Adriana Bombom, 50 anos, habitava o programa Xuxa Park, na TV Globo, ao longo da década de 1990 como um ponto fora da curva entre paquitas louras tais como a apresentadora. Ainda assim diz que se sentia à vontade na atração, sob batuta da diretora casca-grossa Marlene Mattos, e que nunca passou por situações de racismo nos bastidores da emissora. O programa semanal da coluna GENTE disponível no canal da VEJA no Youtube, no streaming VEJA+ e também na versão podcast no Spotify, recebe Bombom para debater situações excluídas do documentário Paquitas: Para Sempre, do Globoplay, que joga luz a episódios adversos diante e atrás das câmeras.
MARLENE MATTOS. “Escutei histórias (no documentário) que nem eu sabia. Me surpreendi com depoimentos de colegas de profissão que faziam a mesma coisa que eu. Foi uma surpresa grande. Marlene sempre foi muito brigona, era uma mãezona para gente. Qual é a mãe que não briga com seus filhos? Que não chama a atenção, não puxa a orelha para te ensinar o que é certo e errado? Se ela tomou algum tipo de atitude, é porque foi necessário. Fiquei surpresa com alguns depoimentos”.
BOQUINHA DA GARRAFA. “As agências contratam as bonitinhas para bater palma na frente (da plateia). Me chamaram para fazer figuração do quadro Malhaxão, no qual Xuxa ensinava baixinhos a cuidar do corpo, a malhar. Era para ficar lá segurança pesinho, no step com outras meninas de academia. No intervalo, Xuxa foi para o camarim comer e a plateia sentou para descansar. Só que, espevitada, comecei a brincar com a tal de Dança na garrafa, era o auge do axé. Não sabia, mas os monitores estavam ligados em direção a mim, e Marlene vendo aquilo do outro lado do switch. Na volta da gravação, ela mandou um ponto para Xuxa: ‘Chama aquela menina ali, ela dança bem’. Pensei: ‘É agora que vou dar meu nome e sobrenome’. Aí comecei”.
BRONCAS. “Levei muito pouco esporro, porque sempre fui correta com as minhas coisas. O que tivesse que fazer, fazia, sempre chegava no meu horário, fazia tudo direitinho para que não chamasse atenção. Mas recebi alguns esporros sim, foram válidos. Se eu não tivesse levado, acho que não seria a artista que hoje sou, disciplinada. Ajudou no meu crescimento, foi algo bom”.
GORDOFOBIA. “Marlene acompanhava as coreografias. Quando ela chegava no ensaio, pegava alguma para Cristo. Ficava observando se uma estava mais pesada que a outra na hora da dança. No final sempre pagava um esporrinho: ‘Aí gente, vamos fechar a boca, porque está demais’. Ela me colocava como exemplo e eu ficava mal, porque era ‘Bombom que entrou ontem, que é a mais velha, tem corpo intacto’. Ou tipo: ‘Bombom que já tem filho…’ Ficava meio mal se as meninas se chateariam comigo”.
SEM PAQUITAS NEGRAS. “Me incomodava, porque lembro que quando comecei a assistir ao programa da Xuxa, morava no orfanato com minha irmã gêmea. E os únicos programas de TV que a gente podia assistir eram Xuxa, Balão Mágico e os Trapalhões. Amava quando via a Xuxa na nave, com aquele café da manhã. Amava tanto o programa que meus olhos brilhavam. E sabe quando você quer estar lá mas, obviamente, não podia estar? Minha chance era zero e, mesmo assim, depois que saí do orfanato, percebia que não tinha negras, só loiras. Jamais meu sonho ia ser concretizado, não tinha negros ali”.
EMPODERAMENTO. Independentemente de ser paquita ou não, elas (outras meninas negras) viam que era possível ser atriz, apresentadora, repórter… Se a Bombom entrou, uau… E nem eu tinha noção do quanto empoderei meninas a ter posição social na TV. Foi gratificante, hoje tenho noção disso. Saio na rua, elas choram, falam que fui referência de mulher negra, abri portas para outras. Fico feliz da vida, até porque na década de 1990 não tinha tanta mulher negra na televisão”.
VAIDADE. “A única forma de chamar atenção seria pelo corpo, então fui malhar para caramba, deixar o shape na carcaça para todo mundo ter que me olhar. Primeiro, não me achava bonita, não me achava sexy, de tanto que falavam que meu cabelo era ruim, de tanto que me falavam que minha pele era ruim, de tanto falarem coisas absurdas sobre o corpo negro. Então você acaba acreditando que não é bonito, que não é legal”.
O programa é gravado diretamente do Casacor Rio, no shopping Fashion Mall, no espaço da arquiteta Ana Cano; produção de Patricia Def; e conta com captação de imagens de Adaga Midia Businness.