Black Friday: Assine a partir de 1,49/semana
Continua após publicidade

De Austen a Flaubert, os clássicos essenciais sobre amadurecimento humano

Um belo livro celebra as obras que revolucionaram a literatura ao narrar as dores da formação por meio de heróis que ainda hoje emocionam

Por Eduardo Wolf
Atualizado em 4 jun 2024, 15h06 - Publicado em 3 abr 2020, 06h00

Quando o alemão Johan Wolfgang von Goethe publicou Os Anos de Aprendizado de Wilhelm Meister, em 1795, a literatura não ganhou apenas um grande romance. Ela se transformou irremediavelmente. Desde os poemas épicos da Antiguidade, os heróis da narrativa do Ocidente sempre foram adultos — Aquiles, Ulisses, Enéas parecem todos ir pelo meio da existência. Com Wilhelm Meister, Goethe traz à cena um jovem buscando seus caminhos na vida, enfrentando as durezas e as delícias das escolhas e das oportunidades. Em suma, um jovem em formação. Nascia, assim, o Bild­ungsroman, expressão germânica que se popularizou nos meios literários e que significa “romance de formação”. Não é uma façanha pequena: outro tipo de herói ingressava na corrente literária, um personagem para quem a vida era uma exploração incerta do mundo social burguês. Era o herói por excelência da modernidade.

GOETHE.jpg
OS ANOS DE APRENDIZADO DE WILHELM MEISTER (1795) – O livro: fundadora do “romance de formação”, a obra do alemão Johan W. von Goethe (1749-1832) trata da jornada de amadurecimento do jovem Meister Por que ler: atinge a perfeição artística ao falar do conflito entre as necessidades do amadurecimento social, de um lado, e os clamores por uma vida livre, de outro (Roger Viollet/AFP)

O Romance de Formação, do teórico italiano Franco Moretti, publicado originalmente em 1987 e agora no país, é mais que um abrangente estudo sobre esse gênero romanesco. Trata-se de uma obra-prima da teoria literária. De Goethe a Thomas Mann, passando por Jane Austen, Stendhal, Honoré de Balzac, Gustave Flaubert, Charles Dickens e George Eliot, o estudo de Moretti analisa o gênero que legou personagens como Elizabeth Bennet, de Orgulho e Preconceito, e Frédéric Moreau, de A Educação Sentimental. Com erudição, rigor e escrita fluente, Moretti compõe um vasto quadro da experiência histórica de um período que se estende de meados do século XVIII à primeira metade do século XX e coincide com as expansões do capitalismo moderno. Trata-se de um mundo de transformações intensas, velozes e imprevisíveis, que trazem demandas psicológicas e sociais frenéticas.

GUSTAVE-FLAUBERT-(1).jpg
A EDUCAÇÃO SENTIMENTAL (1869) – O livro: o francês Gustave Flaubert (1821-1880) faz da história do protagonista, Frédéric Moreau, a história de toda a sua geração, cujos grandes ideais românticos se chocam com a realidade da vida burguesa Por que ler: o último grande “romance de formação”, já revela a impossibilidade do amadurecimento feliz — é inevitável a vitória do conformismo cínico, mas confortável (Stefano Bianchetti/CORBIS/Getty Images)

+ Compre o livro O Romance de Formação, de Franco Moretti
+ Compre o livro Orgulho e Preconceito, de Jane Austen

Continua após a publicidade

É assim para Wilhelm, o herói de Goethe que se recusa a fazer o que todos os jovens tinham feito até então. Até ali, a passagem da juventude à vida adulta era a repetição das gerações anteriores: assumir os negócios da família, seguir determinações do pai, atender a expectativas convencionais. Wilhelm, porém, dedica-se ao amor à arte, ao teatro; entrega-se apaixonadamente a Shakespeare e a uma vida que rechaça todos os convencionalismos de sua classe abastada. Não por uma dissipação, mas para educar-se nos caminhos da vida e das emoções humanas. “Lembre-se de viver!” será como que um lema.

O-ROMANCE-DE-FORMACAO.jpg
O ROMANCE DE FORMAÇÃO, de Franco Moretti (tradução de Natasha Belfort Palmeira; Todavia; 416 páginas; 74,90 reais e 35,92 reais na versão digital) (./.)

