Sugiro a vocês que não se descuidem do caso do FAT, sobre o qual escrevi três posts ontem. Sei que o assunto parece um tanto técnico e distante da política, mas não é assim. O fundo administra uma soma fabulosa de dinheiro — patrimônio de R$ 150 bilhões e R$ 43 bilhões de orçamento no ano que vem. Carlos Lupi, ministro do Trabalho, já havia tentado dar um golpe, redigindo um decreto que eliminava a presidência rotativa entre as três bancadas que compõem o conselho (governo, empregadores e trabalhadores). Lula não é bobo, e Lupi não conseguiu. Por esperto, o “companheiro dos companheiros” imaginava soluções mais originais.
Ontem, finalmente, Lupi conseguiu o que queria: eleger uma espécie de laranja para tomar conta do setor justamente no biênio em que a presidência caberia à bancada empresarial — no caso, à CNA (Confederação Nacional de Agricultura e Pecuária do Brasil). Já contei a história aqui. E como o ministro logrou o seu intento? Recorrendo ao que eu chamaria de “democracia bolivariana”.
Fico imaginando Lula a balançar a cabeça com uma ponta de sarcasmo quando Lupi lhe sugeriu o decreto. Poderia ter dito: “Companheiro, temos um modo melhor de tirar a presidência das mãos da CNA…” E qual é esse modo, operado com rigor por Lupi? “Ora, se você não pode vencer com o colégio eleitoral que tem, fraude, então, o colégio”. Ou ainda: “Se você não consegue ganhar segundo as regras do jogo, por que não mudar as regras do jogo de modo a assegurar a vitória”? Não foi assim, mudando ou ignorando a escrita, mas sempre com eleições, que Chávez já chegou a uma ditadura na Venezuela? Não é rigorosamente assim que seus homólogos fizeram ou estão fazendo no Equador, na Bolívia e na Nicarágua — em Honduras, Zelaya tentou, mas, até agora, felizmente, não deu certo.
Sim, fiquemos atentos: essa gente recorre à própria lei para jogar a lei no lixo. Um bobalhão poderia indagar: “Ué, não houve uma eleição no Codefat?” Houve, sim. E ela foi usada justamente para solapar a convivência democrática que havia no conselho desde a origem, em 1990. Alguém poderia objetar: “Quem fez isso foi o ministro, não o Lula”. Bobagem! Ministros são a voz e a vontade do presidente em suas respectivas áreas. Fazem o que ele manda. E Lula deixou claro que já estava com o saco cheio da democracia que vigia no FAT.
Deve ter pensado qualquer coisa iluminada como: “Com a minha popularidade, democracia pra quê?”
Assim, Lupi se tornou o Zelaya bem-sucedido do FAT. Parece usar até a mesma tintura no cabelo.