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Thomas Traumann

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Thomas Traumann é jornalista e consultor de risco político. Foi ministro de Comunicação Social e autor dos livros 'O Pior Emprego do Mundo' (sobre ministros da Fazenda) e 'Biografia do Abismo' (sobre polarização política, em parceria com Felipe Nunes)

O poker de Lula

Presidente adia a reforma ministerial e regateia preço do apoio do Centrão

Por Thomas Traumann Materia seguir SEGUIR Materia seguir SEGUINDO Atualizado em 13 Maio 2024, 22h40 - Publicado em 21 ago 2023, 13h52

A pesquisa Genial/Quaest revelando que o presidente Lula da Silva é aprovado por 60% dos eleitores, o maior índice do ano, reforçou a sua decisão de esticar a corda na relação com o presidente da Câmara, Arthur Lira. Depois de 50 dias, Lula adiou mais uma vez a reforma ministerial para incorporação do Centrão ao governo apostando que com isso fará baixar o preço do apoio. Como toda aposta, tem riscos.

Na quarta-feira à noite, na reunião que deveria sacramentar o acordo, Lula ofereceu a Lira os ministérios dos Portos e uma nova pasta, a de Micro e Pequenas Empresas, além das estatais Caixa Econômica Federal e Funasa. A proposta foi tomada como uma desfeita e recusada na hora, o que Lula sabia que iria acontecer de antemão. No início das discussões da reforma, Lira queria o comando do Ministério da Saúde. Depois disse aceitar o Ministério de Desenvolvimento Social, a pasta que comanda o Bolsa Família, a principal bandeira dos mandatos Lula 1 e 2. Hoje o Centrão já aceita o Desenvolvimento Social sem o Bolsa Família. Daí a aceitar o Ministério de Micro e Pequenas Empresas vai uma distância. Como me disse um líder do Centrão, “um ministério micro vai render apoios micros”. Sem acordo, Lula viajou para um périplo por África do Sul, Angola e São Tomé e só volta no próximo fim de semana.

Lula cozinha Lira porque não acredita que o presidente da Câmara seja capaz de entregar o promete, o apoio ao governo de 90 a 100 deputados de Republicanos, Progressistas, União Brasil e outras legendas menores. Lula acha ainda que nas votações da agenda “colocar os ricos no imposto de renda” _ como a taxação de fundos exclusivos, offshore, juros sobre capital próprio e dividendos _ Lira vai ficar do lado dos ricos. E que a partir do ano vem, o poder de Lira vai diminuir com o início da discussão sobre a sua sucessão. Tudo posto, Lula regateia o apoio de Lira porque acha que o preço exigido pelo presidente da Câmara está alto.

Haverá troco e a conta irá para o ministro Fernando Haddad. Nesta semana, depois de vários adiamentos, a Câmara deve aprovar em votação final o Arcabouço Fiscal, mas sem as mudanças feitas pelo Senado. Isso significa que o orçamento de 2024 virá sem a brecha de R$ 30 bilhões em gastos que seria obtida com a mudança da data de cálculo da inflação.

A proposta de taxação das contas offshore, incluídas pelo Ministério da Fazenda como base financeira para o aumento do salário mínimo, deve ser derrubada. No seu lugar, a Câmara deve indicar as taxas sobre as apostas online como origem dos recursos para bancar o novo salário mínimo. As duas possíveis derrotas tornam mais difícil o desafio de Haddad em cumprir as metas do novo Arcabouço.

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Lula aposta que, ao final, haverá um consenso com Lira porque o acordo interessa aos dois lados. A base do poder do presidente da Câmara são as emendas parlamentares e para que elas cheguem às prefeituras, ele precisa de um governo funcional. Um orçamento restritivo e fiscalmente responsável pode ser o que Lira diz defender nos jantares com a Faria Lima, mas não vai contra os seus interesses. A PEC da Transição, que ampliou em R$ 200 bilhões os gastos do orçamento de 2023, já havia mostrado isso.

Há riscos. A popularidade de Lula medida pela Genial/Quaest é fruto da percepção de um bom momento econômico. Para 34% dos entrevistados, a economia melhorou nos últimos 12 meses. Mais importante: para 59% ela vai continuar melhorando nos próximos 12 meses. Esse otimismo contaminou mesmo eleitores antipetistas. Entre os que votaram no ex-presidente Jair Bolsonaro, 35% acham que a economia vai melhorar. Na região Sul, onde Lula e o PT tradicionalmente são derrotados, a aprovação subiu 11 pontos percentuais em relação a junho, de 48% para 59%. No eleitorado evangélico, que majoritariamente votou em Jair Bolsonaro em 2022, pela primeira vez na série a aprovação superou a desaprovação, por 50% a 46%.

Lula está no auge da popularidade porque a maioria da população enxerga um 2024 melhor que 2023. Se isso não se confirmar _ seja por um orçamento muito restritivo, seja por um descontrole no câmbio_ os mesmos eleitores que hoje aplaudem poderão vaiar. O êxito da economia no Brasil depende intrinsicamente da política.

As reformas ministeriais anteriores de Lula 1 e 2 também foram confusas. Na primeira, em 2003, Lula descartou amigos de longa data, como José Graziano e Benedita da Silva, demitiu o aliado Cristóvam Buarque por telefone e conseguiu trazer apenas do PMDB ao governo. Na tarde anterior à reforma encontrei o então ministro do Trabalho, Jaques Wagner, no Palácio do Planalto. Ele fora chamado ao palácio para ser demitido e, naturalmente, estava amuado. Ao fim da reunião com Lula, Wagner não apenas ficou no governo (foi transferido para a ministério do Conselho do Desenvolvimento Econômico e Social), de lá foi para a articulação política do governo, virou o principal conselheiro de Lula e depois governador da Bahia por dois mandatos.

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