O nome naked dress, ou vestido nu, não é à toa. Quem olha de relance para essas ousadas peças de roupa pode pensar que a modelo, de fato, não está vestindo nada. Na semana passada, a grife do estilista francês Jean Paul Gaultier causou frisson ao apresentar uma coleção em parceria com a influenciadora Lotta Volkova. Os vestidos, disponíveis em versões para pele branca e negra, são desenhados com uma técnica artística conhecida como trompe l’oeil para causar uma ilusão de óptica. A ideia: dar a impressão de não haver nada, a não ser carne e osso, como se veio ao mundo. E, aparentemente, dado o sucesso, andar por aí pelado, só que não, está em alta — e crescendo em interesse.
O longo desenhado por Gaultier, estrela da coleção, entrou em terceiro lugar no último relatório da The Lyst Index, plataforma que avalia o mercado e divulga a popularidade de grifes e produtos. O naked dress do renomado estilista ficou atrás apenas de uma bolsa da Diesel e do tênis feito pela Gucci em parceria com a Adidas. Vendido por 590 euros, está esgotado, assim como as outras peças da série, que inclui biquínis e camisas. As pesquisas no Google por peças “nuas”, com as partes íntimas simuladas, aumentaram 430% nos últimos três meses.
Cabe lembrar que a moda é território infinito da máxima de Lavoisier (1743-1794): “Nada se cria, tudo de transforma”. A transparência dos tecidos, prima-irmã do que brotou agora, está em eterno vaivém. No fim da década de 50, a atriz e cantora alemã Marlene Dietrich chocou a sociedade ao aparecer em performances no estilo cabaré em teatros de Las Vegas usando um modelo que dava a ilusão de transparência. O corte, assinado por Jean Louis, inspirou um dos vestidos mais famosos da história: o look, também do estilista francês, usado por Marilyn Monroe em 1962 na celebração de aniversário do então presidente dos Estados Unidos, John Kennedy. E não deu outra: agora em 2022, a socialite Kim Kardashian usou o mesmo vestido no Met Gala, tradicional evento de moda realizado em Nova York. Anote-se que a própria criação de Gaultier não é exatamente novidade. Uma versão do naked dress foi exibida nas passarelas para a temporada outono/inverno de 2014, há quase uma década. E mais: a atual versão bebe de outra coleção, ainda mais antiga, de 1996.
Na Semana de Moda de Paris, ficou claro que a nova velha ideia pegou tração e fisgou o universo da alta-costura. Grifes como Schiaparelli e Balmain apresentaram coleções com tecidos que se ajustam ao corpo ou que reproduzem as formas femininas. Fora das passarelas, celebridades desfilam criações de alguns dos maiores nomes da moda. A socialite Kendall Jenner — também no Met Gala — usou um vestido da Givenchy inspirado em um modelo que Audrey Hepburn vestiu em My Fair Lady, mas totalmente transparente e ainda mais sexy. Megan Fox foi no mesmo caminho. A cantora Anitta (e quem mais seria?) foi outra a ostentar panos fingindo estar pelada. É movimento interessante, pode ser visto como gesto de ousadia e coragem, e inevitavelmente magnetiza quem está ao redor, por motivos óbvios. Mas tem um quê de marketing, muito barulho por nada na era dos nudes. Talvez falte transparência a quem se veste para fingir flanar pelo mundo habitado pela nudez. É onda que vai passar, até que renasça.
Publicado em VEJA de 24 de agosto de 2022, edição nº 2803