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Walcyr Carrasco

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Relações instantâneas

Nas uniões de hoje, a expressão “para sempre” caiu em desuso

Por Walcyr Carrasco Materia seguir SEGUIR Materia seguir SEGUINDO 23 jun 2024, 08h00

Gosto muito da origem e evolução das palavras. Até algum tempo atrás, pedir alguém em namoro significava pelo menos uma intenção de ter um compromisso que se entendia como noivado e casamento. Só que noivado e casamento nem são mais compromissos! Outro dia, falando com uma amiga, ela comentou: “Já dei umas namoradas com ele”. Quer dizer que se agarram de vez em vez e ficam, sem nenhuma promessa de porvir. “Ficar” quer dizer sexo ou, no mínimo, alguns amassos gloriosos. Pronto. Já se foi o tempo em que alguns amigos ou conhecidos de mau gosto falavam “vou botar as algemas”, antes de entrar na igreja para um casório tradicional. Simples: não existe mais casório tradicional — embora, é claro, haja a cerimônia na igreja etc. etc. (para alguns). Mas perdeu o sentido de permanência. Encontro uma amiga e ela me diz: “Estou casada”. Não mais “sou”, mas “estou”. Esse estado de amor flutuante pode corresponder a várias relações de antigamente: noivado, namoro, à amizade colorida e, ultimamente, à amizade com benefícios, que é fácil de imaginar o que seja. Ou seja, há uma série de situações do passado. Mas “estar casada” e definições semelhantes não correspondem a um voto específico. Até mesmo o fora de moda “somos apenas bons amigos”, um disfarce no passado, pode ser um bom rótulo para quem vive noites frenéticas sem a intenção de vínculo. De tantos significados possíveis, palavras que envolvem amores já pouco significam. Talvez a mais efetiva para dizer alguma coisa seja “trisal”. Pelo menos não se tem dúvida do que está acontecendo.

“No passado, pedir alguém em namoro era compromisso. Só que noivado e casamento não são mais permanentes”

Palavras não me assustam, mas já estou repensando certos critérios financeiros. Um amigo já “casou” tantas vezes, com montagem de casa, viagem de lua de mel e tudo mais, que os presentes abriram um buraco na minha poupança. Não é pão-durismo, mas economia prática. É lamentável abrir uma verba mensal para presentes de casamento — sempre para a mesma pessoa. Resolvi simplificar. Um vidrinho de água benta traz boas energias e custa muitíssimo menos do que um faqueiro (ninguém pode criticar quem traz água benta, pode?).

Quem casa também já não se contenta mais com bodas de papel, de prata e de ouro, como no passado. Existem também os votos de renovação, nos quais se faz nova festa. Mas esses são os que permanecem. Eu fico pensando: por que as relações hoje são tão mais rápidas? Eu acho que é uma questão de empenho pessoal. Parece que é mais fácil separar-se do que refletir sobre soluções, sobre entrega íntima. Mas quem sou eu para definir algo assim? Um erro muito comum é falar sobre a felicidade dos outros. Prefiro deixar cada um viver do seu jeito. As pessoas são muito diferentes, mudam demais e o pior que pode existir é julgá-las. Porque, nesse caso, também teria de se aceitar o julgamento alheio, e minha auréola de anjo já enferrujou há muito tempo. Eu não uso mais “para sempre”. Prefiro algo mais instantâneo, como “vamos viver, ser felizes” — com os olhos abertos para o inesperado.

Publicado em VEJA de 21 de junho de 2024, edição nº 2898

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