O presidente Jair Bolsonaro enfrentará um dilema neste segundo semestre, terá que escolher uma entre as várias candidaturas do Supremo Tribunal Federal (STF) que tem estimulado. A lista de candidatos para as vagas que serão abertas no STF durante o seu mandato só cresce. Mas o político continua podendo indicar apenas dois nomes para a corte até 2022 – e o fará após as aposentadorias compulsórias de Celso de Mello, em novembro deste ano, e de Marco Aurélio Mello, em junho de 2021. Em Brasília, já se comenta frequentemente: deu overbooking para o STF. Com essa possibilidade ofertada, o presidente vai colecionando lealdades até de quem deveria exercer outro papel institucional.
O ex-ministro Sergio Moro era candidatíssimo ao posto até o dia 24 de abril, quando explodiu as pontes. Mesmo com sua saída – “prezada, não estou à venda”, escreveu ele para a deputada Carla Zambelli -, a lista de nomes fortes subiu para quatro. Agora são seis e subindo. Nessa lista, alguns postulantes que antes despontavam firmes estão perdendo força. Outros entraram com robustez, especialmente depois de uma postura de subserviência aos anseios de Bolsonaro.
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Clique e AssineO pastor e ministro “terrivelmente evangélico” da Justiça, André Mendonça, tem, a todo custo, tentado agradar o chefe, fazendo-se às vezes até de Advogado-Geral da União (AGU), cargo que já ocupou, mas do qual não consegue se desapegar. No inquérito das fake news, que trouxe pesadelo ao governo e aos bolsonaristas, André Mendonça entrou com pedido de habeas corpus em favor do ex-ministro da Educação Abraham Weintraub, assim como requisitou o trancamento do inquérito, medida que o presidente gostaria muito que fosse aprovado. Mendonça continua forte entre os cotados, ganhando cada vez mais a simpatia do seu “profeta”, como ele definiu Bolsonaro no dia que assumiu o ministério. O termo é usado nas igrejas para apontar autoridade ungida por Deus.
Outro nome ganhou força nos últimos dias. É o do presidente do Superior Tribunal de Justiça (STJ), João Otávio de Noronha, por quem Bolsonaro disse recentemente ter sentido “amor à primeira vista”. O magistrado já desobrigou o presidente de mostrar exames da Covid-19. Na semana passada, superou-se. Mandou o ex-faz-tudo da família Bolsonaro Fabrício Queiroz e sua mulher Márcia Aguiar, foragida da Justiça, para prisão domiciliar, decisão que gerou espanto entre os colegas do STJ.
O nome de Noronha já vinha chamando atenção, mas se destacou especialmente após evitar, pelo menos por hora, uma possível delação premiada de Queiroz e de Márcia. Mas a fila de espera por cadeiras do STF é maior. O procurador-geral da República (PGR), Augusto Aras, sempre teve esse sonho, dizem pessoas que o conhecem. E Bolsonaro já prometeu a ele até uma vaga que ainda não tem. Na virada do mês de maio para junho, o presidente afirmou em uma live: “Sobre o Augusto Aras, se aparecer uma terceira vaga… Eu espero que ninguém ali [no STF] desapareça, né, mas Augusto Aras entra fortemente [nela]”. Então, ele já acenou com uma cadeira que ainda não tem. E só terá se for reeleito ou se algum ministro “desaparecer”.
Na mesma transmissão na internet, Bolsonaro ainda definiu o trabalho de Augusto Aras, que investiga o presidente e seus seguidores em inquéritos, como “excepcional”. O mandatário ainda disse que o PGR tem buscado “defender o governo federal” em questões como as de “livre mercado”. É mais uma candidato que parece não saber o lugar que ocupa, pois o Ministério Público Federal não pode ser o defensor do governo. Internamente no MPF, Aras está isolado e é visto cada vez mais como bolsonarista, perdendo o respeito da categoria por posicionamentos alinhados ao governo não só na pauta econômica.
A esses três, somam-se ainda o candidato dos conservadores católicos Ives Gandra Martins Filho, ex-presidente do Tribunal Superior do Trabalho (TST), e dos evangélicos Marcelo Bretas, juiz dos processos da Lava-Jato no Rio. Outro que está presente em todas as bolsas de apostas é o Secretaria-Geral da Presidência da República, Jorge Oliveira, amigo da família Bolsonaro há décadas. Ele, contudo, tem perdido força. Major da reserva da Polícia Militar, Jorge Oliveira, tem um currículo jurídico estreito. Sua credencial é que ele e seu pai serviram fielmente no gabinete do então deputado Jair Bolsonaro.
Como lembrou VEJA, as decisões e os humores no STF têm sido desfavoráveis ao chefe do executivo. E a corte está cada vez mais unida neste posicionamento. Por isso, o presidente quer mudar esse quadro com nomeações. E tem usado o mesmo expediente que outros chefes de estado já utilizaram para designar ministros do STF, mas flertando com mais de um candidato ao mesmo tempo.
Nas cortes superiores de Brasília, contudo, diz-se que há um claro exagero na forma – vide a promessa de vagas que o presidente ainda não tem. Até aqui, o overbooking, venda de assentos acima do número de lugares disponíveis, tem sido bom para Bolsonaro. São diversos os afagos que ele tem recebido. No judiciário, passando pelo Ministério Público e chegando finalmente ao próprio governo.