Antes mago da Sapucaí, Paulo Barros foge da onda de enredos políticos
Carnavalesco da Vila Isabel conversou com a VEJA sobre suas inventividades que dividem o mundo do samba
Inventido, ousado, revolucionário. Já foram muitos os adjetivos dados ao carnavalesco Paulo Barros, 60 anos, quatro vezes campeão do Grupo Especial. De volta à Vila Isabel em 2023, a terceira passagem pela escola (as outras foram em 2009 e 2018), Paulo está na contramão de enredos políticos ou com forte temática social – o nordeste domina as escolhas na atual safra. O ex-comissário de bordo escolheu como tema as festividades ao redor do mundo (sob o título Nessa festa, eu levo fé). “Não obrigatoriamente o carnaval tem que (ter) relação a problemas sociais”, critica.
Seu enredo fala de festas ao redor do mundo. O que a gente pode esperar de um tema tão abrangente? O enredo é baseado na alegria, por conta dessa história da pandemia que manteve uma tensão durante tanto tempo. Esse é o primeiro ano de carnaval 100% normal, porque no ano passado ainda sofremos as sequelas da pandemia. Então a gente decidiu por um enredo que celebrasse a alegria e a religiosidade. E não fazer um enredo que falasse de tristeza, tormento, de coisas relacionadas à questões sociais, à luta, nada contra, mas nossa vertente é celebrar e a alegria e a vida.
Como suas aguardadas inovações se darão em 2023? A inovação vem de acordo com o momento. A comissão de frente sofreu transformações em termos de estética e tecnológica durante esses anos. A comissão vem neste (novo) formato. Aplico ali um ingrediente especial, que todo mundo espera, que é a surpresa.
E de todas as inovações que você já fez, qual delas se arrepende? Não vou dizer que tenha me arrependido. Quando a gente faz alguma coisa, tem a expectativa de que aconteça de forma 100% como planejou, às vezes não acontece. Na Vila Isabel, quando estive aqui em 2018, fiz uma comissão de frente em que contratei uma tecnologia duas semanas antes do carnaval. E descobri que a tecnologia não era funcional, e não funcionou. São imprevistos.
Esse ano vai ter alguma inspiração da Disney nas alegorias? As pessoas confundem Paulo com a Disney. Acham que eu vou para Disney para copiar. Lá é o meu lugar de prazer, é o meu lugar que eu gosto de ir para viajar e curtir. Não é verdade que a Disney é o meu centro de inspiração.
Teremos Michael Jackson na Vila (ele é conhecido por colocar MJ em tudo – até em enredo sobre Luiz Gonzaga)? Não sei nem o que responder, não tem nenhum sentido essa relação. Se eu coloquei o Michael Jackson no desfile, foi porque ele estava dentro do enredo. Agora, a necessidade de colocar o Michael Jackson porque eu gosto, as pessoas confundem…
Ainda existe espaço para inovações tecnológicas dentro da avenida? A tecnologia é sempre bem-vinda. O problema é que as escolas de samba não têm lastro financeiro para bancar. Aliás, a gente não usa nem 1% da tecnologia no mundo que poderia usar.
Estamos em uma fase polarizada no país, os desfiles têm sido muito políticos. Sente-se desconfortável de ir na contramão? De maneira nenhuma. Não necessariamente e obrigatoriamente o carnaval tem que falar de alguma coisa com relação a social ou a problemas sociais, não tem nada a ver uma coisa com a outra. A gente escolheu falar de carnaval.
Incomoda ser chamado de carnavalesco apolítico? Olha, estou tão fora da internet, que eu não suporto rede social. Nem sabia que sou chamado de carnavalesco apolítico. E não estou nem um pouco interessado nesse comentário.
Há quem defenda que a história do presidente Lula renda um enredo. Consegue imaginar um enredo do Lula no seu estilo? Meus enredos são imaginados a partir do que é bom para ser visto. Se eu um dia achar que o Lula vai ser um enredo para ser visto, eu o farei. Hoje eu posso te garantir que não tenho enredo nenhum pré-concebido.
Nos últimos dez anos você trocou oito vezes de escola. Por que é difícil permanecer numa mesma agremiação? Depende do patrão, se ele quiser me manter, ele me mantém. É só olhar o futebol, quando o time perde, o treinador é quem não presta. Mas quando o time ganha, o treinador é ótimo. Aliás, é o grande problema do brasileiro, né? A gente torna tudo muito descartável rapidamente.
Você ainda é o carnavalesco a ser batido na avenida? Olha, eu não sei, não convivo nesse meio de discussão, com esse tipo de debate. Eu faço um carnaval para gerar alegria. Se vai me gerar algum tipo de rótulo, isso é consequência. Sei que o meu carnaval é feito para ser lembrado. É isso que eu procuro fazer.