Uma das máximas da política é que ela é feita de gestos. E o prefeito Ricardo Nunes (MDB) fez um importante no sentido da definição do nome que concorrerá ao seu lado na chapa em que pretende disputar a reeleição em outubro. Embora diga que só vai anunciar o seu vice mais à frente, provavelmente em julho, no período das convenções, o almoço desta sexta-feira, 14, com o ex-presidente Jair Bolsonaro, o governador Tarcísio de Freitas (Republicanos) e o coronel Ricardo Mello de Araújo foi um sinal claro de que este último será o indicado.
Após o encontro, os quatro posaram juntos para fotos e deram declarações à imprensa, num gesto claro de alinhamento. Nunes disse que o apoio de Bolsonaro, Tarcísio e de seus respectivos partidos, PL e Republicanos, eram “argumentos fortes” em favor do coronel. Há meses, Bolsonaro vem condicionando o apoio de seu partido ao prefeito à indicação de Mello Araújo como vice. Nesta sexta, o ex-presidente disse que pretende alinhar o partido em torno do nome do emedebista.
As vantagens de ter como aliado um radical à direita
Embora resistisse a aceitar o nome de Mello Araújo — por entender que ele poderia levar a pauta da segurança pública para a campanha, o que o prefeito pretende evitar –, a entrada do coronel na chapa traz alguns aspectos positivos para Nunes na campanha.
Um deles, claro, é garantir o apoio de Bolsonaro e do PL, partido que tem o maior tempo de TV, a maior fatia do fundo eleitoral e o maior número de deputados eleitos em São Paulo. De quebra, consolida o apoio de Tarcísio e do Republicanos a sua campanha.
Coronel da reserva da Polícia Militar de São Paulo, Mello Araújo comandou a Rota, um batalhão de elite da PM paulista, entre os anos de 2017 e 2019 e tem o perfil do bolsonarista raiz. Sempre foi aliado do presidente, que o indicou para o cargo, e chegou a levá-lo para um evento em dezembro de 2020, que acabou reunindo uma multidão e virou um pequeno comício.
Nas redes sociais, fez posts atacando o ministro Alexandre de Moraes, do Supremo Tribunal Federal, e o então governador João Doria, desafeto do bolsonarismo. O coronel também coleciona declarações polêmicas, como críticas ao processo eleitoral e às vacinas, defesa de impeachment de ministros do STF e pregação contra o “comunismo”.
Esse perfil ajudaria Nunes a se aproximar do eleitorado mais à direita, como o bolsonarista raiz, e estancar uma eventual fuga desses eleitores para a candidatura do coach Pablo Marçal (PRTB), que entrou na disputa já empatando tecnicamente em terceiro lugar com Tabata Amaral (PSB) e Kim Kataguiri (União Brasil) — em ao menos um levantamento, Marçal atinge dez pontos percentuais.
Até então, a campanha na capital paulista indicava para uma disputa acirrada entre Nunes e o deputado federal Guilherme Boulos (PSOL). Os dois vêm registrando índices de intenção de votos semelhantes, ora com leve vantagem de um lado ou do outro, ora empatados tecnicamente.
A eleição em São Paulo é considerada crucial tanto para Bolsonaro quanto para o presidente Luiz Inácio Lula da Silva, que polarizam o cenário político nacional. PL e PT, entretanto, não têm nomes fortes para esta disputa. Ambos apostam em nome de apadrinhados políticos para vencer na cidade mais importante do país e garantir maior sustentação política para a eleição de 2026.
O presidente e seu antecessor, no entanto, têm abordagens divergentes em relação a seus indicados. Enquanto Lula já declarou apoio explícito a Boulos, Bolsonaro e Nunes mantinham uma relação protocolar, sem declarações explícitas de apoio de ambos os lados. Nunes tinha receio de que uma ligação mais explícita com Bolsonaro poderia afastá-lo do eleitor avesso ao radicalismo. Pesquisas de intenção de votos apontavam que mais da metade dos eleitores paulistanos rejeita o nome apoiado por Bolsonaro.
A entrada de Marçal, no entanto, embolou o jogo. Pelo seu perfil, o coach tem potencial de atrair o eleitor mais radicalizado à direita. Além disso, Marçal vinha alardeando que teria o apoio de Bolsonaro — e até se encontrou nos últimos dias com o ex-presidente e com parlamentares do PL. Nesta sexta-feira, Bolsonaro disse em público que o seu candidato será Nunes.
Polêmicas do coronel
Mello Araújo traz algumas vantagens para Nunes, mas também pode trazer alguns problemas. Durante o período em que esteve à frente da Rota, ele ganhou notoriedade por declarar que a corporação “trabalha mais com repressão” e por defender “abordagens diferentes” da polícia com moradores da periferia e de bairros nobres.N
Na Ceagesp, seus aliados dizem que ele promoveu uma “limpa” na companhia, combatendo a corrupção. Após dois anos à frente da empresa, no entanto, o ex-coronel tornou-se alvo de uma investigação do Ministério Público do Trabalho (MPT) por denúncias de assédio e coerção contra funcionários sindicalistas — relatos indicam uma frequente circulação de policiais armados nos entrepostos e até ameaças de morte.