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Triste eleição na Nicarágua e a terrível desimportância da América Latina

Os bem intencionados até tentam, mas pouquíssimos se mobilizam diante dos panoramas sinistros pintados por Daniel Ortega e companhia

Por Vilma Gryzinski 8 nov 2021, 07h56
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  • “Daniel”, como diziam os cartazes da campanha eleitoral, foi reeleito – nem é preciso esperar o fim da contagem dos votos. Para ter certeza do resultado, mandou prender sete candidatos que poderiam disputar urnas com ele. Todo mundo já sabia que isso ia acontecer – e o fato é que, fora as declarações protocolares da OEA e similares, poucos ligam a mínima.

    A Nicarágua de Daniel Ortega é um dos países mais desimportantes da pouco importante América Latina. A terra, os recursos naturais, o riquíssimo potencial humano de povos que vão da Argentina ao México, tudo isso conta cada vez menos.

    É difícil explicar para gerações mais novas que um dia a Nicarágua foi um assunto relevante, um pequeno país que despertava repúdio internacional face à ditadura de Anastasio Somoza, esperança com a aliança de intelectuais de classe média e jovens idealistas (liderados por um inspirado comandante de boina à la Che chamado Daniel Ortega) e até abalos no governo de Ronald Reagan, flagrado armado por baixo do pano a resistência à onda esquerdista.

    Não sobrou nada disso, inclusive, ou principalmente, os princípios esquerdistas. Daniel Ortega e a ex-revolucionária sandinista Rosario Murillo, elevada pelo marido e cúmplice a co-presidente, instauraram uma espécie de seita, com linguagem new age, discurso pacifista, rituais bizarros – e a velha e boa corrupção, com filhos da dupla implantados em atividades lucrativas, inclusive canais de televisão que só divulgam boas notícias e, nada surpreendentemente, recebem propaganda paga do governo.

    Se a Venezuela que é a Venezuela, com a força que o petróleo lhe dava, saiu do noticiário e hoje existe uma resignação generalizada com Nicolás Maduro, tão hábil em se perpetuar no poder quanto em dinamitar os mais fundamentais pilares da economia, a ponto de produzir um índice de pobreza de quase 95%, que dirá a Nicarágua, com menos de sete milhões de habitantes e PIB de 12 bilhões de dólares.

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    A palhaçada eleitoral na Nicarágua – obviamente, um assunto muito sério para os perseguidos políticos – será rapidamente absorvida. Ortega virou um personagem esquisito, mas conhece muito bem o manual de sobrevivência do caudilho latino-americano. Com a certeza da permanência no poder, pode até aliviar ligeiramente os movimentos repressivos. Exportação de gente e tráfico de drogas, os problemas que geralmente causam mais incômodo aos Estados Unidos, nem estão entre os piores da América Central.

    As commodities estão em alta num mundo que precisa de tudo para a recuperação pós-pandemia e devem segurar um crescimento do PIB de 6,3% para a América Latina, segundo o FMI – acima dos murchos 5,2% prognosticados para o Brasil.

    Alguém se lembra de quando o FMI era assunto, atacado pela esquerda como representante dos capitalistas maus? Pois na Argentina continua a ser, um atestado do angustiante atraso em que patina um país que, como nós, tinha tudo para ser um caso de sucesso.

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    “Brigar” com o FMI, sem chegar à ruptura final, é um dos batidos recursos que o governo de Alberto Fernández tenta usar enquanto cava cada vez mais o buraco previsto para as eleições legislativas e regionais do próximo domingo.

    Segundo pesquisas recentes, o Juntos pela Mudança, tão desmoralizado pela massacrante derrota de Mauricio Macri na tentativa de reeleição, tem 40% das preferências, contra 28% para a Frente de Todos, a coalizão peronista, com alguns pequenos adendos, que elegeu Fernández.

    Se a eleição fosse para presidente, 57% prefeririam um candidato da oposição; 31% continuariam fieis ao peronismo.

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    Isso mostra como os argentinos – e não só eles – tentam de tudo. Elegem governos que acabam fracassando, vão para o lado oposto e também se dão mal, voltam para a opção anterior e assim sucessivamente.

    Os problemas estruturais continuam os mesmos: administrações disfuncionais, máquinas públicas paralisantes, investimentos internos deficientes, investimentos externos que entram e saem assim que o sinal amarelo acende, iniciativa privada tolhida, informalidade e insegurança no mercado de trabalho e, tragicamente, índices de pobreza que, insuflados por tudo isso e mais a pandemia, aumentam em vez de diminuir.

    Os argentinos repudiaram Macri quando a moeda entrou em parafuso e a economia desandou. Hoje, lidam com a maior desvalorização da história – o dólar estava a apenas um suspiro dos 200 pesos.

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    Parece uma maldição que a pequena Nicarágua ou a grande Argentina estejam às voltas com problemas que deveriam ter sido superados há muito tempo, como caudilhismo, inoperância econômica, disfunção terminal e corrupção camuflada ou descarada.

    É possível enumerar um compêndio de causas perfeitamente racionais para nossos muitos e repetitivos males – e nenhum tem nada a ver com o estilo esotérico da nicaraguense Rosario Murillo.

    Pero que las hay, las hay…

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