O caubói que rouba a cena em The White Lotus e The Righteous Gemstones
Forjado em faroestes, Walton Goggins faz da cara de mau um trunfo peculiar

Nascido no Alabama e criado na Geórgia, dois estados do sul “profundo” dos Estados Unidos, Walton Goggins mudou-se nos anos 1990 para Los Angeles em busca do sonho típico: virar ator em Hollywood. Com um semblante mal-encarado, ele penou de início. Foi manobrista em estacionamentos enquanto estudava atuação — e lia peças de Shakespeare em voz alta para perder o sotaque sulista. Fez de tudo, enfim, para amenizar o jeito de caubói malvado que vinha de origem. Não adiantou: seu modo de falar carregado só garantiu ao aspirante papéis em faroestes. Ironicamente, Goggins soube transformar a maldição em trunfo: com sua estampa peculiar, hoje enfileira papéis surpreendentes em séries que vão da futurista Fallout (Prime Video) à sátira do televangelismo The Righteous Gemstones, passando pela nova temporada de The White Lotus (ambas da HBO e Max).
A participação em The Righteous Gemstones resume a capacidade de “entrega” de Goggins. Nesse retrato ácido de um clã de pastores milionários do chamado Bible Belt (Cinturão da Bíblia) americano, ele é Baby Billy, cantor gospel reconhecido por um único hit que emplacou quando astro mirim. Goggins deixa de lado o jeito durão para soltar o gogó e rebolar em números musicais que saíram da série para viralizar nas redes. Logo na primeira temporada, o ator fez um nu frontal — e repete a dose no início da quarta, que chegará ao Max no domingo 9. Em The White Lotus 3 seu tom muda da água para o vinho: sai o histrionismo e entra a tensão latente de Rick Hatchett, hóspede do resort tailandês, onde se passa a trama, que esconde uma explosiva obsessão.

Antes de chegar lá, o ator de 53 anos passou por testes de fogo para provar sua versatilidade. Ele teve a primeira chance de explorar sua complexidade dramática ao encarnar um detetive cheio de dubiedade na série policial The Shield — Acima da Lei (2002-2008). Pouco depois, deu vida a uma prostituta trans em Sons of Anarchy (2008-2014). Mesmo quando já começava a ganhar prestígio, contudo, a imagem de malfeitor do Velho Oeste teimava em persegui-lo — e Goggins deu vazão à vocação inevitável sem pudor (e para deleite dos espectadores) na estupenda série Justified (2010-2015) e, logo em seguida, em dois grandes filmes de Quentin Tarantino, Django Livre (2012) e Os Oito Odiados (2015). “Pelo menos havia um estereótipo que eu podia interpretar. Uma caixa na qual eu poderia me encaixar”, admitiu Goggins em entrevista recente. De certa forma, ele ri de sua sina na ficção científica Fallout — na qual interpreta um pistoleiro zumbi num mundo apocalíptico. Na carreira, o caubói sofre, mas vence no final.
Publicado em VEJA de 7 de março de 2025, edição nº 2934