Tudo é gravíssimo nesse confronto, mas o pior é a tomada de reféns
O ataque em várias frentes do Hamas ainda está se desdobrando e israelenses correm grandes riscos, inclusive de que mais sejam capturados
“Estamos sendo chacinados. Não tem sinal do exército. Já se passaram seis horas”. A chamada desesperada de um israelense na região perto da fronteira com Gaza resumiu em poucas palavras alguns dos graves desdobramentos dos ataques desfechados por terra, mar e ar pelo Hamas.
Os ataques pegaram as forças de segurança totalmente de surpresa, uma grave falha de inteligência. Foram tantos e tão disseminados que a ajuda demorou a chegar. Na região perto de Gaza, existe um colar de pequenas localidades onde o conflito é uma realidade muito mais presente do que em regiões mais distantes de Israel. Praticamente todas as casas têm um “quarto de pânico”, um cômodo com paredes reforçadas e o mínimo para sobreviver durante os piores momentos.
Pois muitas pessoas tiveram que sair desse último refúgio quando atacantes do Hamas incendiaram suas casas. Cerca de cinquenta pessoas – um número ainda não estabelecido definitivamente – foram sequestradas assim ou em circunstâncias similares. Também há soldados que tiveram que se render diante dos atacantes em número superior.
Para ter uma ideia de como a tomada de reféns judeus é gravíssima, lembremos do caso do soldado Gilad Shalit. Ele foi sequestrado em 2006 por militantes do Hamas que surgiram de um túnel subterrâneo e mantido em cativeiro durante anos. Só foi solto em 2011, contra a libertação de 1 027 prisioneiros palestinos, inclusive autores de graves crimes de sangue. Foi uma decisão altamente controvertida de Benjamin Netanyahu. Familiares de vítimas de terroristas soltos ficaram revoltados. A argumentação do primeiro-ministro foi que a vida de um soldado judeu valia qualquer sacrifício.
E agora, com senhoras de idade e jovens convocadas para servir no Exército sendo levadas para Gaza, como mostram múltiplas imagens nas redes sociais?
É uma crise como Israel nunca enfrentou – e isso num país acostumado a todos os tipos de desafios.
As forças de defesa de Israel têm protocolos especiais para evitar a tomada de reféns, antecipando-se ao preço altíssimo que isso tem. Durante muitos anos, vigorou – e alguns acham que continua vigorando uma versão alternativa – o Protocolo Haníbel que previa até o mais extremo dos recursos, como ataques que colocassem em risco a vida do sequestrado.
Agora, não é impossível imaginar que reféns israelenses, especialmente militares, sejam colocados sob a mira dos bombardeios que estão envolvidos na Operação Espadas de Ferro, as represálias contra o Hamas na Faixa de Gaza.
Inevitavelmente, os bombardeios provocam vítimas civis pois a prática do Hamas é colocar todas as suas instalações junto ou até debaixo de escolas e hospitais.
Apesar da surpreendente extensão do ataque do Hamas, com retroescavadeiras derrubando trechos de uma cerca que deveria ser blindada e militantes armados usando até paragliders, e do despreparo mais espantoso ainda da defesa israelense, o estado judeu deve recuperar rapidamente a superioridade operacional.
Aí começarão os problemas: como recuperar os reféns. Alguns ainda estão em território israelense, como os do kibutz Beeri, dominado pelos atacantes do Hamas.
E como responsabilizar os culpados pelo fracasso em antecipar os ataques, um campo em que Israel praticamente não tem – ou não tinha rivais?
“Não estou preocupado agora em saber de quem é a culpa”, disse o líder oposicionista Yair Lapid ao propor um governo de união nacional. Claro que ele está pensando exatamente nisso.
Ele e o resto do país. Incluindo os pacíficos participantes de uma rave que acharam uma boa ideia fazer uma festa ao ar livre num kibutz perto da fronteira. Quando começou o tiroteio, saíram correndo pelo deserto e alguns passaram o sábado inteiro escondidos.