
Ser pessimista no Brasil é cômodo e fácil. Afinal, os sinais que vêm das instituições públicas e privadas nos dão motivos de sobra e facilitam a vida do analista. Os sinais do exterior também são tenebrosos. Uma nova ordem mundial se organiza, e o Brasil está meio que deslocado do jogo.
O julgamento de Jair Bolsonaro e dos envolvidos na trama golpista nos dão exemplos abundantes. De um lado, o processo motivou severas sanções econômicas e pessoais ao país. De outro, motivou lacrações e agressões de parte a parte — em um triste espetáculo de degradação cívica.
O Brasil está sequestrado por situações que se caracterizam pela intolerância, tendenciosismo, radicalismo, ignorância e má-educação generalizada. Tendo ainda como pano de fundo o resiliente corporativismo, a resiliente corrupção e o horizonte próximo das eleições. A atual conjuntura exacerbada contamina o debate público e corrói as bases da convivência democrática.
A intolerância se manifesta na incapacidade de aceitar a existência de divergências legítimas de lado a lado. Em vez de reconhecer o valor do contraditório como parte essencial do jogo democrático, prefere-se silenciar o outro, seja pela hostilidade, seja pela desqualificação sumária. Não se trata de discordar — o que é natural e saudável —, mas de negar ao outro o direito de existir enquanto voz autônoma.
O tendenciosismo, por sua vez, revela-se no vício de admitir que o “time” de preferência pode contornar ou atropelar regras para alcançar vitórias. É a velha lógica de que “os fins justificam os meios”, aplicada de forma corrosiva à política, à justiça e até às relações pessoais. Tal distorção produz uma ética seletiva: aquilo que se condena no adversário justifica-se quando praticado pelo aliado.
“O Brasil está sequestrado pela intolerância, tendenciosismo, radicalismo, ignorância e má-educação”
Nos últimos tempos, os polos do radicalismo tendem a relevar suas extravagâncias. Assim ocorreu com as práticas de corrupção que motivaram a Lava-Jato, que foram desvalorizadas. Do outro lado, ocorreu o mesmo com o golpismo “à la Chaves” — ao modo do “sem querer querendo” do personagem. Ambos os times toleram e estimulam excessos de comportamento e de julgamento.
Não há contenção nem equilíbrio, mas partidarismo excessivo em meio ao faroeste político que vivemos. A vítima, mais uma vez, continua sendo a democracia, que precisa ser reconstruída no Brasil. A ignorância completa o círculo vicioso. Muitos nem sequer compreendem as regras elementares da democracia. Confundem liberdade de expressão com licença para ofender, confundem instituições com obstáculos a serem removidos, confundem pluralismo com ameaça.
A má-educação dá o tom da retórica nacional. O respeito pelo próximo é abandonado em favor de ataques pessoais. Como se elevar o tom de voz fosse prova de superioridade argumentativa, cultivamos uma cultura de confronto permanente, em que prevalece quem fala mais alto — não quem traz melhores razões.
Assim, intolerância, tendenciosismo, radicalismo, ignorância e má-educação não são apenas características isoladas, mas partes de uma engrenagem que nos aprisiona em um ciclo de mediocridade e ressentimento. Não temos no horizonte próximo motivos para ter otimismo.
Publicado em VEJA de 19 de setembro de 2025, edição nº 2962