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No isolamento, o pôquer on-line é um dos jogos virtuais que mais crescem

A modalidade atrai 10 milhões de novos praticantes que sonham com milhões de dólares

Por Amauri Segalla
Atualizado em 4 jun 2024, 14h31 - Publicado em 22 Maio 2020, 06h00
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  • A pandemia que representou uma grande e catastrófica onda de azar para a humanidade materializou-se na forma de um golpe de sorte para Alex de Sousa Brito. No início de março, o gerente comercial e a mulher estavam desempregados, sem perspectiva de recolocação e preocupados com o futuro dos filhos de 9 e 5 anos. Jogador amador de pôquer e trancado em casa na cidade de Osasco, em São Paulo, por causa do isolamento social, Brito resolveu disputar o Sunday Million, torneio promovido pelo PokerStars, o maior site de pôquer on-line do mundo, que distribuiria 18,6 milhões de dólares em prêmios na edição entre os dias 22 e 24 de março. Como não tinha os 215 dólares exigidos na inscrição, ele foi obrigado a participar de concorridas classificatórias. Venceu essas etapas e ganhou o direito de ingressar na fase final. “E aí o milagre aconteceu”, conta Brito. “Ganhei o campeonato.” Não foi uma vitória qualquer. Depois de jogar durante três dias consecutivos, em jornadas ininterruptas de doze horas e aproximadamente 20 000 mãos, o brasileiro superou 93 000 jogadores — dos quais 17 000 eram profissionais — para embolsar 1,19 milhão de dólares, um dos maiores prêmios da história do circuito.

    A fantástica conquista exemplifica como a crise do coronavírus levou novos jogadores a se arriscar nas mesas virtuais. “Sem a pandemia, eu provavelmente estaria trabalhando em um escritório”, diz Brito. De fato, os números mostram que a Covid-19 movimentou esse tipo de jogatina no mundo inteiro. Segundo a consultoria Poker Industry Pro, que monitora o tráfego desse negócio mundialmente, o total de mesas digitais cresceu 150% desde janeiro. Estima-se que 10 milhões de pessoas começaram a arriscar a sorte on-line durante a pandemia, juntando-se a um contingente de 150 milhões de praticantes. No PokerStars, o volume de jogadores aumentou 50% desde fevereiro. Outro conhecido site de apostas, o Bodog detectou um crescimento de 30% no tráfego de suas páginas nos últimos três meses, período marcado pelo avanço da pandemia do coronavírus.

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    Diversas razões explicam o fenômeno. Em entrevista à TV americana, Matt Primeaux, presidente da PokerStars, empresa de capital aberto que no ano passado faturou 821 milhões de dólares, afirmou que as pessoas migraram para o jogo on-line porque não podem sair de casa neste momento para encontrar amigos em sessões semanais de pôquer, hábito bastante difundido nos Estados Unidos. Outros jogadores estão simplesmente tentando apimentar longas estadas dentro de casa. Há um terceiro grupo, este mais suscetível a sofrer os efeitos negativos do jogo, que tenta ganhar algum trocado nas disputas digitais, mesmo sem ter experiência. A última classe de adeptos é a mais restrita, a de jogadores profissionais que não podem frequentar cassinos, já que quase todas as casas de apostas estão fechadas. Torneios de renome como World Poker Tour e World Series of Poker tiveram de se render ao on-line após o cancelamento de eventos ao vivo. Para os profissionais confinados em casa, a única saída passou a ser a internet.

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    RECORDE – O brasileiro Brito: prêmio de 1,19 milhão de dólares em torneio com 93 000 competidores (./Arquivo pessoal)
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    O Brasil se tornou nos últimos anos um celeiro de grandes jogadores do carteado. Segundo o site PocketFives, que organiza informações sobre a modalidade, o capixaba Brunno Botteon ocupava na semana passada a décima posição no ranking mundial de pôquer on-line, mas ele já chegou a ser o quinto do mundo. Embora o Brasil não tenha cassinos, a febre das cartas conquistou uma legião de fãs. De acordo com a Confederação Brasileira de Texas Hold’em (a modalidade de pôquer mais jogada), existem no país 7 milhões de jogadores assíduos e todos os anos meio milhão de apostadores começam a se arriscar nas mesas, tanto físicas quanto virtuais. Em números absolutos, o Brasil é o oitavo país com o maior número de praticantes de pôquer do mundo em uma lista liderada pelos Estados Unidos.

    Embalado por esse crescimento, o aumento do tráfego nas páginas on-line teve um efeito direto nas premiações. Com mais participantes pagando taxas de inscrição para ter o direito de disputar torneios, as recompensas automaticamente cresceram. Os valores maiores passaram a seduzir mais jogadores, o que retroalimenta o processo. O Irish Open de Poker Online, um dos principais eventos do circuito europeu, previa distribuir 1 milhão de euros. Com o número recorde de inscritos, a premiação total ficou em 2,9 milhões de euros. Também nesse caso um brasileiro faturou o título: Pablo Silva embolsou 462 000 euros no campeonato encerrado em meados de abril. O Sunday Million vencido em março pelo amador Alex de Sousa Brito quase dobrou a premiação em 2020, passando da média histórica de 10 milhões para 18,6 milhões de dólares. O paulista campeão do torneio recebeu a bolada de 1,19 milhão de dólares via transferência bancária internacional e, no caminho do dinheiro até sua conta, levou uma mordida de 27,5% da Receita Federal sobre o montante conquistado nas mesas. Com parte do dinheiro, pretende abrir uma companhia na área de serviços de tecnologia. “Já fali uma hamburgueria e uma loja de ar-­condicionado, mas não desisto”, brinca. Com esse histórico azarado nos negócios, vai precisar mesmo de melhor sorte no próximo empreendimento. Ou, talvez, no próximo torneio.

    Publicado em VEJA de 27 de maio de 2020, edição nº 2688

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