Black Friday: Assine a partir de 1,49/semana
Imagem Blog

Mundialista

Por Vilma Gryzinski Materia seguir SEGUIR Seguindo Materia SEGUINDO
Se está no mapa, é interessante. Notícias comentadas sobre países, povos e personagens que interessam a participantes curiosos da comunidade global. Este conteúdo é exclusivo para assinantes.

Paquistão bombando: ex-playboy vira político simpático à jihad

Com uma história de cair o queixo, Imran Khan vai de herói do esporte a premiê de um país literalmente explosivo, inclusive por causa da bomba atômica

Por Vilma Gryzinski Atualizado em 27 jul 2018, 17h12 - Publicado em 27 jul 2018, 17h08

Ele é bonito, inteligente, bem nascido, estudou em Oxford, casou-se com uma socialite milionária, era ídolo nas páginas de celebridades dos tabloides ingleses.

Rejeitou tudo isso e virou político misturando populismo e islamismo. O repúdio ao Ocidente tem até um nome no Paquistão, lota.

“Embora a ciência responda a muitas questões, por mais que avance, nunca conseguirá ter resposta para duas: primeiro, qual é o sentido da vida; segundo, o que acontece conosco depois da morte”, já disse, numa longa entrevista em que falou como a lota aconteceu em sua vida.

A prova mais estarrecedora da “conversão” de Imran Khan aos princípios muçulmanos mais fundamentais é seu terceiro casamento: ele não viu o rosto da noiva, oculto pelo véu, até a celebração, em primeiro de janeiro deste ano.

Como tudo é extraordinariamente complexo na vida do ex-campeão mundial de críquete, o esporte herdado da época do colonialismo britânico, quando o Paquistão ainda era parte da Índia, a noiva era casada, tinha cinco filhos e se tornou, através da proximidade entre as famílias, a “guia espiritual” de Imran Khan.

Daí para trocar de marido, não demorou muito. A família do marido dela segue um guru sufista, a corrente altamente mística do Islã.

A própria Bushra, o nome dela, diz que teve um sonho profético em que Maomé apareceu a ela e garantiu que se se casasse com Imran Khan, ele seria o líder político que restauraria o Paquistão.

Continua após a publicidade

Como se isso não fosse suficientemente estranho, a segunda mulher de Imran Khan, uma apresentadora de televisão, escreveu um livro dizendo que ele é gay e tem um relacionamento com outro ex-jogador de críquete, entre outros.

Como o livro coincidiu com a campanha – e com uma chuva de processos, claro -, até a mais ingênua das almas suspeitaria que foi encomendado. Imran Khan atribuiu a intriga a diretamente a Nawaz Sharif, o ex-primeiro-ministro a quem combateu durante anos.

Atualmente em temporada no sistema prisional, condenado no começo do mês a dez anos por níveis de corrupção impressionantes até pelos padrões paquistaneses, Sharif reconheceu, da cadeia e com muita má vontade, a vitória de seu grande inimigo.

Para fechar o capítulo conjugal. A primeira mulher de Imran Khan e Jemima Goldsmith, socialite inglesa que se converteu primeiro ao Islã, para se casar com o campeão de críquete, com quem formava um par de parar o trânsito, e depois ao esquerdismo.

Logo depois do casamento, Khan decidiu entrar para a política no Paquistão e Jemima foi junto.

Continua após a publicidade

Criada em palácios, filha de um casal que misturava aristocracia, dinheiro e um relacionamento publicamente aberto a outros parceiros, judia pelo lado paterno, ela enfrentou certas dificuldades. Chegou a ser acusada de contrabandear azulejos classificados como antiguidades e precisou sair do país – a motivação política da denúncia acabou comprovada.

A princesa Diana se aproximou mais da amiga Jemima quando namorou o cirurgião paquistanês Hasnat Khan.

Palavra final

O nome não indica parentesco com o novo primeiro-ministro, mas a mesma origem étnica: o grupo pachto, que se espalha entre o Paquistão e o Afeganistão (a família do médico era mais conservadora do que a do ex-jogador de críquete e não admitiu de jeito nenhum que ele se casasse com uma estrangeira, mesmo que se convertesse, como Diana estava disposta a fazer).

O movimento islamista ultrarradical Talibã, que chegou a tomar o poder no Afeganistão, com as conhecidas e catastróficas consequências  – abrigou Osama Bin Laden e, depois do Onze de Setembro, foi derrubado na unha por intervenção militar internacional armada pelos Estados Unidos -, é todo formado por pachtuns.

A unidade étnica, sustentada pela crença religiosa, é um dos motivos da impossibilidade de derrotar militarmente os talibãs.

