“Haja o que houver, meu marido lançou um lema: ‘sofra eu, mas não sofra a obra’. A obra não pode sofrer. A obra não vai parar. Nada vai deter minha igreja”. A declaração foi feita pela então deputada federal Flordelis durante o velório do marido, o pastor Anderson do Carmo, assassinado aos 42 anos em junho de 2019, com quem era casada desde 1994. O discurso de Flordelis encerra o primeiro episódio da série Flordelis: Questiona ou Adora, produzido pela Boutique Filmes, que chega no dia 4 no Globoplay.
Prestes a ser julgada no próximo dia 7 de novembro, ela é acusada de ser a mandante do crime que tirou a vida de seu marido. Responde por homicídio triplamente qualificado, tentativa de homicídio, uso de documento falso e associação criminosa armada. Também vão a júri popular os filhos Marzy Teixeira da Silva, André Luiz de Oliveira e Simone dos Santos Rodrigues e a neta Rayane dos Santos Oliveira. Por anos, Flordelis foi reverenciada por programas televisivos e artistas como benfeitora dos mais necessitados – não só abrigava em sua casa, como adotava crianças e adolescentes em situação de vulnerabilidade. Chegou a 55 filhos – sendo três biológicos do primeiro casamento. Fez disso sua bandeira. Mas foi na igreja evangélica que conseguiu visibilidade que a levaria ao Congresso Nacional.
Logo nas primeiras cenas, a pastora-deputada surge sorridente sendo entrevistada por Cissa Guimarães, no programa de Fernanda Lima e no de Ana Maria Braga. Ela circulava diante das câmeras com a mesma desenvoltura que pregava nos cultos evangélicos. Quando a notícia do bárbaro crime chega à imprensa, vários políticos lhe dão apoio – Flávio e Eduardo Bolsonaro, Joice Hasselmann, Flávia Arruda, o então governador do Rio Wilson Witzel, assim como o pastor Silas Malafaia. Rodrigo Maia, Jandira Feghali e Maria do Rosário também se solidarizam.
Com roteiro e direção de Mariana Jaspe e produção de Gustavo Mello, a série de seis episódios será disponibilizada aos assinantes do streaming – sendo dois episódios por semana. O primeiro deles narra a vida da então deputada momentos antes do assassinato, além de fazer um levantamento da origem do seu marido. Cenas caseiras, muitas delas registros de redes sociais, ajudam a dar a tônica de “família feliz”. O que mais chama a atenção é como Flordelis conseguiu atrair a mídia e lideranças políticas para sua figura – carismática e mascarada pela benfeitoria.
Segundo Mariana, para além do mergulho na investigação do assassinato de Anderson Carmo, a série trata dos meandros dessa família. “Como tudo isso começou? Como essa família se formou? De onde essas pessoas vêm? São perguntas que tentamos responder ao longo dos episódios”, diz a diretora. “Nosso desafio foi montar esse quebra-cabeça de maneira humana e respeitosa,”, continua Gustavo. A pesquisa para a obra foi realizada em parceria com O Globo. Carolina Heringer foi uma das profissionais envolvidas, em parceria com Thiago Prado. “Busquei, desde a época do crime, fazer uma apuração desse caso paralela à da polícia, para entender os meandros da família”, diz Carolina.
Flordelis: Questiona ou Adora é mais uma produção que tenta saciar o feroz consumo de true crime, gênero de não-ficção que passou a dominar podcasts e produtos audiovisuais, onde se examina um crime e detalha as ações de pessoas reais. Enquanto a Justiça ainda decide o que fazer com Flordelis, o telespectador revisita seu passado e vasculha seus rastros. “A obra não vai parar”.