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Alice Fromer, sobre shows com Titãs: “É quase como ter meu pai de volta”

Filha do guitarrista morto em 2001 virou cantora para homenageá-lo na turnê da banda

Por Felipe Branco Cruz Materia seguir SEGUIR Materia seguir SEGUINDO Atualizado em 4 jun 2024, 10h12 - Publicado em 15 jul 2023, 08h00

No final de junho, quando subi ao palco no estádio Allianz Parque, em São Paulo, para cantar com os Titãs em três shows históricos que reuniram 150 000 pessoas, confesso que morri de ansiedade. Aquele era o ápice das 22 apresentações da turnê Encontro, que reuniu os sete integrantes clássicos: Arnaldo Antunes, Branco Mello, Charles Gavin, Nando Reis, Paulo Miklos, Sérgio Britto e Tony Bellotto. Eu estava ali para representar meu pai, o guitarrista e compositor Marcelo Fromer, que morreu há 22 anos, quando eu tinha apenas 7. Meu pai sempre foi muito presente e brincalhão. Ele me dizia que eu havia nascido da barriga dele e mostrava a cicatriz de uma cirurgia de pedra nos rins para provar. Minha mãe achava graça e concordava, dizendo que só meu irmão havia nascido dela. De fato, herdei dele o interesse pela música. Mas nunca havia pensado em ser cantora profissional. Trabalho como pedagoga com crianças que possuem alguma questão intelectual ou socioemocional. Acho que herdei dele também o gosto por lidar com as crianças. Ele gostava muito de ser pai e o jeito dele comigo era muito especial. Uma das recordações mais fortes que tenho era dos passeios gastronômicos. Ele entendia muito de culinária e me apresentou comidas novas e até exóticas para uma criança. Tenho uma memória afetiva muito forte dele me ensinando a identificar os cheiros das ervas e dos temperos, e até o cheiro dos vinhos.

O convite para participar da turnê Encontro veio em um telefonema do Tony, que me contou que eles queriam homenagear meu pai. Aceitei na hora — com medo, mas aceitei. Eu sabia que os Titãs eram uma banda conhecida em todo o Brasil, mas não tinha ideia da proporção que a turnê iria tomar. Acho que nem eles sabiam. Nos shows, comecei cantando Não Vou Me Adaptar, do Arnaldo Antunes, e Toda Cor, composição do meu pai, Ciro Pessoa e Carlos Barmak. Nas últimas apresentações, também passei a cantar Ovelha Negra, em homenagem a Rita Lee. Ao todo, já nos apresentamos para mais de 600 000 pessoas em todo o Brasil, e em breve embarcaremos para mais shows na Euro­pa e nos Estados Unidos. Com o sucesso da turnê, anunciamos também novos shows em mais cidades e o retorno para uma apresentação final, em dezembro, em São Paulo.

Uma das coisas de que mais gostei foi a oportunidade de me aproximar dos amigos do meu pai. Foram momentos intimistas superimportantes para mim. As brincadeiras no camarim, no avião, no ônibus e nos ensaios deram o real sentido para a palavra “encontro” e nos fizeram criar laços cada vez mais estreitos. Eu amava os momentos em que eles contavam das palhaçadas que meu pai fazia, sempre tirando sarro um com o outro.

O luto é um processo muito longo e, às vezes, a gente não sabe muito bem como conduzir. Foi importante estar com eles para tapar certos buracos. Descobri novas ferramentas para lidar com a falta do meu pai. É quase como ter meu pai de volta. Como se cada um dos integrantes dos Titãs fosse um pedacinho dele — e ter todos juntos ali foi um bocado significativo. Quando era mais nova, ficava triste em ver as crianças da minha idade com seus pais. Confesso que tinha uma certa inveja de quem tinha os pais presentes, porque eu sabia que, se ele fosse vivo, estaria comigo. Até hoje, por exemplo, vejo os filhos dos outros Titãs e penso que poderia ser eu ali também. Tenho uma relação ótima com eles e é uma sensação boa, mas, no fundo, eu também queria passar por isso. Ainda não sei se quero ser cantora profissional. Escrevi alguns poemas que um amigo musicou, mas ainda não sei o que fazer no futuro. Estar no palco, no entanto, foi uma das experiências mais incríveis que tive na vida, e isso me fascina.

Alice Fromer em depoimento dado a Felipe Branco Cruz

Publicado em VEJA de 19 de julho de 2023, edição nº 2850

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