O que os clássicos da educação para a vida do jovem burguês apresentam não é uma revolta sob a forma do desregramento. O que se descortina, para todos esses personagens, é a grande abertura do mundo, tanto interior e subjetivo quanto externo e objetivo: ao contrário do que ocorria antes, a dedicação ao trabalho, à vida social e à vida familiar não é um movimento harmônico. Ela cobra seu preço sobre a liberdade individual. Os personagens do romance de formação buscam a plena realização, e ao menos em alguns casos o casamento desponta como final feliz, coroando o amadurecimento. É o que se vê na trajetória de Elizabeth Bennet, em Orgulho e Preconceito (1813), de Jane Austen. Muito além da sempre cativante história de amor, o processo de educação das emoções e da inteligência de Elizabeth assinala a abertura para a felicidade possível. Não há sonhos deixados para trás ao se tornar uma mulher madura, ao abraçar o amor, o casamento e o pertencimento social.

+ Compre o livro Os Anos de Aprendizado de Wilhelm Meister

Continua após a publicidade

+ Compre o livro A Educação Sentimental

Com argúcia, Moretti mostra como essa disposição para o equilíbrio entre o ideal de autodeterminação e as exigências da socialização ocorreu no romance alemão e inglês — mas não no francês. No caminho de Goethe e Austen, afinal, não havia uma revolução e sua guilhotina, com toda a cisão social e política que ambas implicavam na França de Stendhal e Balzac. Stendhal concentra seu espetacular O Vermelho e o Negro (1830) nas consequências fatais da impossibilidade de realização para seu protagonista, Julien Sorel. E é nesse espírito que Balzac registrará a decepção desse tipo de personagem. Em As Ilusões Perdidas (1837), seu protagonista, Lucien Chardon, é o típico provinciano sedento do triunfo na capital parisiense — e acaba por descobrir que tudo era ilusório. Apropriadamente, o fim do grande romance de formação foi francês. Quando Flaubert afirmou que queria escrever “a história moral dos homens de sua geração”, referia-se àqueles que, como ele, nutriram os ideais do romantismo. O herói de A Educação Sentimental, Frédéric Moreau, condensa esses valores, da paixão por uma mulher inacessível às ambições políticas. Contudo, não há mais amadurecimento possível, e o peso das palavras finais de Moreau, encontrando em um banal episódio de juventude “o melhor que fomos”, corta friamente a carne ainda hoje. Para deleite dos leitores, esses personagens se conservam eternamente jovens.

Publicado em VEJA de 8 de abril de 2020, edição nº 2681

Continua após a publicidade

CLIQUE NAS IMAGENS ABAIXO PARA COMPRAR

De Austen a Flaubert, os clássicos essenciais sobre amadurecimento humanoDe Austen a Flaubert, os clássicos essenciais sobre amadurecimento humano
O Romance de Formação, de Franco Moretti
Continua após a publicidade
De Austen a Flaubert, os clássicos essenciais sobre amadurecimento humanoDe Austen a Flaubert, os clássicos essenciais sobre amadurecimento humano
Orgulho e Preconceito, de Jane Austen
De Austen a Flaubert, os clássicos essenciais sobre amadurecimento humanoDe Austen a Flaubert, os clássicos essenciais sobre amadurecimento humano
Os Anos de Aprendizado de Wilhelm Meister
Continua após a publicidade
De Austen a Flaubert, os clássicos essenciais sobre amadurecimento humanoDe Austen a Flaubert, os clássicos essenciais sobre amadurecimento humano
A Educação Sentimental
logo-veja-amazon-loja

*A Editora Abril tem uma parceria com a Amazon, em que recebe uma porcentagem das vendas feitas por meio de seus sites. Isso não altera, de forma alguma, a avaliação realizada pela VEJA sobre os produtos ou serviços em questão, os quais os preços e estoque referem-se ao momento da publicação deste conteúdo.

Publicidade

Matéria exclusiva para assinantes. Faça seu login

Este usuário não possui direito de acesso neste conteúdo. Para mudar de conta, faça seu login

Black Friday

A melhor notícia da Black Friday

BLACK
FRIDAY

MELHOR
OFERTA

Digital Completo

Acesso ilimitado ao site, edições digitais e acervo de todos os títulos Abril nos apps*

a partir de 5,99/mês*

ou
BLACK
FRIDAY
Impressa + Digital
Impressa + Digital

Receba 4 Revistas no mês e tenha toda semana uma nova edição na sua casa (menos de R$10 por revista)

a partir de 39,96/mês

ou

*Acesso ilimitado ao site e edições digitais de todos os títulos Abril, ao acervo completo de Veja e Quatro Rodas e todas as edições dos últimos 7 anos de Claudia, Superinteressante, VC S/A, Você RH e Veja Saúde, incluindo edições especiais e históricas no app.
*Pagamento único anual de R$71,88, equivalente a 5,99/mês.

PARABÉNS! Você já pode ler essa matéria grátis.
Fechar

Não vá embora sem ler essa matéria!
Assista um anúncio e leia grátis
CLIQUE AQUI.