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O incêndio se alastra: Irã chega mais perto da bomba nuclear

Regime vai aumentar a produção do material atômico, depois de cometer atos de guerra ao atacar petroleiros; isentões vão ter que descer do muro

Por Vilma Gryzinski 16 jun 2019, 12h21
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  • A caldeira que o regime iraniano esquenta há muitos anos, ora aumentando a temperatura, ora recuando, ou fingindo recuar, vai voltar a pegar fogo.

    Amanhã, anunciará que o reator de água pesada de Arak, construído nos anos noventa com ajuda de “especialistas estrangeiros” – soletrando: r-u-s-s-o-s – passa a modificar o urânio que alimenta as reações nucleares “sem limitações”.

    É o clássico ataque do rato acuado. Depois que os Estados Unidos saíram do acordo nuclear de 2015 e apertaram as sanções econômicas, na sua posição única de detentores da moeda de referência, a economia iraniana encolheu 4% no último ano; e vai passar para 6%.

    Não deu muito certo o truque dos atos “anônimos” de sabotagem contra petroleiros estrangeiros, como uma espécie de aviso aos vizinhos inimigos e ao resto do mundo que o Irã pode infringir dor e prejuízo através da arma do petróleo.

    Atacar embarcações comerciais que navegam com propósitos legítimos em águas internacionais ou territoriais é um crime que nem precisa ser explicitado (mas é, nas longas e devidas convenções da ONU).

    Como o Irã acostumou-se a praticar uma longa lista de crimes internacionais, inclusive os dois atentados terroristas contra alvos judaicos em Buenos Aires que até hoje assombram a política argentina, os ataques contra dois petroleiros no Golfo de Omã poderiam entrar para a lista de impunidades.

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    Depois dos primeiros ataques, o que não faltou foram colaboradores interessados em deixar para lá,  desde países europeus até a oposição e órgãos da imprensa americana. Tudo tem origem na saída do acordo nuclear, suspiravam, de raiva de Donald Trump e saudade de Barack Obama.

    “Para um presidente conhecido por falsidades e retórica produtora de crises, o teste da credibilidade é um desafio”, escreveu o New York Times depois que  Trump declarou, no estilo habitual, que os ataques criminosos “tinham a assinatura do Irã”.

    Ou seja, para o jornal o problema de credibilidade é de Trump e não do Irã. Precisa de mais alguma prova do desarranjo emocional e jornalístico provocado pela Síndrome de Distúrbio Trumpiano?

    Desconfiar de presidentes, além de todos os outros escalões do poder, é obrigação da imprensa, mas procurar desculpas para não acreditar na autoria dos ataques contra dois petroleiros, repetição mais grave de crimes semelhantes cometidos um mês atrás, já entra no terreno perigoso da cumplicidade com o crime.

    Se não foi o Irã, as outras hipóteses seriam: agentes não estatais foram os autores (uma impossibilidade pelos recursos técnicos e operacionais), ou agentes operando em nome de algum ou alguns outros países praticaram um ato de bandeira falsa (a versão do Irã). Resta ainda a possibilidade algo mais remota de que os navios se autoexplodiram.

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    As digitais do Irã aparecem num vídeo divulgado pela Marinha americana mostrando que uma embarcação iraniana, sem bandeira e cheia de homens em roupas civis, se aproxima de um dos petroleiros atacados e retira do casco uma mina magnética que não havia explodido.

    Se a mina fosse encontrada, como obviamente seria, teria literalmente o DNA dos iranianos.

    Jeremy Hunt, o ministro das Relações Exteriores da Grã-Bretanha que se fez de desentendido, há um mês , por ocasião dos primeiros atos de sabotagem (está em campanha para ser primeiro-ministro e preferiria não ter encrencas do gênero, ainda mais por eventuais desdobramentos bélicos), dessa vez foi durão.

