O Ministério Público Federal (MPF) recomendou à Fundação Nacional dos Índios (Funai) que anule imediatamente a instrução normativa que altera o reconhecimento de limites das propriedades privadas. É uma tentativa do MPF de manter a proteção dos povos indígenas isolados e a preservação dos direitos já conquistados de etnias contatadas.
O documento foi assinado por 49 procuradores de 23 estados. É o maior esforço de que se tem notícia no MPF, desde o início do governo Jair Bolsonaro, para demonstrar repúdio aos desmandos da atual gestão da Funai.
O MPF também encaminhou o documento para a presidência do Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra) e a Direção-Geral do Serviço Florestal Brasileiro, com o intuito de que os órgãos se abstenham de cumprir a nova norma da Funai, alegando inconstitucionalidade, inconvencionalidade e ilegalidade.
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Clique e AssineConforme divulgou a coluna, uma instrução normativa publicada no Diário Oficial da União (DOU) do dia 22 de abril mudou as condições para a emissão da Declaração de Reconhecimento de Limites em relação a imóveis privados.
Esse documento é necessário quando há transações comerciais privadas ou doações de terras públicas para comprovar que o território em questão não foi reivindicado por povos indígenas.
Antes, caso a região estivesse sob estudo por pedido de povos indígenas, o atestado de limites não era emitido. Agora, a Funai só leva em consideração terras já homologadas, ao final de um longo processo, o que representa grande ameaça para algumas tribos.
Para se ter uma ideia da dimensão do risco, existem 114 registros de índios isolados atualmente, dos quais apenas 28 são confirmados. O restante ainda está sob pesquisa, sendo alguns deles fora de terras indígenas homologadas.
Diante disso, o MPF, em sua justificativa, alega que a instrução normativa “contraria a natureza do direito dos indígenas às suas terras como direito originário e da demarcação como ato declaratório”, conforme consta na Constituição, na Convenção 169 da Organização Internacional do Trabalho (OIT), na Declaração das Nações Unidas sobre os Direitos dos Povos Indígenas e reconhecido por decisões do Supremo Tribunal Federal (STF), do Superior Tribunal de Justiça (STJ) e de cortes internacionais.
Os procuradores destacam ainda que, além de inconstitucional, o repasse a particulares de terras consideradas juridicamente como sendo áreas indígenas pode caracterizar improbidade administrativa dos gestores que emitiram a instrução normativa. Sendo assim, estão suscetíveis a sofrer sanções como cassação de direitos políticos, proibição de contratar com o poder público e multas.
Mesmo que a palavra final seja da Justiça, a recomendação dos 49 procuradores acaba por jogar água fria na nova estratégia de comunicação da Funai, que tem soltado seguidas “notas de repúdio” contra a imprensa. Qualquer notícia que incomode o órgão é tratado como erro. Os procuradores acabaram mostrando que são reais as preocupações com as incongruências de atos normativos do órgão nas últimas semanas.
O que diz a Funai
“A Fundação Nacional do Índio (Funai) informa que a Instrução Normativa Nº 9, de 16 de abril de 2020, que disciplina o requerimento, análise e emissão da Declaração de Reconhecimento de Limites em relação a imóveis privados, foi elaborada com base em preceitos legais, respeitando os princípios da Administração Pública e a Constituição Federal.
Esta fundação esclarece que toda análise de reconhecimento de limites segue rito minucioso e é realizada em processo administrativo específico, contendo procedimentos que atendem a rigorosas avaliações técnicas e à legislação pertinente, sob responsabilidade da Diretoria de Proteção Territorial do órgão.
A Instrução Normativa Nº 9 emanada pela Funai, instituição defensora da legalidade e dos direitos dos povos indígenas, visa à segurança jurídica na gestão fundiária e à pacificação dos conflitos territoriais no campo, respeitando o direito de propriedade de cada cidadão, indígena e não-indígena.
A Funai reforça ainda que não será emitida Declaração de Reconhecimento de Limites para imóveis incidentes em terra indígena homologada ou regularizada, reservas indígenas, nem em terras indígenas dominiais havidas por qualquer das formas de aquisição do domínio, nos termos da legislação civil, de propriedade de comunidade indígena”.
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