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Bukele pôs bandidos na cadeia e será reeleito com 80% dos votos

A fórmula parece simples, mas só quem conseguiu aplicá-la foi o presidente de El Salvador, com todas as restrições que o caso provoca

Por Vilma Gryzinski Atualizado em 9 Maio 2024, 10h45 - Publicado em 1 fev 2024, 07h55

Muita gente já leu a fórmula básica das reportagens sobre Nayib Bukele: ele reduziu drasticamente a criminalidade e vai ganhar a reeleição desse domingo com uma maioria esmagadora, mas…

Geralmente, muitos jornalistas só estão interessados em falar o que vem depois do mas: Bukele sabotou as bases do estado de direito, passou por cima da suprema corte, atropelou os direitos humanos e a constituição. Uma das acusações mais interessantes é de que ele tem sucesso demais e, por isso, provocou o risco de que seu partido, o Novas Ideias, criado do nada, vai se tornar hegemônico.

É tudo verdade. Todos os candidatos oposicionistas não chegam a 12% dos votos e o que está mais à frente tem apenas 5% das preferências. As pesquisas indicam que o Novas Ideias vai eleger 57 dos 60 deputados.

El Salvador ainda está longe de se transformar numa “Nicarágua de direita”, uma versão invertida de vizinho centro-americano onde reinam Daniel Ortega e sua mulher, Rosario Murillo.

Significaria isso que nós, latino-americanos, somos viciados num caudilho e não conseguimos viver em regimes plenamente democráticos sem ter uma figura forte (ou duas, como no caso da Nicarágua)? É possível.

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“MODELO BUKELE”

Também é fato que Bukele é um fenômeno sem precedentes. Mesmo regimes ditatoriais nunca conseguiram combater a criminalidade com a eficiência demonstrada por ele e refletida num número espantoso: de 106 homicídios por 100 mil habitantes, a taxa recordista de 2015, o país caiu para 2,4 no ano passado.

A desarticulação das quadrilhas, chamadas maras, mudou a vida da população. Acabou o controle territorial das gangues nos bairros mais pobres, pequenos comerciantes não precisam mais pagar a taxa de “proteção” e sair à rua a qualquer hora deixou de ser uma atividade de risco.

Imaginem a popularidade de um governante brasileiro, de qualquer matriz ideológica, que conseguisse fazer isso.

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Obviamente, o “modelo Bukele”, popular em países de alta criminalidade como Equador e Haiti, é impraticável num país grande, complexo e, comparativamente, avançado como o Brasil. El Salvador tem área de apenas 21 mil quilômetros quadrados, seis milhões de habitantes e 28 bilhões de dólares de PIB.

O turismo aumentou com a restauração da segurança pública e o país foi sede até do concurso Miss Universo, ao qual Bukele compareceu de smoking e visivelmente maquiado. Parece bobagem, mas foi importante para muitos salvadorenhos que viam como única opção de uma vida segura a imigração clandestina para os Estados Unidos.

Em compensação, projetos grandiosos como a Bitcoin City, uma fantasia movida a energia geotérmica vinda do maior vulcão do país, continua a ser apenas isso – uma fantasia. A obra mais ambiciosa feita no país, a Biblioteca Nacional, foi bancada pela China, que abriu a Bukele as portas fechadas pelos Estados Unidos – obviamente, com as devidas compensações.

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IDENTIDADE VISUAL

Em escala muito menor do que a brasileira, existe em El Salvador a mesma confluência de mídia e mundo acadêmico que tende à esquerda e tem horror a tudo o que Bukele está fazendo. “As hordas de Soros estão à solta faltando uma semana para as eleições”, escreveu ele no X, reiterando a acusação de que o bilionário esquerdista financia a modesta oposição que sobrevive em ambientes como o jornal digital El Faro.

Bukele fez toda a campanha pelo X, o veículo que domina. Como ex-profissional de marketing, criou uma identidade visual forte: barba desenhada, boné invertido, paletó sem gravata em compromissos oficiais, jeans e camisetas bem justas em ocasiões informais para mostrar o corpo em forma. As camisetas também foram uma parte importante da campanha sem comícios, inclusive uma que diz, modestamente: “Bukele, o melhor presidente do mundo”.

Não existem presos políticos em El Salvador, a marca dos regimes de exceção. As críticas ao proporcionalmente enorme contingente de 70 mil presos comuns colocados na cadeia, inclusive uma construída a jato para acomodar os novos contingentes, não comovem a população comum.

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Bukele pode ter reações surpreendentes. Quando o Hamas atacou comunidades israelenses em outubro, praticando atrocidades indescritíveis, ele disse: “Como salvadorenho com ascendência palestina, tenho certeza que a melhor coisa que poderia acontecer ao povo palestino seria se o Hamas desaparecesse completamente. Estas bestas selvagens não representam os palestinos”.

A caminho de uma reeleição consagradora, Nayib Bukele ainda guarda muitas surpresas. A história nos ensina que os pendores autoritários aumentam com a popularidade e esse talvez seja o maior desafio de Bukele, agora que a bandidagem está presa: resistir a si mesmo.

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