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Ministros do STF batem boca sobre o assunto errado

A discussão é necessária (o bate-boca, não), mas o debate que mais interessa é no Congresso (e está mal encaminhado)

Por Ricardo Rangel Materia seguir SEGUIR Materia seguir SEGUINDO 21 jun 2024, 12h27
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  • Os ministros do STF andaram batendo boca de novo. Por causa de uma lei que é a cara do Brasil.

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    A lei diz que é crime vender droga, mas não é crime comprar (desde que seja para usar). Já seria uma lei amalucada se fosse só isso, mas é pior: ela não diz como a Justiça deve distinguir entre uma coisa e a outra.

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    Pior ainda, ela determina que o juiz decida com base em critérios como condições sociais do portador da droga, local da apreensão, etc. Funciona assim: branco e rico vai para casa; preto e pobre vai para a cadeia. Ou seja, a lei não é a mesma para todos.

    O STF discute se deve criar algum critério objetivo que permita a aplicação da lei — a parte boa quer criar, a parte ruim quer deixar como está, Toffoli não quer uma coisa nem a outra. O debate é necessário porque o Congresso foi omisso ao criar a lei de drogas, e cabe ao Congresso voltar ao assunto para decidir o que fazer. Há muito em que pensar durante esse debate.

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    Nos anos 1920, o moralismo americano (evangélico) conseguiu proibir o comércio e o consumo de álcool. Ninguém deixou de beber. Mas floresceu de um gigantesco mercado ilegal de bebidas — com a Máfia para administrá-lo. A gente não aprendeu com isso.

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    Nos anos 1940, o moralismo brasileiro (católico) conseguiu proibir o jogo do bicho. Ninguém deixou de jogar. Mas o jogo do bicho, antes visto como pitoresco e inócuo, se profissionalizou, se agigantou, passou a cometer todo tipo de crime, e se tornou a única atividade criminosa verdadeiramente organizada do Brasil (vem se desorganizando ultimamente). A gente não aprendeu com isso.

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    A partir dos anos 1970, o moralismo americano iniciou uma Guerra às Drogas de alcance mundial, e o moralismo brasileiro nela embarcou com entusiasmo. Ninguém deixou de se drogar. O que aconteceu foi a profissionalização de uma atividade antes mambembe e a criação de quadrilhas poderosíssimas, como os cartéis de Medellin, Cáli, Juarez e muitos outros.

    No Brasil, deu em PCC, Comando Vermelho, Terceiro Comando etc., que se diversificaram e se envolveram em outras atividades criminosas, como roubo de cargas. A gente não aprendeu com isso.

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    O fracasso da política antidrogas e a omissão do Poder Público na segurança levaram à organização espontânea de cidadãos para combater o crime. O moralismo brasileiro fechou os olhos para a “polícia mineira” e permitiu que ela se transformasse nas milícias, uma modalidade criminosa ainda mais nociva para a sociedade (e muito mais bem articulada) do que o tráfico. A gente não aprendeu com isso.

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    Hoje, o relacionamento entre bicho, tráfico e milícias é complexo e simbiótico, com interesses às vezes conflitantes, mas cada vez mais alinhados. É um problema monstruoso.

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    O Congresso precisa voltar ao assunto — mas para fazer muito mais do que distinguir uso e tráfico. É preciso parar de enxergar drogas como caso de polícia, e enxergá-las como questão de saúde pública, que é o que são.

    Mas no Congresso a iniciativa, moralista, que existe é endurecer a lei, e mandar todo mundo, usuários e traficantes para a cana dura. Enquanto isso, o moralismo aplaude os governadores que mandam suas polícias às favelas para realizar operações que matam criminosos, policiais e inocentes, incluindo crianças.

    A gente não aprende nada, nunca, mesmo.

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    (Por Ricardo Rangel em 21/06/2024)

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