A aposta da TV Globo para espantar o fantasma da baixa popularidade no horário nobre está dando certo: a exibição do remake de Pantanal é um sucesso incontestável. A trama, agora comandada por Bruno Luperi, neto do noveleiro Benedito Ruy Barbosa, atingiu 30,2 pontos de média na Grande São Paulo durante o capítulo que marcou o primeiro encontro entre Juma (Alanis Guillen) e Jove (Jesuíta Barbosa). Mas a nova versão, apesar de parecer ousar ao tocar em assuntos espinhosos como machismo, na realidade só deu uma roupagem atual para temas que já estavam presentes em 1990 e eram tratados de maneira muito mais abusada – e até mesmo mais divertida.
Para se adequar ao século XXI, Pantanal aposta em discursos cheios de didatismo que mais parecem ter saído de uma redação do Enem. O tom chato que pende mais para o superficial que o efetivo é muito diferente da trama original – mas os temas já estavam lá. Algumas cenas do antigo folhetim foram resgatadas nas redes sociais e comparadas com as exibidas atualmente. Na nova versão da Globo, quando Guta (Julia Dalavia) repreendeu o pai, Tenório (Murilo Benício), por se referir a Jove de forma homofóbica, ela praticamente leu um discurso pronto com termos rebuscados e tom sério. Já na novela original de 1990, Guta, vivida por Luciene Adami, decidiu ser ácida e afrontosa: “E seu eu fosse sapatona, o senhor me afogava também?”.
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Além de Guta, Jove é outro personagem que também foi repaginado para o novo Pantanal. Diferentemente daquele vivido por Marcos Winter, o jovem interpretado agora por Jesuíta Barbosa é mais introspectivo e sério – o que até mesmo representa melhor sua geração. Mas o senso de humor do Jove original dava um charme para o folhetim que faz falta no remake. Enquanto na versão de 2022 ele negou de maneira educada o cavalo dado por José Leôncio (Marcos Palmeira) como presente de boas-vindas, em 1990 o personagem respondeu à insistência do pai para ele montar com um sonoro “se eu preciso montar num cavalo pra mostrar que sou macho, então aqui na sua frente eu assumo: eu sou um bicha”, seguido de uma gostosa risada.
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Quando foi exibido pela primeira vez, na já extinta Rede Manchete, o folhetim não tinha grande preocupação em ser progressista. Muito pelo contrário: o autor, Benedito Ruy Barbosa, sempre foi um conservador assumido e até fez declarações consideradas homofóbicas ao longo da carreira. Por exemplo: em 2016, antes da estreia de Velho Chico, ele chegou a dizer que odeia “história de gays”. Mas seu molho de humor e deboche sem dúvida tornava a novela mais palpitante. As cenas revividas têm sintonia inegável com a visão politicamente correta sobre o tema em 2022 – mas ficariam mais afiadas (e talvez até se mostrassem mais eficazes) se não se levassem tão a sério. O que falta ao novo Pantanal, em suma, é encontrar um ponto de equilíbrio entre a acidez que tanto fez sucesso no original e os discursos que rechaçam preconceitos como o machismo e a homofobia.