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Thomas Traumann

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Thomas Traumann é jornalista e consultor de risco político. Foi ministro de Comunicação Social e autor dos livros 'O Pior Emprego do Mundo' (sobre ministros da Fazenda) e 'Biografia do Abismo' (sobre polarização política, em parceria com Felipe Nunes)

Nem tudo é facada

A eleição de São Paulo é emocionante, mas não tem reviravolta a cada semana

Por Thomas Traumann Materia seguir SEGUIR Materia seguir SEGUINDO Atualizado em 19 set 2024, 17h00 - Publicado em 18 set 2024, 16h53

Campanhas emocionantes como a disputa pela Prefeitura de São Paulo deste ano geram expectativas de grandes viradas a cada debate, a cada denúncia e a cada pesquisa. É como se o eleitor assistisse a uma minissérie de TV na qual todo capítulo termina com uma surpresa para o público seguir ligado. A penúltima reviravolta foi a cadeirada do apresentador José Datena no coach Pablo Marçal no debate da TV Cultura de domingo. A mais recente é a pesquisa Quaest/TV Globo desta quarta-feira, dia 18. A conclusão imediata dos números da Quaest — com Marçal variando de 23% para 20% e Datena oscilando de 8% para 10% — levou o senso comum a supor que a cadeirada ‘valeu a pena’ e que o novo quadro consolida um limite para a virulência de Marçal. Parece lógico, mas a cabeça e o coração do eleitor nem sempre se movem na velocidade de uma minissérie de TV.

No geral, a tomada de decisão do voto é resultado de um processo, não de um acontecimento único. Nesta eleição paulistana, as opiniões dos eleitores estão sendo traçadas a partir de eventos em série, os debates de TV, que apresentaram o grande público a Marçal, e a propaganda na TV, na qual os adversários estão desconstruindo a imagem do coach.

Em julho, antes da série de debates, 44% dos eleitores de São Paulo entrevistados pela Quaest diziam não conhecer Marçal. Agora, 79% têm uma opinião sobre ele, majoritariamente negativa.

A ideia de um evento capaz de mudar o jogo ganhou força no mundo político com o atentado sofrido por Jair Bolsonaro quatro semanas antes do primeiro turno das eleições de 2018. Hoje é fácil afirmar que a facada teve papel fundamental na arrancada final de Bolsonaro, mas mesmo na época o eleitor foi cauteloso.

Dados inéditos de pesquisas telefônicas diárias feitas pela Quaest em 2018 revelam que o atentado ocorreu num momento de fragilidade de Bolsonaro. Atacado pesadamente pelas campanhas de TV dos adversários, Bolsonaro havia caído de 30% das intenções de voto em 30 de agosto para 20% em 6 de setembro, dia do atentado. Nos dias seguintes à tentativa de assassinato, ele começou a subir, mas aos poucos. Uma semana depois do atentado, por exemplo, ele havia voltado à casa dos 30%, um ótimo número, mas que ainda não definia as eleições.

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O 6 de setembro foi como uma pedra jogada na água, com seus efeitos sendo sentidos ao longo das semanas. Um mês depois, Bolsonaro recebeu 46% dos votos no primeiro turno. A facada foi fundamental porque (1) junto com a comoção do atentado, cessaram os ataques a Bolsonaro, (2) ele ganhou um espaço gratuito de TV três vezes maior que de todos os seus adversários somados e (3) a sua sobrevivência reforçou a imagem de o escolhido por Deus no meio evangélico. Até a facada foi um processo.

Nesta campanha paulistana, as candidaturas do prefeito Ricardo Nunes e do deputado federal Guilherme Boulos apostam no processo, na consolidação de uma imagem junto ao seu eleitorado mais fiel. Sem tempo de TV, Marçal depende de eventos esporádicos como os debates para chamar atenção para si mesmo.

Com seis minutos e trinta segundos diários na TV, Ricardo Nunes tem usado o seu tempo para (1) apresentar-se como um tocador de obras na cidade, (2) ligar o seu nome ao do governador Tarcísio de Freitas e (3) destruir a imagem de Marçal. Está funcionando. Desde que começaram os programas de TV, o potencial de voto do prefeito aumentou de 41% para 50%, enquanto a rejeição a Marçal subiu de 35% para 45%. Em 28 de agosto, apenas 26% diziam que Tarcísio votaria em Nunes. Hoje são 53%.

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Com dois minutos e 22 segundos, o deputado federal Guilherme Boulos se ocupa de ligar o seu nome ao do presidente Lula. Em 28 de agosto, 51% dos entrevistados sabiam que Lula apoia Boulos. Agora já são 68%.

É cedo para afirmar categoricamente que o paulistano acha que Marçal “mereceu” a agressão ou que há um cansaço ao seu estilo de ultraje pelo ultraje. Apenas mais pesquisas poderão chegar a essas correlações. O tempo do eleitor é mais lento do que a demanda da opinião pública por conclusões definitivas. Até porque, numa campanha que supera os limites do bom senso, cada semana pode gerar um novo fato que muda tudo.

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