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O Leitor

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Menino do Acre prestou um desserviço ao conhecimento

Bruno Borges foi ousado, mas o livro é mal escrito e a jogada aprofundou os preconceitos sobre a leitura

Por Maicon Tenfen 16 ago 2017, 02h02

A entrevista de Bruno Borges ao Fantástico valeu por uma confissão de que o seu sumiço não passou de uma jogada de marketing — ou golpe publicitário, como se dizia antigamente.

— Meu maior objetivo com esse projeto — declarou o rapaz — foi estimular as pessoas a adquirirem conhecimento.

Ele se arrepende de ter causado dor à família, mas dá a entender que, no fim das contas, tudo se fez necessário para o cumprimento de uma missão confusamente relacionada a misticismos e esoterismos.

TAC – Teoria da Absorção do Conhecimento, primeiro dos 14 livros que deixou escritos em código, foi publicado e chegou à lista dos mais vendidos, apesar de ser uma xaropada repleta de redundâncias e falhas gramaticais, isso pra não falar na megalomania das questões propostas — qual o sentido da vida? — e nos cansativos clichês de autoajuda.

Atenção: esta não é a opinião de um crítico solitário e pé-no-saco.

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Basta acessar as redes sociais para conferir que quase ninguém engoliu o livro. O menino do Acre não poderá dizer, como Paulo Coelho, que é odiado pela crítica e amado pelo público. Talvez pense que seja algum tipo de gênio tropical. A verdade é que não passa de um moleque mimado que foi longe demais em seu devaneio.

Mesmo assim não há motivo para criticar ou lamentar o desaparecimento de Bruno. Não deixa de ser divertida a maneira como mobilizou a mídia e reuniu os telespectadores em torno de um mistério que teve final feliz. A polícia também não vê crimes no caso, sinal de que a história se resume a uma trampolinagem inconsequente.

Então está tudo bem, né?

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Nem tanto.

O golpe publicitário toca um problema que certamente não passou pela cabeça de Bruno quando resolveu fazer o que fez. Ele não devia ter armado o seu teatrinho ao redor de livros e, principalmente, não devia ter declarado, ao voltar, que sua causa surgiu para difundir o conhecimento (assim, no genérico, para além dos seus interesses).

Ainda hoje, para a imensa maioria dos brasileiros, livros são artefatos de gente doida, confusa, infeliz e esquizofrênica, ou seja, a própria fisionomia que o moleque mostrou na televisão. Em vez de difundir o conhecimento, como disse, o que Bruno fez foi reforçar estereótipos que continuam arraigados no imaginário nacional.

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Por incrível que pareça, muita gente ainda encara os livros com medo e desconfiança. “Leu tanto que ficou louco” ou “ler é coisa de rico imoral” são ideias comuns nas periferias do país. Alguém que põe uma estátua no quarto e enche as paredes de inscrições não está melhorando a situação. Pelo contrário, está apenas aprofundando a bibliofobia em que vivemos desde o período colonial.

“Isso é coisa do capeta!”, podemos ler nas redes sociais.

O “isso” se refere ao tom esotérico do caso e à baboseria mística, mas também, tristemente, aos livros, à leitura e ao tal do conhecimento. “Além de dar trabalho e me fazer pensar — uma atividade que dói —, os livros ainda podem me transformar num maluco como aquele de Rio Branco. Tô fora!”

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Felizmente existe um movimento espontâneo de valorização da leitura que nasceu com a internet e está gerando frutos através de blogs, vlogs, fóruns e painéis dedicados à discussão de livros. Tudo é feito por pessoas jovens — meninas em sua maioria — capazes de mostrar que a leitura é sim um passatempo saudável e divertido, uma prática esclarecedora que nos ensina a abrir os olhos para o mundo, e não o seu oposto sombrio, sisudo, alienante — coisa de gente que requer acompanhamento psiquiátrico.

O menino do Acre perdeu uma excelente oportunidade de colaborar com esse movimento. Tudo o que tinha a fazer era não misturar os livros com o seu narcisismo.

 

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