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Cadê as lideranças de fato?

A crise joga no limbo os incapazes e exalta os competentes

Por Murillo de Aragão Atualizado em 4 jun 2024, 14h25 - Publicado em 20 mar 2020, 06h00
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  • O Brasil começava o ano satisfeito, com prognósticos de crescimento. Então, a pandemia de coronavírus, tal qual um cisne negro que surge do nada, destruiu as expectativas. Em meio a nossos prosaicos e provincianos problemas, a maioria deles do século passado, o mundo jogou sobre nós um desafio de imensas proporções. Lamentavelmente, até bem pouco tempo atrás, essa questão não era tratada com a necessária seriedade. Quando o surto da doença emergiu, em janeiro, aqui mesmo nestas páginas, antecipei o gigantesco desafio que seria enfrentá-lo. Afirmei que as boas perspectivas econômicas para 2020 tinham de ser revistas. Mas não houve, infelizmente, o devido engajamento da sociedade e do governo para evitar que a chegada da Covid-19 fosse amenizada.

    De certa forma, nenhuma medida significativa foi tomada até bem depois do Carnaval. O Brasil oficial estava mais preocupado com disputas orçamentárias do que com a ameaça de uma pandemia. Apenas quando a longa mão da peste atingiu os escalões oficiais o tema, enfim, mudou de patamar. Enquanto o Brasil ruminava mover o gasto público para destravar o crescimento, a economia americana, a mais liberal do mundo e profundamente endividada, abria os cofres para evitar uma recessão. Lembrando que nos Estados Unidos existe apenas cerca de 4% de desempregados.

    “A lição que o governo americano sempre dá é abrir os cofres públicos para a economia não parar”

    A lição que o governo americano sempre dá nos momentos de crise é abrir os cofres públicos para não deixar a economia parar. Para o Brasil a crise do coronavírus é, potencialmente, mais intensa do que o 11 de Setembro de 2001 e a crise de Wall Street de 2008.

    As respostas que o setor público tem de dar ao desafio do coronavírus devem ultrapassar, em muito, os 147 bilhões de reais anunciados no início da semana passada. A declaração de calamidade pública é apenas mais um passo. A liberação de recursos para os aposentados e os mais vulneráveis é paliativa. Precisamos irrigar a economia com crédito e dar tempo ao contribuinte para pagar taxas e impostos, bem como realizar a compra de equipamentos médicos e remédios, numa escala nunca vista no país. Mas, sobretudo, é necessário ter liderança. O presidente da República tem de conduzir o combate à epidemia junto com os governadores, e estes com os prefeitos. O interesse da coletividade deve prevalecer sobre as picuinhas políticas. O diálogo entre as esferas dos poderes precisa ser imediato e efetivo. O Judiciário e o Legislativo devem dar respaldo às medidas a ser implementadas de forma ágil pelo Executivo. Recentemente, em uma boa iniciativa, resolveram criar uma espécie de fast track para remover entraves burocráticos à compra de equipamentos e remédios. O STF precisa dar garantia às decisões emergenciais que serão adotadas.

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    Para Bolsonaro, seu destino como presidente pode estar sendo decidido pela forma como combate esta pandemia, sob pena de perder popularidade e capacidade de comandar em um momento grave da nação. Como dizem os pilotos de Fórmula 1, as curvas e o uso dos freios separam os homens dos meninos. Na política, a crise joga no limbo os incapazes e exalta os competentes. É hora de as lideranças de direito demonstrarem que são lideranças de fato.

    Publicado em VEJA de 25 de março de 2020, edição nº 2679

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