Após uma semana de crises institucionais graves, um inédito pedido de impeachment do presidente da República a um ministro do Supremo Tribunal (STF) e buscas e apreensões na casa de famosos cantores apoiadores do governo atual, segue uma singela carta aos extremistas do bolsonarismo:
Caros seguidores do presidente Jair,
Durante o governo do Partido dos Trabalhadores, inúmeros processos da Lava Jato, a operação que vocês tanto apoiaram na eleição de 2018, tramitaram no STF. Inúmeros mesmo. Posso dar um exemplo que você, leitor, não esqueceu. Tenho certeza.
Somente o mega acordo da delação do grupo Odebrecht gerou 83 inquéritos na mais alta corte da República. Eram 78 executivos da empreiteira, incluindo o ex-presidente da empresa Marcelo Odebrecht, e seu pai, Emílio – todos delatores de uma lista interminável de crimes envolvendo centenas de pessoas.
Neste momento ainda estávamos no ano de 2016. No ano seguinte, o então Procurador-Geral da República retirou o sigilo das delações. Foi o caos no Brasil. Um caos de proporções nunca antes visto. Sergio Moro, até então herói de vocês seguidores de Bolsonaro, tomou a mesma decisão e deu publicidade aos processos.
Tá… você, leitor mais atento que leu esta coluna até aqui, deve estar se perguntando por que estou falando de processos que corriam em primeira ou na última instância e por que estou tratando da diferença entre os processos que tramitam no STF e nas varas criminais federais, como a de Curitiba?
Simples. A maior reclamação dos bolsonaristas trata-se da atuação do ministro Alexandre de Moraes em casos como o de Sérgio Reis, ou do insignificante blogueiro Allan dos Santos, ou de outros extremistas de direita. Diga aí um bolsonarista raiz que não tenha foro privilegiado? Carluxo?
Quando o PT estava no poder, 83 inquéritos da Lava Jato (repito, somente os nascidos pela delação da Odebrech) tramitavam no STF com parlamentares, ministros de Estado sendo acusados de desvios, corrupção, lavagem de dinheiro, mas em processos que também envolviam pessoas sem foro privilegiado, gente como Sérgio e Allan.
Se os crimes são conexos, tramitam juntos. Por exemplo, diversas pessoas sem foro foram investigados e julgados pelo STF. Vou falar um: o ex-sindicalista Paulo Okamoto, que também foi presidente do Sebrae, acabou acusado na delação do ex-senador Delcídio do Amaral, com alguns dos seus detalhes revelados por este colunista.
Okamoto também foi investigado no STF após o executivo Alexandrino Alencar, nome forte da Odebrecht, ter relatado que, entre 2012 e 2013, deu ajuda financeira ilícita para ele, então presidente do Instituto Lula. Ou seja, não tinha foro, mas acabou investigado aonde? No Supremo.
O que vemos hoje? Alguns inquéritos, como o das Fake News, que investigam o presidente Jair Bolsonaro, que tem foro, que investigam parlamentares, seguidores do presidente que propagam notícias falsas e que têm foro, mas que também apuram o envolvimento de empresários, como o dono da Havan, e cidadãos comuns – músicos como Sérgio Reis.
Trata-se da suspeita de que uma organização criminosa atua em vários setores da sociedade, inclusive dentro do Palácio do Planalto através do chamado gabinete do ódio. Nessa suposta organização, existem pessoas, com ou sem foro privilegiado, tentando espalhar notícias falsas. É o que acontece quando um grupo se aproveita do poder para, possivelmente, cometer crimes. Nada diferente do que ocorreu em um passado tão recente, quando a esquerda estava no poder. Simples assim.
PS- Se você é daqueles atores do Direito, defensores deste governo ou não, que reclamam da forma como o inquérito das fake news foi aberto, sinto muito. O plenário do Supremo, este mesmo imbuído pela Constituição de 88, decidiu que a investigação é legal. Supera, meu filho (a). Tá na hora.