É estupefaciente!
Quando se imagina que nada mais pode sair do baú do baguncismo nacional, eis que surge uma nova proposta, agora ainda mais exótica. E juntando alhos com bugalhos. A que me refiro?
Miro Teixeira (Rede-RJ), aquele que queria fazer de uma emenda sobre eleição direta um casuísmo contra Michel Temer, se juntou com Rogério Rosso (PSD-DF), um dos líderes do chamado Centrão — e que até parecia relativamente centrado — para propor, vejam que coisa!, uma Assembleia Nacional Constituinte. Sim, senhores! Eles já conseguiram as 172 assinaturas necessárias para protocolar uma Proposta de Emenda Constitucional.
E como se operaria a estrovenga?
– A Constituinte seria formada pelos atuais parlamentares, com Câmara e Senado atuando como Casa Única; – essa constituinte teria vigência entre fevereiro de 2017 e 31 de janeiro de 2018; – essa Constituinte atuaria principalmente na reforma política e eleitoral, mas não só, é claro!; – os “constituintes” só estariam proibidos de mexer nas cláusulas pétreas da Constituição.
Não sei por onde começar a examinar a estupidez.
Em primeiro lugar, um Congresso que se autodeclarasse “constituinte” estaria dando um golpe no povo. Digam-me: algum eleitor foi avisado de que esse Parlamento que aí está outorgaria a si mesmo tal função?
Quando se fez a revisão da Constituição de 1988, a data estava especificada no próprio texto. O eleitor tinha como saber que estava elegendo um deputado ou senador que iria rever aspectos da Carta.
Mas, se é para esse mesmo Congresso se tornar Constituinte, qual é a vantagem? Ora, medidas que alteram a Constituição, que precisam ser aprovadas por dois terços da Câmara e do Senado, poderiam ser aprovadas por maioria simples.
Parece pouco: se uma porcaria como essa prospera, a PEC do Teto, por exemplo, estará sob risco, é claro! É evidente que a reforma da Previdência também ficaria subordinada a esse processo constituinte, mas, ora bolas!, com os aparelhos da esquerda nas ruas, fazendo aquilo que mais sabem: provocando pancadaria, quebra-quebra, arruaça.
Mais: imaginem a insegurança jurídica que emanaria de um processo constituinte em que, a rigor, por maioria simples, tudo poderia ser permitido.
E há a questão conceitual. Processos constituintes se seguem a rupturas da ordem, à instauração, literalmente, de um novo regime. Rosso diz que o impeachment de Dilma e a deposição do presidente da Câmara apontariam para isso. Ele está errado. A verdade está no oposto. As duas quedas indicam justamente a reiteração dos valores do regime que temos.
Por que Miro Teixeira está nessa? Bem, ele é da turma de Marina Silva. Ela já era contra o cumprimento da Constituição na posse de Michel Temer, como é sabido. Mas e Rogério Rosso, do partido do ministro Gilberto Kassab, um pré-candidato à Presidência da Câmara? Vai saber. Vai ver está jogando a toalha.
Para que a PEC seja aprovada, são necessários três quintos dos votos na Câmara (308 deputados) e no Senado (49 senadores), em duas votações. Duvido que prospere. Se prosperasse, caberia recorrer ao Supremo para saber se deputados e senadores podem surrupiar do povo o direito de escolher seus parlamentares constituintes.
Não creio que estupidez dessa monta vá adiante. Mas não deixa de ser espantoso que dois parlamentares de expressão se dediquem à tese e que consigam 172 assinaturas para tal bizarrice — ainda que muita gente assine um requerimento sem ler.
Uma sombra de estupidez paira sobre o país.
Tomara que a gente sobreviva.