Biógrafo de Roberto Marinho expõe como ‘ele aderiu ao golpe militar’
Doutor em História e Política pelo CPDOC-FGV, Leonencio Nossa fala das nuances do fundador da TV Globo

A partir de uma pesquisa que começou em 2012, e que já rendeu um livro (O poder está no ar: Do nascimento ao jornal nacional), o doutor em História e Política pelo CPDOC-FGV Leonencio Nossa lança o segundo volume da biografia de Roberto Marinho, pela editora Nova Fronteira. Com o título Roberto Marinho: A Globo na Ditadura – Dos Festivais às Bombas no Riocentro, esta edição cobre o período de 1967 a 1981, traçando a história da TV Globo desde sua fundação, durante regime militar, até o atentado no Riocentro, episódio que expôs as tensões internas do governo. Leonencio falou com a coluna GENTE sobre a obra e dividiu algumas curiosidade sobre a vida pessoal de Marinho.
“Esse segundo volume é justamente o período em que a ditadura se torna muito mais violenta, com o AI5 em 1968. Segue até o caso do atentado do Riocentro, que na minha opinião, é onde a ditadura leva um tiro. E é nessa fase que a Globo mais cresce. A ditadura é um momento delicado, não só para a Globo, mas para a sociedade. Marinho adere ao golpe, não diria que ele participa, mas adere. E a coisa é mais ou menos tranquila, do ponto de vista de produção, até 1968, em relação à censura. Quando vêm os anos 1970, tem um boom no mercado mercado publicitário, um país mais urbano, mais público para a TV e a ditadura como complicador do negócio. Ele quer expandir a TV e vai atuar nos bastidores para expandir o sinal, ao mesmo tempo em que tem uma ditadura que quer uma programação específica”.
O autor ainda relata que esse momento antecede a hegemonia da TV Globo nos anos 1980/1990. Na época, a emissora era o quinto maior grupo de mídia no Brasil, sendo o primeiro deles o Diários Associados, fundado por Assis Chateaubriand, pioneiro no negócio televisão com a TV Tupi. “Nas minhas pesquisas, muitas pessoas falavam: ‘foi um homem que se aventurou aos 60 anos e fez uma TV’, ‘um negócio novo’, etc. Tenho dificuldade de ver isso como grande aventura, porque, na época, quando ele era ainda criança, o pai dele já era envolvido com cinematógrafos, onde ele tinha uma produtora de filmes, que faziam documentários de cinema. A TV é uma continuidade dessa visão de fazer jornalismo do grupo do pai. Ele não é pioneiro, mas consolidador. Ele encontrava com uma boa ideia e ia querer desenvolver. Na TV do Roberto Marinho, ele delega poder para o grupo que vai criar de fato, que é o Walter Clark e o Boni. Além de permitir essa absorção de um pessoal, por exemplo, que vinha da rádio”.
Sobre o lado mais pessoal de Roberto Marinho, Leonencio diz que esse período de crescimento da TV Globo não refletiu em felicidade na vida particular do empresário. “Na virada do ano de 1969 para 1970, ele sofre um grande baque, o acidente que mata um dos seus filhos, Paulo Roberto. É uma tragédia que vai repercutir na vida dele e no próprio casamento com Stella Marinho. Nesse período é um homem que se afasta da família e se dedica ao negócio. Depois ele se relaciona com a Ruth, segunda mulher, que também não tinha boa relação com as pessoas próximas a ele. Marinho muda, claro, com a morte o repentina do pai, intoxicado por chumbo, dias depois da criação do jornal O Globo. É ali que ele passa a ser o condutor da família”.