Continua após a publicidade

É também uma das bandeiras levantadas por Imran Khan que mais indicam sua aproximação com o jihadismo, a luta armada em nome do Islã.

A simpatia declarada pelo Talibã ecoa nas relações bem menos transparentes de Imran Khan com as correntes mais islamistas das Forças Armadas.

A miríade de serviços de espionagem, correntes internas e alianças espúrias entre os militares torna quase indecifrável qual ala é preponderante. Fazer uma coisa e seu contrário, como abrigar secretamente Bin Laden e ao mesmo tempo fingir total colaboração com  os Estados Unidos, é um comportamento natural nesse ambiente.

Mas, no momento, Khan parece ter um acordo com os mais iguais entre os iguais. A rede de poder, negócios e alianças com grupos religiosos criada pelos militares garante-lhes a palavra final em tudo.

Como em outros países sem instituições, os militares definiram os rumos do Paquistão. Foram três golpes diretos desde  Partilha com a Índia, cruento nascimento do país. No mais momentoso, em 1977, o primeiro-ministro Zulfikar Ali Bhutto, foi não apenas derrubado, como preso, julgado e executado por enforcamento.

Continua após a publicidade

A filha dele, Benazir, herdou a coroa do pai, foi primeira-ministra duas vezes e poderia ganhar mais uma eleição, mas foi assassinada durante a campanha de 2008, num crime encomendado pelo Talibã paquistanês (sim, existe isso também).

A tradição formidavelmente corrupta da família foi levada adiante pelo marido dela, Asif Ali Zardari. Antes de ficar viúvo e ser eleito presidente, passou uma temporada de oito anos recolhido no sistema prisional, pelos motivos de sempre.

Mesmo preso, foi eleito senador. Pare que é uma tradição de países que o presidente Donald Trump chamou de buracos especialmente fundos.

Bons sonhos

A família Bhutto é xiita, uma minoria muçulmana brutalmente perseguida, mas não declarava práticas religiosas e seguia padrões laicos. Por mais surreal que pareça, eram nominalmente socialistas.

Imran Khan era da mesma turma das elites secularizadas antes de se “reconverter”. Falando à Deutsche Welle, a agência noticiosa alemã,  o jornalista paquistanês Owais Tohid enumerou os motivos que fazem do futuro primeiro-ministro uma figura alinhada com o islamismo radical, embora sem o rótulo partidário dos grupos jihadistas.

Continua após a publicidade

“Todas as suas opiniões sobre a região e o mundo, e em particular sobre os grupos militantes no Paquistão, são simpáticas quando não alinhadas à direita religiosa. Ele é contra a repressão militar aos grupos militantes e não aceita que tenha havido um aumento da cultura jihadista no Paquistão.”

Carismático, com grande apelo entre os jovens e, agora, bem votado, Imran Khan fala a linguagem e entende a narrativa ocidental com total desenvoltura.

Uma personalidade assim, com simpatia pelo islamismo, no comando de um país com bombas nucleares e um lugar vital no mapa geopolítico só pela vizinhança com o Afeganistão, para ficar no motivo principal, cria novas camadas de complicação num lugar onde pode faltar tudo, menos encrenca.

Tomara que os novos sonhos de Bushra, a mulher e guia espiritual, tragam bons conselhos.

Publicidade

Imagem do bloco

4 Colunas 2 Conteúdo para assinantes

Vejinhas Conteúdo para assinantes

Matéria exclusiva para assinantes. Faça seu login

Este usuário não possui direito de acesso neste conteúdo. Para mudar de conta, faça seu login

Black Friday

A melhor notícia da Black Friday

BLACK
FRIDAY

MELHOR
OFERTA

Digital Completo

Acesso ilimitado ao site, edições digitais e acervo de todos os títulos Abril nos apps*

a partir de 5,99/mês*

ou
BLACK
FRIDAY
Impressa + Digital
Impressa + Digital

Receba 4 Revistas no mês e tenha toda semana uma nova edição na sua casa (menos de R$10 por revista)

a partir de 39,96/mês

ou

*Acesso ilimitado ao site e edições digitais de todos os títulos Abril, ao acervo completo de Veja e Quatro Rodas e todas as edições dos últimos 7 anos de Claudia, Superinteressante, VC S/A, Você RH e Veja Saúde, incluindo edições especiais e históricas no app.
*Pagamento único anual de R$71,88, equivalente a 5,99/mês.

PARABÉNS! Você já pode ler essa matéria grátis.
Fechar

Não vá embora sem ler essa matéria!
Assista um anúncio e leia grátis
CLIQUE AQUI.