“Conhecem o quadro As Meninas, com a infanta Margarita rodeada de empregados? É a Choupette”, disse Karl Lagerfeld, certa vez, em uma entrevista. “É assim que a vejo, como uma infanta, cercada de atenções. É um ser muito especial”, completou. A menina retratada na pintura do espanhol Diego Velázquez (1599-1660) é a princesa Margarita Teresa, filha do rei Filipe IV, da Espanha. Já a menina dos olhos do estilista alemão, a quem ele se referiu, é Choupette Lagerfeld, sua gata de estimação. O kaiser da moda morreu em 2019 e, desde então, o felino tornou-se o primeiro e único bichano milionário do mundo. Sua fortuna é estimada em 460 milhões de reais. Cerca de 21 milhões de reais foram doados ainda em vida pelo estilista à Françoise Caçote, a babá preferida de Choupette, com a condição de que o dinheiro fosse usado somente para as despesas do animal. O restante da dinheirama é fruto das aparições e campanhas publicitárias protagonizadas pela gata. Deste mês até março de 2022, Choupette voltará aos holofotes. Durante esses meses, a casa de leilões Sotheby’s colocará à venda 1 000 itens que pertenceram ao estilista, desde suas luvas de couro sem dedos até móveis e obras de arte. Entre as peças, estão também objetos do felino, como suas almofadas. A escultura em homenagem a ela, feita pela artista plástica portuguesa Joana Vasconcelos, estava entre os artigos, mas já foi arrematada por mais de 20 000 euros.
A gata, da raça birmanês, entrou por acaso na vida de Lagerfeld. Nascida em 2011, ela pertencia ao modelo Baptiste Giabiconi. Um dia, ele deixou o bichano, ainda filhote, aos cuidados do estilista porque se ausentaria a trabalho. O alemão a aceitou a contragosto. A custódia seria de duas semanas, mas Choupette nunca mais saiu do colo de Lagerfeld. Foi amor à primeira vista, como ele definiu o sentimento pelo animal.
E então ela virou o centro do mundo do kaiser. Ela ganhou um kit de potes para alimentação criado pela Goyard, grife conhecida pela excelência em bolsas e baús, tem prato favorito, o croquette da Choupette (sardinha, azeitonas verdes, cenoura, germe de trigo e tomilho) e come sempre à mesa, jamais no chão. O cardápio é assinado pelos chefs dos restaurantes Kinugawa, Le Voltaire e Maison du Caviar, de Paris. Os cuidados diários ficam a cargo de duas babás — Marjorie e Françoise. O time que gerencia a carreira da gata inclui um gerente para suas redes sociais — Instagram e Twitter —, onde soma mais de 300 000 seguidores, e seu agente Lucas Bérullier, da My Pet Agency.
Lagerfeld transformou Choupette em ícone fashion. Na Chanel, foi homenageada com um tom de azul batizado com seu nome. Por exigência sua, o bichano apareceu em capas de revistas de moda dividindo as atenções com modelos como Gisele Bündchen. Em 2015, o felino protagonizou a campanha publicitária da fabricante de automóveis Opel, antes estreladas por tops como Christy Turlington, Kate Moss e Naomi Campbell, as musas das passarelas dos anos 1990. Para a gata branca, a vida é rosa. Em agosto, quando completou dez anos de vida, ela ganhou festa no Hotel de Crillon, construção histórica localizada na Praça da Concórdia, em Paris. O endereço é para pouquíssimos, Choupette entre eles. Miau!
Publicado em VEJA de 15 de dezembro de 2021, edição nº 2768