No dia 30 de março de 1981, um cidadão chamado John Hinckley Jr. tentou assassinar a tiros o então presidente dos Estados Unidos, Ronald Reagan. Considerado inocente por incapacidade mental, o réu foi sentenciado a viver em um hospital psiquiátrico em Washington por três décadas. Com as restrições sobre sua vida sendo retiradas lentamente, Hinckley foi liberado da vigilância da corte norte-americana e do sistema de saúde mental do país no início de junho deste ano. Decidido a seguir em frente, ele tenta agora — acreditem — carreira na música. Mas a nova empreitada está se provando errática.
O americano, que se diz apaixonado por música, começou a tocar violão quando ainda era adolescente. Hinckley já tinha um show marcado com ingressos esgotados, onde esperava cantar dezessete canções próprias, mas soube que a apresentação no Brooklyn havia sido cancelada no mesmo dia em que sua suspensão judicial foi expedida. Como justificativa, o Market Hotel, local do evento, citou preocupações de segurança após receber ameaças online. “Não valia a pena colocar em jogo a segurança de nossas vulneráveis comunidades (…) em um clima perigosamente radicalizado”, disse o estabelecimento em publicação nas redes sociais. Ele tinha uma série de outros shows marcados em Chicago, Hamden, Connecticut e Williamsburg, mas todos foram cancelados recentemente por motivos parecidos.
Em comunicado, a Fundação Reagan se mostrou contra a suspensão das restrições de Hinckley e sua tentativa de começar uma carreira musical. “Ele aparentemente busca lucrar com sua infâmia.” A filha do ex-presidente, Patti Davis, protestou contra a liberdade do atirador em artigo publicado no jornal americano The Washington Post, em 2021. “Não acredito que John Hinckley sinta remorso. Narcisistas raramente sentem”, escreveu.
No YouTube, Hinckley tem 30 000 seguidores e coleciona 15 000 ouvintes mensais no Spotify. Apesar dos mais velhos lembrarem dele como o homem que tentou matar Reagan — e acabou acertando o secretário de imprensa James Brady, morto em 2014 graças a uma lesão cerebral, um policial de Washington e um agente do Serviço Secreto — o músico está atraindo fãs da geração Z, que o encorajam a continuar cantando e se identificam com sua luta contra doenças mentais. “Depois de ser repudiado e julgado daquela maneira, ele poderia ter escolhido a raiva e o ressentimento, mas em vez disso escolheu fazer canções de paz”, disse Bunny Gaubert, 25 anos, jovem que estava ajudando Hinckley a organizar a apresentação em Chicago, posteriormente cancelada.
Após o cancelamento de três shows nas últimas semanas, o músico decidiu, por conta própria, alugar o teatro da Biblioteca Regional de Williamsburg para fazer uma apresentação em novembro. Mas nem suas tentativas de se produzir sozinho estão dando certo. Este mês, apenas três horas depois de anunciar a data do show, o local cancelou a apresentação após receber (como nos casos anteriores) mensagens hostis por e-mail. “O show ia representar claramente uma grande perturbação ao funcionamento da biblioteca”, disse Desiree Parker, porta-voz da biblioteca.
John Hinckley Jr. vivia na casa da mãe até ela morrer, no meio do ano passado. Atualmente vive em um apartamento em Williamsburg, no Brooklyn. Apesar de algumas pessoas considerarem a presença do americano nos lugares controversa, especialistas em saúde mental e a promotora do caso, Kacie Weston, que não se opôs à suspensão da vigilância, afirmam que Hinckley não é um perigo para si ou para os outros. As tentativas de engrenar uma carreira musical estão falhando, mas ele parece disposto a continuar. Ainda este ano, Hinckley lançará um álbum de vinil com suas canções pela Asbestos Records.