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Brasil e Israel: é complicado, só não vale vexame paraguaio

Mudar embaixada para Jerusalém exige um propósito político e diplomático bem claro para não repetir o que fez o Paraguai, que foi e acabou voltando

Por Vilma Gryzinski 8 nov 2018, 09h53

Nunca existiram tantos especialistas em relações internacionais quanto os que açoitam o futuro governo brasileiro pela intenção declarada – e depois amenizada – de mudar a embaixada para Jerusalém.

É também evidente o tom celebratório que cercou a braveza do Egito, cancelando uma visita do atual ministro das Relações Exteriores.

De repente, os “países árabes”, mencionados assim, coletivamente, viraram o fator que já detonaria a futura política externa, condenando os exportadores de carne brasileira à falência.

Alguns fatos podem ajudar a compreender um pouco melhor as inúmeras complicações envolvidas.

Toda política externa merecedora dessa designação é composta por uma mistura de interesses e princípios. Nos Estados Unidos, as duas correntes têm a designação de “pragmática” e “idealista”.

Até a maior superpotência de todos os tempos precisa acomodar os dois componentes. Um exemplo atual: o governo de Donald Trump pode condenar e até decretar sanções contra a Arábia Saudita pelo bárbaro assassinato do jornalista Jamal Khashoggi?

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Se fizer isto, estará desmontando toda a sua política para o Oriente Médio. Tem que agir nos bastidores – como fez ao tirar os filhos de Khashoggi do país –, emitir declarações condenatórias equilibradas e esperar o tempo passar. Não é bonito, mas é pragmático.

A Arábia Saudita é vital para os Estados Unidos, não só pelo petróleo quanto pelo papel que ocupa no desenho do governo Trump para o Oriente Médio.

Juntamente com outros países do Golfo Pérsico e com o Egito, forma uma espécie de aliança não declarada para isolar o Irã. E, eventualmente, emplacar um acordo entre palestinos e Israel.

Chegamos, assim, a Jerusalém. Trump mudou a embaixada americana com grande estardalhaço e prognósticos de que abriria os portões do inferno.

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Aconteceu isso? Não. O Egito e outros países árabes reclamaram? Não poderiam deixar de fazê-lo: protestos pro forma atendem, sobretudo, ao público interno. Fizeram alguma retaliação concreta? Claro que não.

E Trump fez a mudança da embaixada por puro idealismo? Também não.

Eventualmente, ele vai apresentar a conta desse e de outros gestos importantes de apoio a Israel para ver se consegue o Santo Graal dos sonhos de todo presidente americano, um acordo de paz permanente para o Oriente Médio.

É bastante provável que não consiga, mas existe um propósito em suas jogadas diplomáticas.

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O único país que seguiu o modelo americano foi a Guatemala, onde o presidente, Jimmy Morales, é evangélico e um gesto de apoio aos Estados Unidos conta muito.

Mais complicado foi o vai-e-vem do Paraguai. Quando Horacio Cartes era presidente, mudou a embaixada para Jerusalém, logo depois da decisão americana. Obviamente, recebeu vastas manifestações de gratidão do primeiro-ministro Benjamin Netanyahu.

Cartes não era imune a sugestões dos Estados Unidos. Também contou com apoio de uma ala dos evangélicos paraguaios e até de uma equipe de assessores israelenses em sua campanha eleitoral.

Três meses depois, o presidente era outro, Mario Abdo Benítez. E lá se foi a embaixada de volta para Telavive.

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Marito, como é conhecido, é do mesmo partido que Cartes, o Colorado, mas de uma ala diferente. Tem irretocáveis credenciais de direita. Seu pai foi secretário particular de Alfredo Stroessner, que morreu no exílio, em Brasília, depois de 35 anos de ditadura.

A origem libanesa pode ter pesado na decisão que deixou Netanyahu louco da vida. Mas os exportadores de carne paraguaia para Israel garantiram que não foram afetados. Chato foi ouvir representantes palestinos se jactarem da influência que tiveram na decisão.

A identidade árabe também contou na movimentação do deputado Carlos Marun, atual ministro da Secretaria de Governo, no boicote a Dani Dayan, nomeado embaixador de Israel no Brasil, por ser proveniente de um assentamento judeu em território originalmente palestino.

A presidente da época não aceitou as credenciais. Marun foi muito elogiado por movimentos sociais e outras forças de esquerda, imaginem só.

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Foi o episódio Dayan que levou o porta-voz do Ministério das Relações Exteriores, Yigal Palmor, a chamar o Brasil de “anão diplomático”. Palmor acabou demitido.

Na verdade, o Brasil não é anão nem gigante. Tem um peso considerável, sobretudo como fornecedor de matérias primas e um interesse estratégico em manter e aumentar mercados.

Mas o pragmatismo também precisa do contrapeso dos princípios.

Em 1973, os exportadores árabes de petróleo decretaram o embargo da venda do produto que move o mundo contra os Estados Unidos e outros por causa da Guerra do Yom Kippur, uma das muitas derrotas sofridas para Israel.

O preço disparou catastroficamente. O Brasil, sob o regime militar, começou fazendo acordos vantajosos de troca de produtos nacionais por petróleo com o Iraque. Acabou fornecendo urânio para a eventual fabricação de armas nucleares.

Caso alguém não se lembre, o Brasil na época, especialmente quando Ernesto Geisel foi presidente da Petrobras e, depois, do país, tinha uma política de antiamericanismo ostensivo.

E Saddam Hussein não terminou num lugar tranquilo.

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