Bruno Luperi, 36 anos, tem mais uma missão e tanto pela frente: trazer aos tempos atuais um clássico da teledramaturgia nacional – Renascer, de seu avô Benedito Ruy Barbosa, original de 1993. As semelhanças recentes com Pantanal, outro remake do mesmo autor e adaptado por ele, são inevitáveis. Em conversa com a coluna, Bruno fala sobre as expectativas para a estreia desta segunda-feira, 22.
Quais são suas apreensões para a novela prestes a estrear? Num trabalho como esse, que desperta tantas memórias em todos, [espero] que as pessoas recebam com muito carinho. É um trabalho muito difícil, mexer num clássico, ainda mais do meu avô e ele, graças a Deus, vivo. Espero que tanto público quanto ele, quanto todo mundo que participou da primeira versão, que foi um sucesso, se sinta homenageado e que a gente honre esse legado deles.
Qual foi a reação dele quando soube que haveria o remake? Ele ficou feliz, satisfeito. Me colocando no lugar dele, não tem recompensa maior que chegar nesse estágio da vida e ver que os frutos que você plantou frutificaram, ali em cima do caminho que ele trilhou.
Se você pudesse fazer um desejo hoje para esse trajeto, essa jornada, qual seria? Paz e sucesso.
É mais difícil fazer Renascer depois do sucesso de Pantanal? Você sente essa pressão? Não. Se você me perguntar qual delas prefiro, tenho como filho, a gente ama todos, não tem distinção. Todo trabalho é como se fosse um filho, me desperta paixões. Um já deu certo e espero que o outro dê também, mas vou fazer o melhor. Cada um é muito específico, tem necessidades específicas.
Quais são as principais diferenças? Pantanal tinha uma característica muito única pelo bioma em que estava inserida, pela dinâmica das águas. Renascer é um novo contexto, Ilhéus, sul da Bahia, todo mundo transformado pelos últimos trinta anos. Isso implica uma outra realidade. Apesar de as duas obras estarem próximas uma da outra cronologicamente, ali na primeira versão e agora, a realidade é muito distinta.
Qual é mais difícil? Renascer precisa de muito mais trabalho, muito mais suor, pesquisa e soluções criativas para a história ser contada como foi concebida.
Tem uma tendência de se buscarem histórias fora do eixo Rio-São Paulo. Renascer, assim como Pantanal, traz isso de uma forma muito intensa. Tenho esse interesse, sou paulistano que vive um caso de amor e ódio com São Paulo. As cidades tendem a ser mais vazias de sentido, de valor, de propriedade afetiva. Quando você vai pro campo, pro mato, pra terra, se reconecta com o cosmos, se reconecta com essa centralidade. É uma coisa que eu busco pessoalmente, não é uma orientação de mercado, são histórias que gosto de contar.
Qual é a lembrança que você traz da primeira versão? São muitas. É engraçado, porque sou quase contemporâneo a Pantanal. Ela surgiu para mim de poucas memórias, mas muito afetivas. É uma sensação sensorial minha relação com o Pantanal original. Mas Renascer não, Renascer tem memórias vivas, foi a primeira novela que vi acontecer. Lembro do meu avô escrevendo, a gente frequentava muito a casa dele. Ele chorando, rindo, se emocionando. Lembro, por exemplo, da morte do Venâncio que me marcou muito. Nunca esqueço do cacau. Na Páscoa, eu e meu irmão pegávamos ovos de chocolate, abríamos na cama e os pisávamos na cama, porque a imagem do Marcos Palmeira pisando no cacau era marcante.
Você tem algum trabalho autoral na gaveta? Tenho muitos. Desde que Velho Chico começou, não tive muito espaço para parar de escrever. Quero contar muitas histórias ainda, quero viver disso, a gaveta está sempre cheia.
Buba é uma personagem emblemática da primeira versão e foi adaptada para o contexto atual. Como se deu isso? É natural, considero que tive a oportunidade de entrar em um jardim que foi plantado há trinta anos. Quais temas evoluíram ou precisam ser revisitados? Quem acompanhar Renascer vai ver que tem muitas mudanças, mas sempre respeitando a premissa original da obra. Buba tem uma nuance da primeira versão de questionar esse espaço do filho de um coronel do cacau. Buba vem para tocar nesse espaço, ela fala coisas que há trinta anos a gente não tinha tão claro. Sobre patriarcado, machismo, esse desejo do homem de querer criar novos homens, filhos varões. A minha ideia de transformar ela numa personagem transgênero é poder amplificar a questão de gênero.
Dizem que é uma novela cara por causa da quantidade de externas. É mesmo? Eu não tenho esse dinheiro, né? Então não sei dizer, eu não pago, é o cheque que eu não assino (risos). Escrevo boa novela, meu departamento é esse, escrevo com carinho. E caro é muito relativo, pelo resultado do retorno. Pantanal foi caro? Não, acho baratíssimo pelo retorno que deu. Ela ocupou espaço afetivo difícil de ser alcançado, fazendo conexões com pessoas de trinta anos atrás e com um público jovem.
Você assiste a novelas? Não consigo assistir muitas novelas. Sou fã do gênero do meu avô, desse Brasil profundo, dessa novela que é um mergulho íntimo. Ela apela muito pouco para o maniqueísmo, carrega em tintas humanas. E o trabalho dele é rico, porque vejo minha família, a maneira como fui criado, os valores que foram passados. Eu vejo meus filhos hoje, o que quero passar para eles? É um trabalho que mexe muito comigo, porque ele tá ali. Ora no personagem A, ora no personagem B, se criticando, se enaltecendo. O autor tem que se despir de tudo e se entregar para o trabalho. Eu tento fazer isso, como ele.