    Confirmou os autores do crime, via o serviço britânico de inteligência. Cem fuzileiros navais da Marinha Real foram enviados ao Golfo Pérsico para reforçar a proteção aos navios que levam 18 milhões de barris de petróleo por dia, fora o gás natural, para literalmente mover o mundo.

    O site Bloomberg, pertencente ao bilionário Michael Bloomberg, um antitrumpista militante via o poder incalculável de uma fortuna de 54 bilhões de dólares, deu o seguinte aviso aos isentões que preferem fingir que não foi comprovada a autoria iraniana:

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    “Os recentes ataques contra petroleiros no Golfo de Omã puseram vidas em perigo, perturbaram o tráfego em algumas das rotas marítimas mais importantes do mundo e forçaram um aumento dos preços globais da energia.”

    “E não foram os primeiros: petroleiros que haviam zarpado do porto de Fujairah foram atacados no mês passado. Esses ataques contínuos e irresponsáveis precisam ser respondidos.”

    “O governo Trump deveria apresentar todas as provas que levantou à  ONU e especialmente aos aliados europeus. Se comprovadas, as provocações da República Islâmica exigem uma resposta coordenada.”

    O tom é todo cheio de dedos, para não dar a impressão de que endossa de acusações levianas, mas não deixa dúvida de que “é necessária uma ação coletiva para mostrar aos líderes do Irã que isso não vai funcionar”.

    O problema é que, durante muito tempo, os estratagemas iranianos funcionaram. O regime dos aiatolás chegou a comprar um governo inteirinho – o de Cristina Kirchner, endossada pelo Congresso argentino – para se livrar das acusações no caso do atentado contra a  associação judaica.

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    O governo Obama deixou-se seduzir pela perspectiva, compreensivelmente tentadora, de um acordo para engessar a bomba iraniana sob inspeção internacional. Chegou a mandar 1,7 bilhão de dólares em dinheiro vivo, como compensação por fundos congelados depois da revolução dos aiatolás.

    Por incrível que pareça, agora existem atores internacionais dispostos a acreditar na versão iraniana de que tudo foi uma armação dos Estados Unidos e Israel. Invocam táticas de operações secretas, contrapropaganda e casos anteriores, como o das inexistentes armas de destruição em massa do Iraque, como se as duas situações fossem comparáveis.

    “Os que querem parecer sábios entre os tolos, acabam por parecer tolos entre os sábios”.

    Só para lembrar: o Irã não quer um confronto direto, muitíssimo menos com os Estados Unidos, pretende apavorar todo mundo com a expectativa de uma guerra e forçar uma volta para o status quo vigente antes da renovação das sanções.

    Donald Trump tem interesse menor ainda em outro conflito no Oriente Médio. Ainda mais um que destruiria a sua base eleitoral. Quer forçar o Irã a negociar um novo acordo nuclear – aí, sim, um belo troféu para a campanha pela reeleição.

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    Mas se são cometidos atos de guerra  reiterados, como ataques contra embarcações comerciais “inocentes” – este é o termo técnico das convenções da ONU -, a superpotência que garante a livre navegação em todo o planeta, além da estabilidade energética, não pode ficar imobilizada.

    Os culpados precisam ser punidos. Isso não é questão de opinião ou simpatia política, mas de realismo. Com o cuidado que uma situação extremamente inflamável como a do Irã exige.

    Para complementar a citação sobre os tolos, de Quintiliano, o gênio romano da retórica, vai aqui uma do gênio florentino da ciência política:

    “Tendo o príncipe a necessidade de saber usar bem a natureza do animal, deve escolher a raposa e o leão, pois o leão não sabe se defender das armadilhas e a raposa não sabe se defender da força bruta dos lobos. Portanto, é preciso ser raposa, para reconhecer as armadilhas, e leão, para amedrontar os lobos.”

    E pedir aos céus para que Donald Trump dê pelo menos uma chance a Maquiavel.

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