Como as salas de aula serão transformadas pela Inteligência Artificial
Aprendizado em grupo, experimentação e projetos interdisciplinares estão entre as tendências apontadas por Paulo Silveira, confundador do Grupo Alun

A essa altura do campeonato você provavelmente já sabe que a inteligência artificial é uma tecnologia de propósito geral, assim como a prensa de Gutenberg, a eletricidade e a internet. E, do mesmo modo que suas antecessoras, tem potencial de reformular profundamente o mundo em que vivemos — o que, é claro, inclui a educação.
Para além dos embates sobre estudantes que terceirizam a lição de casa para a IA, o que se pode esperar do encontro entre essas ferramentas e a sala de aula por onde (quase) todos passamos? Em busca de respostas, conversei com Paulo Silveira, com quem encontrei no IT Forum Praia da Forte, evento realizado pelo IT Forum, frente de negócios do Itaqui.
Silveira é chief vision officer do Grupo Alun, formado pela Alura, uma das maiores escolas online de educação tech do Brasil, além da Faculdade de Informática e Administração Paulista (FIAP) e da plataforma de educação PM3. Aqui ele fala sobre a inserção da IA na rotina dos brasileiros.
VEJA: Como imagina a sala de aula em 2030?
Paulo Silveira: A grande mudança vai ser a consolidação de mesas de trabalho em grupo, no lugar da configuração clássica das carteiras uma ao lado da outra, todas voltadas para o professor. O trabalho do futuro – na verdade, do presente – é necessariamente um time de pessoas que às vezes não se entendem e pouco se conhecem. Que são diferentes. Saber trocar com o outro vai aumentar as oportunidades profissionais.
Há quem considere que a IA vai transformar a escola em uma experiência parecida com a de uma plataforma de streaming. O que acha dessa analogia?
Sou mais cético. Porque a gente também falou de mudanças radicais quando chegaram o computador pessoal e outras inovações. Grandes instituições como a escola e a universidade são, sim, afetadas, mas nunca tanto quanto se promete.
Como a IA pode mudar a escola, então?
A IA vai mostrar mais a necessidade de se trazer a experimentação, o laboratório e os projetos interdisciplinares. Porque o conteúdo direto a gente já tem na internet há tempo, já estava em xeque. Mas você vai precisar do aprendizado clássico, de matemática e de português, por exemplo, para ser capaz de conduzir essas ferramentas.
Ou seja, para avaliar o que elas entregam, é isso?
Você não pode ser uma pessoa ignorante de literatura, de escrita, de técnicas. A IA não vai resolver isso. As pessoas estão indo muito rapidamente para o “faz tudo aí para mim”, como se fosse mágica, mas você não pode só mandar gerar relatório. Precisa do “human in the loop”, da capacidade de análise humana.
O problema é convencer os alunos disso.
A IA vai mudar a forma como a gente ensina, mas a forma como se aprende e absorve continua: é sentado aqui com caneta, fazendo exercício e dedicando horas. Então realmente tem um tempo aí para todo mundo assimilar e entender o que essas ferramentas podem ou não oferecer.

Existe risco de a IA criar uma elite que aprende com máquinas, enquanto a maioria continua em escolas que não têm nem wi-fi?
Ou talvez o contrário, de a elite estudar num mecanismo mais presencial, com contato e troca humanizados, e massificar a IA para cuspir textos.
Talvez, mas eu me refiro às desigualdades entre as regiões brasileiras em termos de infraestrutura.
Ah, sim, concordo. A internet banda larga levou de 1995 a 2010 para se disseminar. O smart phone precisou de cerca de dez anos para estar no bolso de todos. A IA se espalha mais depressa. Então, ficar para trás é muito pior, porque é uma revolução mais profunda e acelerada.
Como avaliar o aluno nesse cenário em que ele pode recorrer à IA em segundos?
Isso vai acabar caindo mais ainda no project-based. Na ideia de entregar algo, porém com os passos que levaram àquele resultado: laboratório, experimento, seus cálculos… Toda a linha de raciocínio.