Relâmpago: Digital Completo a partir R$ 5,99
Imagem Blog

VEJA Música

Por Sérgio Martins Materia seguir SEGUIR Seguindo Materia SEGUINDO
Música sem preconceito: de Beethoven a Pablo do arrocha, de Elis Regina a Slayer

João e a música que une gerações

Como a música do pai da bossa nova estreitou as minhas relações com meu pai e meu filho - que continuam firmes e fortes, sempre ao som do seu violão

Por Sérgio Martins Materia seguir SEGUIR Materia seguir SEGUINDO Atualizado em 8 jul 2019, 17h48 - Publicado em 8 jul 2019, 17h47

Quando meu pequeno Noel era realmente pequeno (hoje está com dezenove anos e é mais alto que eu), havia duas canções de João Gilberto que o deixavam em estado de graça. A primeira era Pra que Discutir com Madame, de Janet de Almeida e Haroldo Barbosa, que eu entoava para ele se sacudir em sua cadeira de bebê. A outra era Valsa (Como São Bonitos os Youguis) (Bebel). Lembro claramente da dança –improvisada, claro – que fazia com a mãe logo após escutar as primeiras notas do violão de João. O pai da bossa nova, morto no sábado aos 88 anos, também foi responsável pela reconexão com meu pai. Durante uma reunião de família que se prolongou mais do que o devido, fomos à varanda do clube onde estava ocorrendo a festa e passamos a discorrer sobre nossas preferências musicais. Ele me falou como amava a versão de Orlando Silva para Aos Pés da Santa Cruz, de Marino Pinto e Zé da Zilda. Canção que eu tinha escutado um dia antes do folguedo durante uma apresentação de João. Como não poderia deixar de ser, a nossa noite terminou com um dueto, no qual ele tentava recriar o vozeirão de Silva e eu me esforçava em replicar a versão delicada de Gilberto – uma parceria atrapalhada em termos de afinação, mas uma sintonia única de almas.

 

https://www.youtube.com/watch?v=tKjtL1jn0-c

 

 

Continua após a publicidade

 

Há várias maneiras de se homenagear João Gilberto e falar da sua inestimável contribuição à música. Eu mesmo fiz um texto dois anos atrás para acompanhar uma reportagem (ótima, diga-se) a respeito das pendengas judiciais em torno de seu nome – e que pode ser lida aqui (https://beta-develop.veja.abril.com.br/revista-veja/alem-da-lenda/) Preferi, aqui, comentar sobre como sua voz e seu violão conseguem unir três gerações da mesma família. Porque, afinal, não foi esse o seu legado para a música? João Gilberto criou uma nova maneira de cantar e uma batida de violão e um dos repertórios mais ricos do universo musical. Que podia ser composto de standards de jazz, da música latina ou italiana – como se pode notar em Amoroso, álbum de 1977 – e por sambas de outrora que resgatava e recriava à sua maneira. Foi também um homem do seu tempo. Gravou o suprassumo da bossa nova, mas soube saudar os tropicalistas – sua versão de Sampa, de Caetano Veloso, é lindíssima – e até o nefasto Lobão ganhou uma releitura criativa de Me Chama. João foi ainda o responsável pela adesão dos Novos Baianos à MPB. Marília, ex-mulher de Paulinho Boca de Cantor, narra uma ida do violonista à cobertura na qual moravam no bairro de Botafogo. Desfilou um repertório de sambas e ao perceber que o grupo não o acompanhava, sentenciou: “Vocês precisam olhar dentro de vocês.” O resultado imediato desse encontro foi Acabou Chorare, um dos álbuns mais bonitos da história da MPB, no qual o grupo aliou sua verve roqueira ao samba e ao choro. O encontro também o afetou, como se pode notar no seu disco de 1973.

Continua após a publicidade

 

João Gilberto tinha fama de reclamão e seus shows eram caóticos? Não foi o que eu vi e ouvi. Assisti à duas performances, ambas no Tom Brasil (São Paulo). Sim, deu uma bronca aqui e ali, mas nada que tirasse o clima da apresentação. Cantou por mais de duas horas e até fez um contorcionismo extra durante Ligia, de Tom Jobim. O microfone caiu e João abaixou a cabeça para que esse problema técnico não atrapalhasse a beleza da sua interpretação. E atendeu a pedidos da plateia – fui um dos eleitos ao solicitar que cantasse Izaura, de Roberto Roberti e Herivelto Martins. Quanto a meu pai e Noel… Bem, seo Osvaldo gosta de João Gilberto cantando Aos Pés da Santa Cruz, mas ainda acha que Orlando Silva foi o melhor cantor que escutou. Noel, entre um rock e outro (além da música de Hermeto Paschoal) está no processo de estudo de Getz/Gilberto, de 1964. Obrigado, João.

https://www.youtube.com/watch?v=hOBCa9vG9rE

Publicidade

Matéria exclusiva para assinantes. Faça seu login

Este usuário não possui direito de acesso neste conteúdo. Para mudar de conta, faça seu login

Digital Completo

Acesso ilimitado ao site, edições digitais e acervo de todos os títulos Abril nos apps*
Apenas 5,99/mês
DIA DAS MÃES

Revista em Casa + Digital Completo

Receba 4 revistas de Veja no mês, além de todos os benefícios do plano Digital Completo (cada revista sai por menos de R$ 9)
A partir de 35,90/mês

*Acesso ilimitado ao site e edições digitais de todos os títulos Abril, ao acervo completo de Veja e Quatro Rodas e todas as edições dos últimos 7 anos de Claudia, Superinteressante, VC S/A, Você RH e Veja Saúde, incluindo edições especiais e históricas no app.
Pagamento único anual de R$71,88, equivalente a R$ 5,99/mês.

PARABÉNS! Você já pode ler essa matéria grátis.
Fechar

Não vá embora sem ler essa matéria!
Assista um anúncio e leia grátis
CLIQUE AQUI.