Sim, a Olimpíada de Munique seria para sempre lembrada pelo atentado contra a delegação de Israel, em plena Vila Olímpica. Alguns dias antes, o mundo conheceria o mais espetacular nadador de todos os tempos – até que, em 2004, surgisse um certo Michael Phelps. O nome do tubarão, para ficar com a alcunha a ele colada por VEJA (“As medalhas do tubarão de Munique”): Mark Spitz, o bigodudo Spitz.
Um pequeno quadro dentro de uma reportagem a respeito das parcas esperanças de medalhas do Brasil iluminava o americano: “A respiração um pouco ofegante, uma troca de sorrisos com os companheiros de equipe – John Kinsella. Frederick Tyler e Steve Genier – um leve impulso e o corpo de Mark Spitz desliza suavemente de costas até a corda que baliza a piscina olímpica de Munique, onde se apoia. Terminou o revezamento 4 por 200, ele cumpriu a última etapa e, com a mesma displicência das quatro disputas anteriores, passou a aguardar que o placar fixasse o resultado da prova. Segundos depois, eletronicamente, mais um recorde mundial de natação era registrado: 7 minutos, 35 segundos e 78 centésimos. A assistência aplaude, os colegas de equipe vibram, e Spitz toma impulso na corda, deixa a piscina e vai receber sua quinta medalha de ouro ganha na Olimpíada de Munique. Com isso, esse californiano de 22 anos, na quinta-feira passada, transformou-se no mais laureado nadador olímpico de todos os tempos”. Ele ganharia ainda outras duas medalhas douradas, em um total de sete. A marca inigualável de vitórias em uma única edição dos Jogos seria superada por Phelps em 2008.
Não havia, naqueles dias de 1972, nada tão relevante como o extraordinário desempenho de Spitz. Mas não. Bastava virar a página de VEJA, da 101 para 102, para chegar a uma outra notícia ruidosa do esporte, e ela não estava em Munique. “O final inevitável”, anunciava o título da reportagem com menos de uma página, em um tempo em que se dizia muito mais com muito menos. “No fim, não houve reis tombados, nem comportados apertos de mãos. Na sexta-feira passada, se seu hotel em Reiquejavique, na Islândia, o campeão soviético Boris Spassky telefonou ao árbitro Lothar Schmidt e o informou de que não pretendia continuar a vigésima primeira partida pelo campeonato mundial de xadrez, abdicando, em favor do desafiante americano Robert James Fischer, ao trono de campeão mundial, há 24 anos em poder dos soviéticos”. Era o auge da Guerra Fria ao redor de um tabuleiro. Ela prosseguiria, firme e forte, em Munique, na noite de 10 de setembro, quando União Soviética e Estados Unidos disputaram a final do basquete masculino.
Os americanos nunca haviam perdido uma partida olímpica. Até a final dos Jogos de 1972, os Estados Unidos jamais tinha entrado em uma Olimpíada sem ter vencido a edição anterior da competição. Desde a primeira aparição do basquete nas Olimpíadas de Berlim, em 1936, nenhum país havia conseguido barrá-los. E então, a URSS venceu por 51 a 50, em final dramática, na mais ruidosa de todas as celeumas olímpias. Os americanos chegaram a comemorar a vitória por 50 a 49. Mas houve um problema com o cronômetro, a partida foi retomada e Sergei Belov fez história. Os soviéticos celebraram, os americanos choraram. “Declaro e disponho como manifestação de última vontade que, quando de minha morte, minha mulher, Rita, e meus filhos, Jill e Bryan, e seus descendentes jamais aceitem a medalha de prata dos Jogos de 1972 na Alemanha Ocidental”, diz o artigo IX do testamento do atleta Kenneth Davis. Ele foi um dos jogadores dos Estados Unidos que se recusaram a receber a medalha de prata da competição e, pela primeira vez na história, deixaram o pódio olímpico desfalcado durante uma premiação.