O nome da empresa é Blessed, abençoada, em inglês, mas virou uma maldição na vida dos irmãos Wesley e Joesley Batista. A holding com sede em Delaware, paraíso fiscal americano, foi criada para fazer o negócio da fusão bilionária da JBS com o Bertin e agora está sob o escrutínio da Comissão de Valores Mobiliários (CVM) e da Justiça americana. Um acionista minoritário da JBS pediu, nesta semana, à corte de Delaware o que por lá é conhecido como um “discovery application”. Esse instrumento jurídico serve para pedir que uma empresa apresente todo e qualquer documento que tenha sob sua custódia, para ser usado em processos que corram em qualquer lugar do mundo. Pela lei americana, se o juiz autorizar o pedido, a empresa é obrigada a entregar os documentos. O fundo de investimento em ações SPS argumenta que o discovery no caso da Blessed é necessário para que possam ter acesso a documentos que ajudem o processo que corre na CVM. Eles estão interessados especialmente em um suposto acordo secreto entre os Bertin e a família Batista.
O Radar Econômico teve acesso ao pedido de discovery que inclui integralmente o relatório técnico feito pela CVM. Os técnicos da autarquia dizem que a Blessed foi usada em operações fraudulentas com a intenção de burlar as regras da Comissão e prejudicar acionistas minoritários da JBS que tiveram a participação diluída com a fusão com o Bertin, nos idos de 2009. Pela análise feita, enquanto a J&F, que já controlava a JBS, teve um aumento de quase 10% em sua participação no frigorífico, os minoritários tiveram participação reduzida em quase 40%. De acordo com o relatório, isso teria sido feito por meio de uma sobreavaliação do valor do Bertin e com o uso da Blessed Holdings, que hoje tem o nome de Colorado Investiment Holdings. Durante anos, a JBS deixou de informar quem eram os donos da Blessed, apesar de terem mais de 5% das ações da companhia.
Um ponto que chama a atenção da CVM é o fato de que Joesley assumiu em sua delação premiada com as autoridades brasileiras que criou a Blessed, mas apenas por questões tributárias. Já seu irmão Wesley Batista, que foi CEO do frigorífico, oficialmente informou à CVM que ninguém da JBS era dono da Blessed. Além dos irmãos Batista, os irmãos Bertin também figuram no processo administrativo. Recentemente, a CVM negou um acordo com os Bertin, que juntos ofereceram cerca de meio milhão de reais para encerrar o caso. Os irmãos Batista optaram por não pedir nenhum acordo. Pela legislação que rege a CVM, as multas individuais podem ser estabelecidas em até 50 milhões de reais ou o equivalente a três vezes o valor da vantagem econômica auferida.
Se a CVM considerar que os irmãos fizeram algo errado, eles podem ter que pagar multas milionárias e ficar anos sem poder exercer cargos administrativos em empresas de capital aberto, mas, pior do que isso, o processo pode dar argumentos sólidos para que os minoritários peçam ressarcimento na Justiça ou em processos arbitrais, o que atingiria em cheio a JBS que tem ações negociadas na bolsa de valores.