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O Som e a Fúria

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Fiasco do álbum de Dua Lipa atesta: a alegria está em baixa na música pop

Autoindulgente, disco 'Radical Optimism' tem recepção morna e perde vantagem na comparação com Taylor Swift e mais compositoras melancólicas

Por Thiago Gelli Atualizado em 9 Maio 2024, 15h05 - Publicado em 6 Maio 2024, 10h17

Alta, esbelta e sorridente, Dua Lipa é um dos nomes mais conhecidos da música pop desde 2017, quando estourou de vez ao listar suas “novas regras” para superar um término conturbado. Desde então, seu disco de estreia se tornou o álbum feminino mais ouvido da história do Spotify e foi seguido pelo sucesso Future Nostalgia, que agitou salas de estar em pleno 2020 com sua discoteca setentista. Quatro anos depois, contudo, a tentativa de repetir o efeito alegre acabou em testa franzida. Radical Optimism (Otimismo Radical, em tradução livre) chegou às plataformas digitais na sexta-feira, 3 de maio, mas a recepção morna em nada se assemelha com o sucesso estrondoso de outrora. Em meio ao domínio da “sofrência” de Taylor Swift, Billie Eilish e Olivia Rodrigo, então surge a pergunta: ainda há lugar para o pop feliz? 

Produzido em parceria com Kevin Parker, vocalista do grupo Tame Impala, e o britânico Danny L Harle, o disco prometia capturar influências da psicodelia e do britpop para ecoar a boa maré na vida da cantora, famosa por viajar pelo mundo em seu tempo livre, recomendar livros em seu clube digital e falar com colegas famosos em seu podcast, At Your Service

Diferente de muitas colegas, ela mantém fofocas sobre a vida pessoal à distância e pouco se martiriza, fórmula que havia alimentado o desejo por escapismo de seus milhões de ouvintes. Os tempos, porém, pedem por pretensa autenticidade: o mais recente lançamento de Swift, dramaticamente intitulado The Tortured Poets Department, por exemplo, foi mais comentado pelos possíveis laços com os últimos términos da cantora do que por qualidades melódicas. Eilish, por sua vez, ganhou dois Grammys e um Oscar pela melancólica What Was I Made For, em que transpõe as mazelas da própria fama para o arco da boneca protagonista de Barbie (2023). Já Ariana Grande incluiu as palavras “terapia”, “codependência” e “autocuidado” em seu último disco, o agridoce Eternal Sunshine. O pop em 2024, fica claro, prefere o divã ao estúdio de dança. 

A tendência não significa, porém, que o disco da britânica não tenha mérito. Apesar de mais errático que seus trabalhos anteriores, Radical Optimism mantém o charme característico de sua voz e mostra o comprometimento de Dua Lipa à música dançante, independente do que dita o zeitgeist. Os singles Training Season e Houdini, em particular, são energéticos o suficiente para distingui-la do simples pop genérico, mas a seriedade com a qual a cantora encara sua própria alegria parece afastar os ouvintes. Na contramão, a popstar em ascendência Sabrina Carpenter domina o streaming no momento com Espresso, single tão veranil quanto o trabalho da colega, mas carregado do senso de humor de que as músicas de Dua carecem, com direito a frases propositalmente bobas e flexões vocais que grudam na mente. 

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De resto, a parada Top 50 mundial do Spotify conta com algumas outras defensoras da alegria no pop americano. Chappell Roan, por exemplo, estreou no ranking com Good Luck, Babe, música com toque de sadismo e muita excentricidade em que, ao invés de se lamentar, celebra o escárnio por uma amada que a trocou por um homem, enquanto Beyoncé permanece por lá com a contagiante Texas Hold’Em. A lamúria como commodity, porém, permanece à frente com larga vantagem: no momento, Swift emplaca 16 canções confessionais no ranking, e o pop perde espaço para gêneros menos idealistas.

Mais terapeutizada do que nunca e cheia de consciência social, a atmosfera cultural ocidental, logo, parece ter jogado o escapismo para o fundo do mar, focada em consumir por completo tanto as dores dos que cantam quanto as músicas entoadas. Para não se afogar, resta chorar algumas pitangas. 

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