Até muito recentemente, eram dois clubes ostensivamente separados — o das “luluzinhas” e o dos “bolinhas”, e não haveria como aproximá-los. Para elas, saias e salto alto, em tons vibrantes. Para eles, camisas e blazers, sempre discretos. As fronteiras, porém, começaram a ser abertas com a aparição de ídolos jovens, como o cantor britânico Harry Styles e o rapper americano A$AP Rocky, colados a um modo de vestir, digamos, até então sobejamente feminino. E então as placas tectônicas começaram a se mexer — tanto e tão ruidosamente que aceleraram um novo fenômeno, o da maquiagem masculina.
Nos últimos meses, uma seleção de produtos pensada para atrair os homens despontou nas lojas eletrônicas. São corretivos, bases para a face, protetores para os lábios e géis de barba e sobrancelha. Tudo quase sempre em embalagens de cores sóbrias e design minimalista. Não se trata, naturalmente, de replicar o aspecto vibrante popularizado pelas drag queens, e sim de conquistar uma aparência natural, com cobertura das imperfeições do rosto. “Eles querem a pele corrigida, mas não gostam de parecer que usaram maquiagem”, diz o celebrado maquiador Rodrigo Costa, de São Paulo. “A naturalidade é essencial.” Para ajudar os iniciantes, brotam na internet tutoriais didáticos sobre o que fazer e como. Há evidente interesse. Estima-se que o mercado global de produtos afeitos aos cuidados da pele tenha chegado, em 2020, a 145 bilhões de dólares — e o universo masculino respondeu por 45 bilhões de dólares desse montante. É bastante. Uma pesquisa da empresa de inteligência de dados americana Morning Consult mostrou que um em cada quatro homens está disposto a incluir a maquiagem em seu cotidiano.
Dá-se, realmente, o encontro de mundos avessos. Uma das pioneiras foi a francesa Chanel, eterno ícone feminino, com uma linha de cosméticos de olho neles. A americana Tribe Cosmetics lançou um hidratante pré-maquiagem. A britânica Shakeup pôs nas prateleiras virtuais um bálsamo labial. A multinacional Avon e a brasileira Simple Organic apostaram em produtos sem distinção de gêneros. “Os homens já representam 40% das vendas dos nossos corretivos, mas para conquistá-los é preciso oferecer praticidade e multifunções”, diz Patricia Lima, CEO da Simple Organic. Por favor, sem brigas no banheiro porque uma (ou um) usou o produto do outro.
Publicado em VEJA de 31 de março de 2021, edição nº 2731