
“Ter desempenhado função de liderança ou participado de forma relevante em organização criminosa” é o pré-requisito número 1 para ser transferido a uma das cinco penitenciárias federais do país. Outro critério é ter se “envolvido em incidentes de fuga, de violência ou de grave indisciplina no sistema prisional de origem”.
Condenado a uma pena que ultrapassa 300 anos de prisão, Marcola, por exemplo, é apontado pelo Ministério Público e Polícia Civil e São Paulo como o líder máximo da facção paulista, que domina boa parte do sistema prisional brasileiro. Ele já foi alvo de pelo menos duas investigações sobre planos mirabolantes de resgate que não se concretizaram. Marcolinha, por sua vez, teria sido um dos mentores da fuga de mais de 100 presos, incluindo ele próprio, do Complexo do Carandiru, em São Paulo, em novembro de 2001.
Morabito também é expert em escapar das autoridades. Em 2017, ele foi preso em Montevidéu, no Uruguai. Dois anos depois, enquanto esperava o processo de extradição para a Itália, ele fugiu por um buraco no telhado da penitenciária uruguaia junto com três comparsas, que depois foram recapturados. Ele, no entanto, sumiu dos radares da polícia e se refugiou no Brasil. No último dia 24, após dois anos de intensas buscas, ele foi preso em um flat em João Pessoa em uma operação que envolveu a Polícia Federal, a Abin, os carabinieris (da Itália), o DEA (departamento antinarcótico dos EUA) e o FBI (a polícia federal americana). Conforme a sua ficha na Interpol (polícia internacional), ele foi condenado quatro vezes pela Justiça italiana a penas que somam 103 anos de prisão.
A defesa de Morabito até tentou impedir que ele fosse levado ao presídio federal — preferia a penitenciária da Papuda, também em Brasília –, mas a ministra do Supremo Tribunal Federal Cármen Lúcia não atendeu ao pedido no final de maio. As defesas de Marcola e outros integrantes do PCC também já entraram com ações se queixando das condições impostas pelo sistema. Nas unidades mantidas pelo governo federal, a rotina do preso é bem mais rígida: um banho de sol por dia e visitas restritas aos parlatórios. Pela lei, os presos só podem ficar por três anos nessas unidades, mas o prazo pode ser prorrogado pela Justiça.
A concentração de presos estrelados do crime organizado na capital federal, no entanto, pode não durar muito — se o presídio já estava no alvo de autoridades em Brasília com a concentração de líderes do PCC, a situação piorou com a chegada dos novos hóspedes italianos. Uma das principais bandeiras do novo ministro da Justiça, Anderson Torres, que assumiu o posto no fim de março, é transferi-los para outras unidades do país. “Brasília não é lugar para esse tipo de líder de organização criminosa. Tudo que eles possam vir a montar em Brasília representa um risco. Imagine a Esplanada dos Ministérios inteira pegando fogo num atentado”, disse ele a VEJA.
A transferência de Marcola para Brasília ocorreu logo depois de Sergio Moro ter assumido o Ministério da Justiça, em março de 2019, e gerou fortes críticas do governador do Distrito Federal, Ibaneis Rocha (MDB), que chegou a pedir que os líderes do PCC fossem levados a outras unidades da federação. Quando Moro caiu, Ibaneis foi um dos primeiros a comemorar. À época, o hoje ministro da Justiça, Anderson Torres, era secretário de Segurança Pública do governo do DF.