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Israel: cinco eleições em quatro anos, 39 partidos – e Netanyahu na frente

Quando o sistema parecia conduzir a mais um beco sem saída, o ex-primeiro-ministro consolida outra arrancada considerada impossível

Por Vilma Gryzinski Atualizado em 2 nov 2022, 07h36 - Publicado em 2 nov 2022, 07h36
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  • Benjamin Netanyahu é imorrível. Deu a volta por cima em condições que derrubariam a maioria dos políticos – incluindo três processos por corrupção e um eleitorado que parecia exausto de tanto patinar no mesmo lugar, com partidos fragmentados, eleições sucessivas e a sensação generalizada de que o país inteiro estava preso numa versão israelense do Feitiço do Tempo.

    O atual governo, por exemplo, foi formado por uma coalizão entre oito partidos. É claro que não podia dar certo, mesmo com figuras fortes como Yair Lapid, o primeiro-ministro que será substituído quando – e se, sempre é preciso ter cautela – for formado um novo governo, com os derradeiros votos ainda sendo contado.

    A coalizão tinha um único objetivo em comum: desbancar Netanyahu. Sem uma política coesa e abrangente, foi ficando pelo caminho.

    O mundo deu outra volta e Netanyahu voltou a se beneficiar do avanço da direita, que elegeu, raspando, 161 ou 162 deputados.

    As alianças que terá que fazer são complicadas e incômodas até para a direita tradicional, que dirá o espectro político do centro à esquerda.

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    O fenômeno do momento é Itamar Ben Gvir, um quase desconhecido até recentemente. Ligado ao Sionismo Religioso, seu partido elegeu 15 deputados, o que lhe dá uma força tremenda.

    Ben Gvir tem origem política num dos piores movimentos da história recente de Israel, o ultranacionalista Kash. Liderado pelo rabino americano Meir Kahane, o Kach chegou a ser proibido de participar da política, tal o radicalismo de suas posições. Uma de suas propostas: cassar a nacionalidade dos não-judeus (Israel tem 20% de população árabe, fora outras minorias) e proibir que judeus se casassem ou tivessem relações sexuais com pessoas fora da tribo. Em resumo, propunha leis raciais, baseado em princípios elaborados quase mil anos atrás. Kahane foi assassinado em Nova York, em 1990, por um americano de origem egípcia, o que só ajudou seus partidários extremistas a transformá-lo em mártir.

    O partido atual é produto de uma aliança entre Ben Gvir e outro radical, Bezalel Smotrich, apadrinhada por Netanyahu. Conseguiu tanto destaque que está deixando fazendo sombra a partidos da chamada direita religiosa, formada por praticantes da vertente ultraortodoxa da religião judaica.

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    Netanyahu certamente fica incomodado com a popularidade de Ben Gvir entre uma fatia do eleitorado que ele considerava estar, para todo o sempre, em seu bolso. Para formar uma coalizão, terá que dar um ministério importante a Ben Gvir. O incômodo aliado, que defende a pena de morte para terroristas e provas de lealdade ao Estado judeu por parte de cidadãos árabes, quer ser ministro da Segurança Pública.

    Numa conversa vazada com Bezalel Smotrich, Ben Gvir ironiza Netanyahu e o chama de mentiroso que está com o tempo contado. “Com Netanyahu, a física ou a biologia vão seguir seu curso. Ele não estará para sempre aqui, em algum momento será condenado pela justiça”. Dá para imaginar o clima entre os aliados.

    O avanço da direita é um fenômeno de várias décadas, alimentado pela sensação de que qualquer concessão sempre acaba sendo prejudicial para Israel. O caso de Gaza é um exemplo. O território foi devolvido aos palestinos em 1994, com a ideia de que seria um passo importante para um acordo final de paz. Em vez disso, transformou-se num foco de radicalização, com militantes do Hamas e outros grupos atacando Israel a intervalos regulares. Usam, em geral, foguetes fáceis de ser interceptados pela Cúpula de Ferro, o sistema antimísseis que protege Israel, evitando, assim, uma guerra total.

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    Mesmo com capacidade limitada, os ataques insuflam a sensação de insegurança à sombra da qual avançam os extremistas ultranacionalistas, movidos também por sentimentos religiosos excludentes.

    Grande mestre em sobrevivência política, Netanyahu viu o potencial eleitoral do novo movimento e articulou para integrá-lo a seus planos de retornar ao poder. 

    Quando o Estado de Israel foi fundado, existiam duas correntes políticas: direita e esquerda, sendo essa dominante. Era, obviamente, muito mais simples.

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    A fragmentação política atual reflete um país mais complexo, com o enfraquecimento da esquerda, um centro que não se sustenta por si, a ascensão dos religiosos mais ortodoxos – praticamente extintos durante o Holocausto – e o avanço zero de um projeto que permita a acomodação entre judeus e árabes, com paz e segurança para todos, um ideal tão lamentavelmente fracassado.

    Nada disso vai mudar com um novo governo Netanyahu. Não será ele o estadista a aderir a um projeto de criação de um estado palestino propriamente dito, embora, na prática, já funcione um na Cisjordânia. Mas seu impressionante retorno vai levar os partidários mais entusiastas a chamá-lo de “rei de Israel”. Curiosamente, alguns gritos desse tipo receberam Ben Gvir em eventos da campanha. Vai ser interessante ver como os egos se acomodam.

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