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Ter vacina virou diferencial

Líderes com-vacina crescem, os sem-vacina perdem popularidade

Por Vilma Gryzinski Atualizado em 4 jun 2024, 13h53 - Publicado em 5 fev 2021, 06h00
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  • Deu a louca no mundo — e isso não é novidade nenhuma na era do coronavírus. Ridicularizado como um líder indeciso e hesitante, que falava uma coisa e fazia outra menos de 24 horas depois, Boris Johnson está com o prestígio em alta. A pioneira campanha de vacinação no Reino Unido virou um motivo de orgulho nacional. Enquanto isso, a venerada Angela Merkel amarga um desencanto sem precedentes: a lerdeza e a paquidérmica burocracia da União Europeia, a quem a primeira-ministra confiou as negociações conjuntas sobre a compra das vacinas para os 27 países-membros, provocam revolta e indignação. A situação não é muito diferente para Emmanuel Macron, que tomou a atitude nada esclarecida de desdenhar dos ingleses e de uma das suas vacinas, a Oxford/AstraZeneca, numa atitude extraordinariamente parecida com a de uma certa raposa que não alcançava um apetitoso cacho de uvas. Para complicar, o sem-vacina Macron tem no encalço uma adversária capaz de fazer um vinagre duro de engolir com qualquer uva verde, Marine Le Pen. Uma pesquisa chocante deu à sua adversária garantida na próxima eleição presidencial 48% das preferências. Apenas 34% dos franceses apoiam o modo como Macron conduz a crise do corona.

    “As disputas hegemônicas da era do coronavírus são travadas inteiramente com soft power”

    A eleição na França é só no ano que vem e até lá todos os franceses deverão estar vacinados, espera-se. O que conta é a janela de oportunidade do momento atual e como ela está sendo aproveitada: os com-vacina avançam para um planejamento realista da normalização de atividades, inclusive os tratamentos médicos suspensos pela pandemia; os outros esperneiam A vacinação rápida e eficiente não traz automaticamente o sonhado “passaporte verde”, que permitiria liberdade de viajar e trabalhar. Mas é muito melhor ter pelo menos os grupos de risco vacinados.

    O mundo da era do vírus não se comportou melhor ou pior do que o anterior. Em lugar da nobre e solidária ação conjunta, cada país saiu correndo para proteger os seus — pelo menos, entre os que entendem a relação entre dominar a pandemia e ganhar eleição. A tentativa de ação coletiva feita pela União Europeia redundou no atual fiasco. Melhor nem falar nas iniciativas da ONU. O impulso de autopreservação, salpicado pelo conhecido perfume de nacionalismo, funcionou. Sem dinheiro e competição ao velho estilo, ambos em grandes quantidades, não teria sido possível chegar ao extraordinário número de vacinas de eficácia já comprovada. China e Rússia também captaram rapidamente o potencial da “diplomacia da vacina” — e a dependência dos sem-­imunizantes ficou demonstrada em todos os seus humilhantes detalhes no caso do Brasil. A corrida das vacinas tem sido comparada ao Grande Jogo, a disputa por domínio e recursos na Ásia Central, na virada do século XIX, entre a Grã-Bretanha e a Rússia, na época do imperialismo puro e duro. As disputas hegemônicas da era do coronavírus são travadas inteiramente com soft power. Quem é bom em pesquisa e desenvolvimento tem poder. Quem não chegou lá tem de ser esperto. “A sorte favorece as mentes preparadas”, ensinou Louis Pasteur, o genial precursor da microbiologia e pai da vacina antirrábica.

    Publicado em VEJA de 10 de fevereiro de 2021, edição nº 2724

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