
Resoluções de ano novo são aquelas decisões inquebrantáveis tomadas até 31 de dezembro que quase sempre se quebrantam antes mesmo do Dia de Reis. Como o dia já passou (foi em 6 de janeiro), podemos falar de decisões que o Brasil precisa tomar e (começar a) cumprir durante este ano. Eis algumas:
Resolução #1: acabar com o golpismo
O golpe de Bolsonaro deu errado, mas a tradição do golpismo, que começou no século retrasado, continuará viva enquanto a tradição da impunidade para golpistas não acabar. É preciso mandar os golpistas, conforme prevê a lei, para uma longa temporada na cadeia — inclusive e especialmente os cinco oficiais generais de quatro estrelas envolvidos.
Mas isso não basta, é preciso criar um projeto de Defesa Nacional. O poder civil brasileiro se comporta como se isso não fosse problema seu. No entanto, parafraseando Clemenceau, a Defesa Nacional é importante demais para ficar por conta dos militares: cabe aos representantes eleitos pelo povo (com o apoio dos militares, naturalmente) a definição de um projeto de defesa. Sem ele, militares continuarão se sentindo excluídos, insatisfeitos e sem compreender qual é sua função na democracia. Um campo fértil para o golpismo.
Parte do projeto de Defesa Nacional é a formação dos oficiais, a ser subordinada — exceto em disciplinas estritamente militares — às instâncias civis normais (ministério e secretarias de Educação). Sem isso, o golpismo continuará a ser aprendido na escola.
“A prodigalidade com dinheiro se espalha pela República, mas é o Executivo que deve indicar o caminho”
Também é preciso proibir que militares ocupem cargos políticos civis — eleitos ou não. “Quando a política entra no quartel por uma porta, a disciplina sai pela outra”, ensinou o general legalista Peri Bevilacqua (ele mesmo cassado por militares-golpistas-políticos).
Evidentemente, um projeto de Defesa Nacional se inscreve em um orçamento federal que faça sentido, e, para isso, é preciso cumprir a resolução que vem a seguir.
#2: aprender que dinheiro não dá em árvore
Como se recusa a compreender que governar é administrar recursos limitados e estipular prioridades, o Brasil gasta demais e gasta mal. A consequência é inflação alta ou juro alto (ou os dois), e o resultado prático é que todo ciclo de crescimento acaba sendo um voo de galinha, seguido de desaceleração da economia e concentração de renda.
A prodigalidade e a irresponsabilidade brasileiras se espalham por todas as instâncias da República, mas quem tem o dever de indicar o caminho é o Poder Executivo. Enquanto ele não se convencer de que tem que cortar na carne, não vai convencer ninguém a fazê-lo. E, enquanto políticos, juízes, procuradores etc. não controlarem seu apetite, será impossível organizar o orçamento.
#3: recuperar os serviços públicos básicos (saúde, segurança e educação)
O Estado brasileiro custa uma fortuna e entrega serviços de péssima qualidade. Enquanto isso permanecer assim, o país continuará como na anedota da casa em que falta pão, onde todo mundo grita e ninguém tem razão.
#4: parar de lacrar
O exemplo deve vir de cima: de ministros do Supremo Tribunal Federal, dos membros do Congresso e, principalmente, do governo federal.
Feliz 2025.
Publicado em VEJA de 17 de janeiro de 2025, edição nº 2927