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Vivendo perigosamente

Movimento na Europa não é caso de pânico (ainda), mas de alerta

Por Ricardo Rangel Materia seguir SEGUIR Materia seguir SEGUINDO Atualizado em 14 jun 2024, 11h29 - Publicado em 14 jun 2024, 06h00
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  • As eleições para o Parlamento Europeu foram um choque: é a maior bancada de extrema direita já vista. Não é caso de pânico (ainda), mas é caso de alerta. Porque esse movimento não é novidade: o fascismo nasceu há 100 anos e se alimenta do ressentimento, da indignação, da frustração, do medo — que podem existir em qualquer época.

    A Revolução Industrial, em fins do século XIX, aumentou a desigualdade e criou condições de trabalho mais precárias. A Revolução Tecnológica e a globalização fazem hoje a mesma coisa, só que de forma mais rápida e mais cruel.

    A crise financeira de 1907, nos EUA, quase quebrou o sistema bancário, levou a forte recessão e gerou revolta contra os banqueiros; a crise de 2008 foi similar. A pandemia da gripe espanhola matou milhões de pessoas e gerou muito medo e insegurança; a da covid, também.

    Há 100 anos, populistas e extremistas usaram o rádio para, ao repetir mentiras mil vezes, criar verdades e acirrar a polarização entre fascistas e comunistas. Hoje, com as redes sociais no lugar do rádio, a polarização se dá entre a extrema direita e o identitarismo intolerante de esquerda. O antissemitismo (agora de esquerda) está no patamar mais alto dos últimos oitenta anos.

    Em 1923, Hitler iniciou sua marcha para o poder com uma tentativa de golpe de Estado na Baviera; no ano seguinte, Mussolini obteve uma vitória esmagadora nas urnas, abrindo caminho para a ditadura. Em menos de vinte anos, a Inglaterra seria a única democracia da Europa.

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    Hoje, a extrema direita domina países como Rússia, Hungria e Turquia e avança na Alemanha, França e Itália. Nos EUA, Trump, que tentou o golpe e foi condenado em 34 acusações, continua fortíssimo.

    “Infelizmente, parece haver mais gente interessada em cortejar o desastre do que em evitá-lo”

    No Brasil, Bolsonaro tentou o golpe, está inelegível, é investigado por uma miríade de crimes (inclusive o roubo de uma joia até agora desconhecida) e deve ser preso. Mesmo assim, segue popular. A direita convencional não se afasta dele por medo de perder votos, há quem sonhe em revogar a sua inelegibilidade. No Congresso, a lei das fake news ficou para as calendas, há iniciativas para acabar com a delação premiada e anistiar os golpistas do 8 de Janeiro.

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    Políticos de todas as cores se xingam e se agridem para lacrar nas redes, os cancelamentos tornam inviável qualquer debate sério, os moderados praticamente sumiram.

    Governo e Congresso não se entendem, mas ambos criam despesas esdrúxulas sem benefício para o cidadão. Sem plano de governo, petistas preferem acusar seus críticos de fascistas a apresentar propostas, e de vez em quando aparecem excrescências (como a MP devolvida por Rodrigo Pacheco).

    Mesmo ministros do Supremo, instituição que salvou a democracia brasileira, se comportam como condestáveis, tomando decisões absurdas e fazendo viagens de luxo custeadas por empresários. Enquanto isso, o ressentimento popular cresce.

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    Há muitas diferenças entre 1924 e 2024, e a história não precisa se repetir — desde que aprendamos com o passado e nos esforcemos para evitar o desastre.

    Infelizmente, parece haver mais gente interessada em cortejar o desastre do que em evitá-lo.

    Publicado em VEJA de 14 de junho de 2024, edição nº 2897

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