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Presidente do México sobrevive a tudo, inclusive aos próprios erros

A popularidade de López Obrador continua acima dos 60% e ele já começa a conduzir a sucessora que irá substituí-lo

Por Vilma Gryzinski 30 ago 2022, 08h04

Inveja. Qualquer governante latino-americano, à direita, à esquerda ou no conforto dos regimes ditatoriais, só pode ter esse sentimento em relação a Andrés Manuel López Obrador.

O presidente mexicano não diminuiu a criminalidade – unanimemente considerada o maior problema do país -, não turbinou a economia, não teve uma pandemia razoável e, muito menos, promoveu a Quarta Transformação, a designação grandiloquente para o regime de mudanças que prometeu a partir de sua chegada ao poder, em 2018.

Uma demonstração do seu prestígio popular foi dada com uma pesquisa divulgada ontem: qualquer nome escolhido pelo partido do presidente, o Movimento Regeneração Nacional, ou Morena, vai ganhar a eleição presidencial de 2024 (não existe reeleição no México). 

A mais cotada é a prefeita da Cidade do México, Claudia Sheinbaum. Ela defende “a continuidade e todo nosso apoio ao presidente da República”. Claudia estudou física e engenharia, seguindo a tradição da família de judeus procedentes da Europa dedicados à ciência. 

López Obrador fala manso e tem uma personalidade afável, ao contrário do modelo tradicional do populista de esquerda latino-americano. Mas também compra briga: chamou de “racista e classista” uma atriz que criticou a miríade de benefícios sociais para os menos favorecidos – por motivos óbvios, a coluna mestra da popularidade de AMLO, como é chamado.

O México tem um PIB menor do que o do Brasil – na faixa de 1 trilhão de dólares -, mas uma renda per capita maior, de 9,4 mil dólares, quase dois mil a mais do que nós. Um vizinho rico e poderoso como os Estados Unidos, com quem tem o NAFTA, ajuda a puxar o país para cima, ao contrário da visão deturpada da esquerda sobre o assunto.

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Até o consumo de drogas no território americano ajuda a irrigar a economia do vizinho, embora sustente um sistema bárbaro em que narcotraficantes guerreiam entre si, com uma brutalidade sem paralelos, e espalhe o poder corruptor sobre as estruturas do estado das imensas quantidades de dinheiro que o tráfico mobiliza.

Mais de 35% dos mexicanos apontam como o maior problema do país reduzir a insegurança. Melhorar a economia fica em segundo lugar, com 28%. Curiosamente, 51% dos mexicanos acham que AMLO não está se saindo bem no quesito segurança. Ao mesmo tempo, 63% aprovam seu governo. A melhor avaliação do presidente, com 69% de aprovação está relacionada ao programa de vacinação contra a Covid.

López Obrador resistiu bastante a medidas como a paralisação das atividades não essenciais e o uso de máscara. Mesmo quando implantadas, não foram acompanhadas de medidas coercitivas. O país teve 330 mil mortes por Covid para uma população de 126 milhões de habitantes.

O presidente mexicano basicamente não mexeu em nada na economia, o que pode ser visto como uma vantagem: populistas de esquerda quando entram no campo da reforma econômica geralmente produzem desastres.

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Achou conveniente somar seu nome aos dos colegas da Bolívia e da Colômbia para declarar “nosso mais absoluto repúdio à injustificável perseguição judicial” contra Cristina Kirchner.

Poucos casos de corrupção são tão completamente fechados como o que agora pede 12 anos de prisão para a vice-presidente argentina.

A popularidade de Cristina, embora limitada às fileiras do peronismo, também é um fenômeno: 41% dos eleitores da sua frente votariam nela para ser candidata a presidente no ano que vem. O desastrado Alberto Fernández tem 10,53% das preferências.

O exercício do poder obviamente desgasta, em especial um político poste como Fernández. Mas, no Chile, Gabriel Boric aparece já com o filme queimado com menos de seis meses de presidência. Se a nova constituição chilena não for aprovada, vai sobrar desprestígio para o jovem presidente. Incidentes como o do fim de semana, quando um grupo de travestis fez uma “performance”, num comício pela aprovação, em que a bandeira chilena foi, por assim dizer, tirada das nádegas expostas de uma das dançarinas não ajudam em nada.

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No Peru, Pedro Castillo não faz praticamente nada como presidente. Sua aprovação está em 20%. No vizinho Equador, o presidente, Guillermo Lasso, é de direita, mas a situação é praticamente igual à do professor primário peruano.

O uruguaio Luis Lacalle Pou, da direita civilizadíssima, ainda não entrou no vermelho, mas caiu do ápice de 66% para 50% de aprovação.

López Obrador já afirmou no México quando era um eterno candidato, que a gasolina custaria 10 pesos (“Custa mais de 22 pesos o litro”, criticou o político direitista Ricardo Anaya), que “para o bem de todos, os pobres primeiros” (a situação de pobreza aumentou para mais quatro milhões de pessoas), a economia encolheu e a dívida pública aumentou. Quinze jornalistas já foram assassinados no país este ano.

O presidente mandou pessoalmente o Exército soltar Ovídio Guzmán, filho do notório El Chapo, porque seus comparsas estavam tocando o terror na cidade de Culiacán.

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“Se não suspendêssemos a operação, mais de 200 pessoas perderiam a vida”, alegou. Capangas de Guzmán estavam cercando casas de militares e ameaçando tocar fogo.

Pode um presidente mandar soltar um criminoso? Muitos mexicanos acham que sim – ou talvez seu presidente tenha uma margem de tolerância fora do padrão, o que definitivamente deixa muita gente com uma inveja danada.

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